por Caio Coletti
Mais que qualquer outro acontecimento no mundo do cinema, o Festival de Cannes é um ritual que implica o acompanhamento de uma série de processos que vai definir a cara do evento no ano em questão. Parece burocrático, mas não poderia ser mais diferente disso: acompanhar cada passo da maior aglomeração de cinema do mundo na riviera francesa é um dos grandes prazeres anuais de qualquer cinéfilo de verdade. No ano passado, por exemplo, o festival completava 65 anos, tinha um diretor italiano (Nanni Moretti) na presidência do júri da competição principal, um (lindo) pôster em preto-e-branco estrelado por Marilyn Monroe e premiou o ríspido e brilhante Amour, de Micahel Haneke, com a Palma de Ouro.
Esse ano, pelo andar da carruagem, a conversa é outra: o poster aí em cima aponta para um Festival de Cannes mais colorido, luminoso e, porque não, plural (o casal, para quem está se perguntando, é Paul Newman e sua esposa Joanne Woodward). A dirigência do júri também parece indicara para isso: o escolhido da vez foi ninguém mais, ninguém menos do que Steven Spielberg. O diretor americano não disputa a seleção principal do Festival desde Louca Escapada, de 1974, e que não aparece na Riviera desde a estreia especial de E.T. em 1982. A seleção comandada por Spileberg se mostrou plural e inteligente como sempre, assim como a do diretor dinamarquês Thomas Vintenberg para a mostra paralela Um Certo Olhar, de onde sempre saem filmes inusitados (mas que esse ano parece em maior sincronia com a lista principal). Ao lado do diretor americano, o júri conta desse ano conta com Nicole Kidman, Lynne Ramsay (diretora e roteirista de Precisamos Falar Sobre o Kevin), o ator francês Daniel Auteuil, o diretor taiwanês Ang Lee (As Aventuras de Pi) e o ator austríaco com dois Oscar na prateleira, Christoph Waltz.
A gente não quer complicar pra você (nem ter o trabalho de cobrir os quase 50 filmes selecionados), então vamos fazer uma lista (relativamente) rápida de 10 filmes que vão passar pela Riviera Francesa, e deveriam passar pela sua casa também – não necessariamente nessa ordem:
Only God Forgives (Seleção Oficial)
Os fãs do queridinho cult Drive, de 2011, podem comemorar: o dinamarquês Nicolas Winding Refn não quer largar Hollywood tão cedo. Only God Forgives é o novo filme escrito e dirigido pelo moço de 42 anos que levou o prêmio de Melhor Diretor em Cannes por seu projeto anterior. Ryan Gosling, já estabelecido (em parte por Drive) como um astro de primeira grandeza na cadeia alimentar hollywoodiana, também volta à batuta do diretor como Julian, um traficante que vê sua vida ficar ainda mais complicada quando sua mãe (a sempre fabulosa Kristin Scott Thomas) o convence a vingar o recente assassinato do irmão mais novo. Entre os neons da cidade asiática e o realismo visto sob uma lente sedada de Refn, a gente pode apostar que vai ser um filme e tanto.
Inside Llewyn Davis (Seleção Oficial)
Já a três anos silenciosos (e a cinco sem aparecer em Cannes) os irmãos Coen prometem entregar um de seus melhores filmes com Inside Llewyn Davis, mas a verdade é que nunca se sabe, com eles, se teremos um Bravura Indômita ou um Queime Depois de Ler. A nova trama dos cineastas americanos por excelência retrata a vida decadente de um compositor folk em Nova York nos anos 60. O papel título ficou por conta de Oscar Isaac, que tem arquivado papeis coadjuvantes excelentes em filmes como Drive, Sucker Punch e W.E. e agora tem a oportunidade de assumir um protagonista. Como se trata de um filme dos Coen, o elenco é estrelado, contando ainda com Carey Mulligan, Justin Timberlake, Garret Hedlund (Tron: O Legado), John Goodman e Adam Driver (Girls).
Behind The Candelabra (Seleção Oficial)
Steven Soderbergh vai se aposentar. Depois de 24 anos de carreira e pouco mais de 30 filmes, o americano, que completou 50 anos em Janeiro, anunciou que está finalizando suas contribuições para o cinema. Behind The Candelabra, portanto, se essa decisão permanecer, está fadado a ser o último filme do diretor ganhador da Palma de Ouro por Sexo, Mentiras e Videotape e do Oscar de direção por Traffic. Não é a toa que Cannes resolveu trazê-lo de volta com esse filme originalmente planejado para exibição na HBO, mas que deve ganhar distruibição em cinemas. A trama adapta uma novela autobiográfica de Scott Thornson, que foi amante de Liberace, o famoso pianista libertino, por tempestuosos seis anos. O papel de Thornson ficou com Matt Damon, enquanto Liberace caiu no colo de Michael Douglas. O elenco é completado por nomes como Rob Lowe, Dan Aykroyd, Debbie Reynolds e Scott Bakula.
The Bling Ring (Un Certain Regard)
A filha mais célebre do diretor Francis Ford Coppola caminha para o quinto longa-metragem na direção e roteiro, e para a segunda seleção para Cannes (o pai, embora tenha vencido duas vezes, teve três oportunidades de integrar a seleção durante sua longa carreira). The Bling Ring é talvez o estranho no ninho entre os independentes da mostra Un Certain Regard, contando com pelo menos dois nomes bem reconhecíveis no elenco e uma distribuição garantida em terras americanas (e provavelmente brasileiras). A trama do novo filme da diretora acompanha uma gangue de adolescentes obcecadas pela fama que usa a internet para descobrir o paradeiro de celebridades e invadir suas casas. Emma Watson, a própria Hermione Granger, lidera as garotas, e o elenco conta também com Leslie Mann (Ligeiramente Grávidos).
The Great Gatsby (Fora de Competição)
A gente não queria mesmo ser repetitivo, mas não há meios de se ignorar The Great Gatsby nas últimas semanas. Embora a adaptação do clássico de F. Scott Fitzgerald não tenha tido o poder de trazer Baz Luhrmann de volta a disputa pela Palma de Ouro, foi o bastante para que Steven Spileberg e companhia o selecionassem para a abertura do Festival (que ocorre hoje, dia 15, a noite, aliás). Com o risco de soar repetitivos, lembramos: o novo filme do diretor de Moulin Rouge! conta a história de um veterano de guerra (Tobey Maguire) que se vê subitamente envolvido pelo estilo de vida luxuoso de seu vizinho milionário (Leonardo DiCaprio). O elenco ainda conta com Joel Edgerton (A Hora Mais Escura), Isla Fisher (Home and Away) e Carey Mulligan, em sua segunda aparição na seleção do Festival desse ano.
Bombay Talkies (Sessão Especial)
Cannes abraça Bollywood pela primeira vez com esse “filme-coletânea” Bombay Talkies, feito para comemorar o centenário do cinema hindu e composto por quatro curtas-metragens que, segundo a sinopse, mostram o poder do cinema. A celebrada Zoya Akhtar conta a história de um menino fascinado por filmes que almeja se apresentar no palco (o que enfurece os pais); Dibakar Banerjee retrata as desventuras de um trabalhador com muita má sorte; Anurag Kashyap dirige o curta sobre um âncora de TV atrás de uma reportagem perigosa; e Karan Johar mostra o dia-a-dia de um relacionamento. Ao melhor estilo Paris Eu te Amo, Bollywood prova mais uma vez que é uma potência a ser ouvida no entretenimento mundial.
Le Passé (Seleção Oficial)
Quem viu O Artista e está com saudades da lindíssima (e talentosíssima) Berenice Bejo pode correr para Le Passé, representante francês mais proeminente da seleção oficial do júri. O principal motivo para o filme entrar no páreo, no entanto, vem do Irã: o diretor e roteirista Asghar Farhadi, que levou o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro no ano passado com o celebradíssimo A Separação. Ele está no comando da história sobre um iraniano que deixa a França (e sua esposa e filhos) para trás ao retornar a terra natal, levando-a a começar um affair e pedir pelo divórcio. Os meandros familiares parecem ser a especialidade de Farhadi. Ao lado de Bejo no filme está Tahar Rahim, cuja atuação em O Profeta lhe rendeu vários prêmios.
Nebraska (Seleção Oficial)
Depois de uma aventura pelo drama mainstream com Os Descendentes, que lhe rendeu o segundo Oscar de roteiro, Alexander Payne retorna ao cinema independente com sua segunda seleção para Cannes (primeira desde 2002), Nebraska. O filme, sexto do diretor em quase 20 anos, é o primeiro que ele dirige sem ter assinado o roteiro: aqui, a história de pai e filho que fazem uma viagem de Montana a Nebraska (terra natal do diretor) para clamar meio milhão de dólares em dívidas antigas é conduzida pelo estreante Bob Nelson. Fotografado em preto e branco, o filme é protagonizado por Will Forte (Saturday Night Live) e Bruce Dern (Amargo Regresso).
The Great Beauty (Seleção Oficial)
Um preferido franco de Cannes desde 2004, com quatro nominações e dois prêmios especiais do júri, o italiano Paolo Sorrentino aparece de novo no Festival com The Great Beauty, descrito como “um retrato da Roma atual” pelos olhos de um escritor envelhecido que tenta recuperar as memórias da juventude. Esse é o filme italiano do diretor que segue sua nem tão bem sucedida estreia americana com o ótimo Aqui é o Meu Lugar. Troque um Sean Penn semi-travestido por um Toni Servillo fazendo o papel de turista rabugento, e mantenha a câmera contemplativa, e você tem The Great Beauty.
As I Lay Dying (Un Certain Regard)
As I Lay Dying já é o sétimo filme de James Franco na direção. Surpreso? A gente também ficou, uma vez que o moço preferiu se reservar ao cinema independente em suas investidas de cineasta. É também a primeira seleção de Franco para um Festival importante do circuito europeu: a trama compreende a jornada de dois irmãos em busca de honrar o desejo de sua mãe de ser enterrada perto da cidade de Jefferson. Franco dirige, assina o roteiro e protagoniza essa adaptação de uma clássica novela de William Faulkner. No elenco também estão o indicado ao Oscar Richard Jenkins (O Visitante) e o comediante Danny McBride (Trovão Tropical).
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