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Review: Me Chame Pelo Seu Nome

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Review: Liga da Justiça

É verdade: o novo filme da DC seria melhor se não tivesse uma Warner (e um Joss Whedon) no caminho.

31 de mar. de 2016

Diário de filmes do mês: Março/2016

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por Caio Coletti

Nem todos os filmes merecem (ou pedem) uma análise complexa como a que fazemos com alguns dos lançamentos mais “quentes” ou filmes que descobrimos e nos surpreendem positivamente. É levando em consideração a função da crítica e da resenha como uma orientação do público em relação ao que vai ser visto em determinado filme que eu resolvi criar essa coluna, que visa falar brevemente dos filmes que não ganharam review completo no site. Vamos lá:

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Expresso do Amanhã (Snowpiercer, Coréia do Sul/República Tcheca/EUA/França, 2013)
Direção: Joon Ho Bong
Roteiro: Joon Ho Bong, Kelly Masterson, baseados na graphic novel de Jacques Lob, Benjamin LeGrand & Jean-Marc Rochette
Elenco: Chris Evans, Kang-ho Song, Ed Harris, John Hurt, Tilda Swinton, Jamie Bell, Octavia Spencer, Alison Pill, Luke Pasqualino
126 minutos

Celebrado por muitos críticos e entusiastas do cinema como uma das grandes revelações da nova geração, Joon Ho Bong é responsável por filmes díspares mais igualmente elogiados como Memórias de um Assassino (2003), O Hospedeiro (2006) e Mother – A Busca Pela Verdade (2009). O sul coreano de 46 anos experimentou pela primeira vez uma produção internacional com Expresso do Amanhã, adaptação de uma celebrada graphic novel francesa que o diretor tomou para si, criando uma ficção científica das mais plenamente realizadas (visualmente e narrativamente) de uma década que já está repleta delas. Repleto de significado com qualquer boa ficção, Expresso do Amanhã é por vezes dolorosamente cínico em sua concepção de humanidade, toca sem medo em temas como a estrutura social que precisa da opressão de alguns para a bonança de outros, o egocentrismo humano, a fácil doutrinação de mentes fracas, a dificuldade e a nobreza do auto-sacrifício. É um filme ácido, violento, cinético e explosivo, com um visual matador provido pelo diretor Bong em parceria com o seu diretor de fotografia habitual, Kyung-pyo Hong – é notável observar a mudança de tons durante o filme, a exploração do escuro e do monocromático no início e a explosão de sensações do meio para o final, uma transição bem marcada pela espetacular cena de ação iluminada à tochas que acontece em certo ponto do filme.

A caracterização dos personagens também é perfeita, aproveitando o pouco tempo que passamos com alguns para lhes dar alguns traços marcantes e desenvolvê-los sem muito alarde em pessoas completamente tridimensionais. Entregando um monólogo matador (é sério!) perto do final, Chris Evans prova que é mais que o Capitão América do MCU como Curtis, o relutante líder dos moradores “do fundo” de um trem pós-apocalíptico cujo “motor eterno” abriga o restante da humanidade do frio impossível da Terra destruída do lado de fora. Indignados com a opressão das classes mais altas, que ficam “na frente” do trem, próximas ao gabinete do mítico inventor e mantenedor do tal motor, Wilford, Curtis e companhia se rebelam, começando uma epopeia “trem acima” com um ataque surpresa. Tilda Swinton está especialmente espetacular como uma bizarramente caracterizada burocrata da classe alta, e os coreanos Kang-ho Song e Ah-sung Ko deixam marcas permanentes na memória do espectador também.

Feito com o cuidado aos detalhes que falta a muitos cineastas mais experientes que Bong, Expresso do Amanhã é um conto extraordinariamente verdadeiro com suas próprias ambições e realizações, uma história tremendamente bem contada que surpreende, satisfaz e faz pensar desde o primeiro minuto. É um filme que precisa ser assistido.

✰✰✰✰ (4/5)

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Evereste (Everest, Inglaterra/EUA/Islândia, 2015)
Direção: Baltasar Kormákur
Roteiro: William Nicholson, Simon Beaufoy
Elenco: Jason Clarke, Josh Brolin, John Hawkes, Robin Wright, Emily Watson, Sam Worthington, Jake Gyllenhaal, Michael Kelly, Keira Knightley
121 minutos

Ao contrário da maioria dos filmes sobre escaladas de grandes montanhas como o Evereste, o K2 ou o Aconcágua, o filme do ano passado, diretamente intitulado Evereste, não tenta glamourizar a experiência ou a aspiração que move esses homens a tentarem um feito que simplesmente não é desenhado para ser suportado pelo corpo humano. Essa é a grande novidade que o diretor Baltasar Kormákur (Contrabando) e os roteiristas William Nicholson (Os Miseráveis) e Simon Beaufoy (127 Horas) trazem para a mesa, uma experiência mais realista e detalhada das dificuldades de escalar um pico de 8.848 metros e sair vivo da experiência. Baseado na experiência real de uma série de aspirantes a escaladores que não chegou inteira de volta à superfície, Evereste é uma aventura de dificuldade e minúcia impressionantes, mas sua direção não se esforça para nos mostrar de forma sensorial a agonia de seus personagens, ou nos investir muito na história deles. Alguns dos tipos que conhecemos são Rob (Jason Clarke, em atuação tão indiferente quanto a que entregou em Exterminador: Gênesis), o líder da expedição, cuja esposa (Keira Knightley) o está esperando em casa grávida; Doug (John Hawkes), um humilde carteiro cujas expedições são financiadas por uma escola perto de onde mora, a fim de que ele mostre as crianças que “é possível chegar em qualquer lugar”; Beck (Josh Brolin, tipicamente detestável), um tipo bem americano que está de briga com a esposa (Robin Wright) por ter marcado a viagem sem seu consentimento. Curiosamente, a história pela qual eu me senti mais envolvido foi a de Yasuko (Naoko Mori), que quer chegar ao pico do Evereste para se tornar a primeira mulher a escalar todos as setes grandes montanhas do mundo.

Sim, Jake Gyllenhaal faz uma pequena participação como o líder de uma expedição “rival” a de Rob, mas o papel não faz bom uso de seus talentos (nem físicos nem artísticos, inclusive); e sim, Emily Watson está tipicamente adorável como a assistente de Rob, que fica no acampamento dando instruções e vigiando a meteorologia enquanto os escaladores partem para o cume. Um elenco majoritariamente eficiente de coadjuvantes e o já citado realismo da história contada servem para trazer um olhar diferente e interessante sobre essa aventura que desafia a boa lógica de qualquer ser humano, mas ainda assim parece fazer o nosso sangue correr mais quente e a nossa ambição pela grandeza despertar. De forma alguma Evereste é um filme idealista, mas Nicholson e Beaufoy o fazem um filme compreensivo, ainda que inclemente ao mostrar o destino dos que ousam desafiar a natureza. Além disso, no entanto, há muito pouco para se ver aqui.

✰✰✰✰ (3,5/5)

Sisters-Movie-PosterIrmãs (Sisters, EUA, 2015)
Direção: Jason More
Roteiro: Paula Pell
Elenco: Tina Fey, Amy Poehler, Maya Rudolph, Ike Berinholtz, James Brolin, Dianne Wiest, John Cena, John Leguizamo, Bobby Moynihan, Greta Lee, Madison Davenport, Rachel Dratch
118 minutos

Não é novidade para ninguém que, embora já sejam provavelmente duas das pessoas mais engraçadas da comédia americana no momento separadas, Tina Fey e Amy Poehler só se potencializam quando estão juntas. O espetacular período em que apresentaram o Globo de Ouro juntas, mais o charmoso Uma Mãe Para o Meu Bebê, uma gema escondida de 2008, são mais que provas disso. Com um roteiro de Paula Pell, uma das mais prolíficas e mais talentosas escritoras do Saturday Night Live, em mãos, elas atingem mais um pico de diversão e storytelling em Irmãs, comédia de título auto-explicativo em que as duas interpretam Maura e Kate Ellis, que retornam para a casa dos pais quando eles anunciam que estão prestes a vendê-la para “limpar” o quarto onde passaram a adolescência juntas, e decidem dar uma última (e épica) festa para se despedir do lugar. Parte da graça aqui é que Tina e Amy invertem personas cômicas: dessa vez, a estrela de 30 Rock interpreta a mais “soltinha” da dupla, que teve uma adolescência cheia de aventuras sexuais e agora se vê em apuros financeiros quando é despedida do trabalho; enquanto isso, a protagonista de Parks and Recreation faz a irmã responsável, que acaba de sair de um divórcio e ainda não se colocou de volta no mundo da solteirice, e que teve uma juventude mais. digamos, enclausurada. A cumplicidade entre as atrizes é o que permite que elas exercitem esse alcance cômico com mais conforto, e isso trabalha em favor de Irmãs. uma comédia com boas intenções e uma sucessão e velocidade de piadas que pode não ser tão alucinante quanto muita gente gostaria, mas é eficiente e funciona junto com a trama, ao invés de contra ela.

O leque de personagens que se reúne em torno da festa dada pelas irmãs Ellis é o mais entertaining possível, encarnados por atores que ou já deram muitas provas de suas habilidades cômicas ou estão mais do que aptos a entrar na brincadeira: John Leguizamo interpreta um abusado ex-conquistador que é apaixonado por Kate; Bobby Moynihan protagoniza momentos tão constrangedores quanto hilários na pele do piadista irritante desesperado por atenção; Dianne Wiest e James Brolin estão sensacionais como os pais de Kate e Maura, que não veem a hora de se livrar da casa e aproveitar a vida; Maya Rudolph ganha o prêmio de coadjuvante mais valiosa como a ex colega-de-classe que Kate costumava odiar e que até hoje tem seu fiel grupinho de amigas “populares’; e, claro, John Cena está mais do que disposto a emprestar seus talentos (majoritariamente físicos) para o papel do traficante de drogas que as irmãs chamam para a festa inadvertidamente.

Irmãs tem uma reunião de pessoas tremendamente engraçadas, mas o que faz o filme decolar de verdade é que o roteiro de Pell, em sua estreia no cinema, mantem essas protagonistas grudadas na realidade da situação delas, dos pais, e de cada um dos personagens que as cercam. Enquanto tira uma com o desespero por juventude e pelo retorno dos “bons tempos” que muitos adultos exasperados com as suas próprias vidas carregam, Pell parece também estar criando um conto de celebração que cuidadosamente nos mostra que partes desse culto à juventude desenfreado podemos (ou devemos) absorver. Não queremos dizer que Irmãs é um “filme importante”, mas não machuca assisti-lo, e ele ainda vai te manter tremendamente entretido por quase duas horas. Taí algo que não falamos sobre muitas comédias dos últimos anos.

✰✰✰✰ (4/5)

Sisters-Movie-PosterHoras de Desespero (No Escape, EUA, 2015)
Direção: John Erick Dowdle
Roteiro: John Erick Dowdle, Drew Dowdle
Elenco: Owen Wilson, Lake Bell, Sterling Jerins, Claire Geare, Pierce Brosnan, Sahajak Boonthanakit
103 minutos

Há algum talento envolvido na confecção de Horas de Desespero, um thriller em que uma família recém-mudada para um país não nomeado do Sudoeste da Ásia se vê perseguido por radicais políticos que pretendem matar todos os americanos vivendo na nação após tomarem o poder com um golpe de Estado. No entanto, como você pode ter adivinhado pela sinopse, essa história de sobrevivência inspirada por eventos ocorridos na Tailândia assume o ponto de vista da família ianque e a partir daí assume que qualquer estrangeiro é uma ameaça. Desprovido de qualquer nuance política ou consciência social, Horas de Desespero caracteriza os asiáticos que cercam a família Dwyer como ameaças ou, na melhor das hipóteses, curiosidades étnicas para durar uma cena (como os frequentadores de um bar karaokê no comecinho) ou vários minutos (como o motorista camarada fã de Kenny Rogers). Em certo momento há um breve discurso sobre como o governo americano explora os recursos hídricos e a mão-de-obra barata daquele país, causando em grande parte uma piora na pobreza dessa gente, mas a conversa entra por um ouvido e sai pelo outro, porque Horas de Desespero se recusa a sentir empatia por muito tempo por alguém que não seja a família principal ou o agente britânico (Pierce Brosnan) que os salva uma mão cheia de vezes.

Vamos falar um pouquinho, no entanto, sobre os tais talentos envolvido no filme: o diretor John Erick Dowdle, responsável por filmes díspares como Quarentena, Demônio e Assim na Terra como no Inferno, sai do gênero do terror pela primeira vez, mas carrega consigo a impressionante capacidade de causar tensão e olhar para a brutalidade e perigo com a urgência que é necessária a esses sentimentos. O problema é que, se reunindo ao irmão Drew Dowdle no roteiro, ele faz de Horas de Desespero um exercício de tensão tão enervante quanto são os constantes equívocos no retrato dos estrangeiros e até da única mulher da trama, a esposa do executivo vivido por Owen Wilson. Ambos Wilson e Lake Bell, que interpreta a moça, emprestam garra e desespero a seus personagens, mas não são capazes de transcender uma história rasa, preconceituosa, que passa muito mais perto de Busca Implacável do que deveria, e que some da cabeça do espectador assim que os créditos sobem. Uma situação política complicada como essa merecia um filme melhor.

✰✰ (2/5)

Sisters-Movie-PosterNo Coração do Mar (In the Heart of the Sea, EUA/Austrália/Espanha/Inglaterra/Canadá, 2015)
Direção: Ron Howard
Roteiro: Charles Leavitt, baseado no livro de Nathaniel Philbrick
Elenco: Chris Hemsworth, Benjamin Walker, Cillian Murphy, Brendan Gleeson, Ben Whishaw, Michelle Fairley, Tom Holland, Frank Dillane
122 minutos

Há uma pureza em No Coração do Mar que raramente se vê nos grandes filmes de efeitos especiais da Hollywood de hoje, mas que sobrevive, de certa forma, nos melhores filmes de Ron Howard. O diretor americano, que tem um Oscar na prateleira por Uma Mente Brilhante, é sob certa ótica um formalista consumado, que usa e abusa de técnicas clássicas e que não toca nas modernosas decisões criativas de um Alejandro González Iñárritu, por exemplo. Ao mesmo tempo, seus filmes, quando acertados, vibram com a antiquada vontade de contar uma história da forma mais simples e mais eficiente possível, alinhando uma construção climática do cenário sempre muito palpável com uma ótima direção de atores e um senso narrativo que coloca o ponto e as reflexões da trama acima da técnica, e nos absorve para dentro do filme com facilidade. Foi o que aconteceu com Frost/Nixon (2008) e com Rush: No Limite da Emoção (2013), esse último também estrelado pelo protagonista de No Coração do Mar, o australiano Chris Hemsworth, conhecido como o Thor da franquia da Marvel. Aqui, Hemsworth interpreta Owen Chase, um filho de fazendeiro que conseguiu se infiltrar no mundo elitista dos baleeiros da Nova Inglaterra, nos EUA do século XIX. Ele parte com o esnobe capitão Pollard (Benjamin Walker) a bordo do Essex em busca de mais óleo de baleia, acompanhado por uma tripulação de tipos bem diversos, incluindo o novato Nickerson (Tom Holland, o futuro Homem-Aranha) e o veterano Joy (Cillian Murphy, o antigo Espantalho), até que os marinheiros se encontram com o monstro marinho em forma de baleia que ataca viciosamente o navio ao tentar impedir que ele cace os animais em seu território.

Essa é a história supostamente real que teria inspirado Moby Dick, o clássico livro de Herman Melville, que aparece aqui encarnado por Ben Whishaw enquanto troca histórias com um envelhecido Nickerson (Brendan Gleeson) a fim de descobrir o que realmente aconteceu com o Essex. Howard monta essa entrevista entre os dois homens, que poderia ter passado como um recurso narrativo supérfluo, para se parecer com uma confissão atormentada de um velho com memórias reprimidas, e Gleeson brilha, como de costume, ao ir retirando as camadas do seu Nickerson e o aproximando do jovem que Holland interpreta com tanta energia nas porções do filme passadas no passado. Os dois intérpretes desse personagem são o destaque do elenco, mas Cillian Murphy, Michelle Fairley, Benjamin Walker e Frank Dillane entregam trabalhos sólidos e marcantes mesmo com pouco tempo em tela, em grande parte porque o roteiro de Charles Leavitt (Diamante de Sangue) desenha esses personagens com linhas tão definidas e precisas.

No Coração do Mar é um conto sobre como o homem muitas vezes confunde necessidade com ganância, e sobre aquele velho clichê da arrogância humana em se achar domador e dominador da natureza. Da forma como está escrito, o filme coloca a enorme baleia encontrada pelos homens do Essex quase como uma materialização de um karma, e embora Howard nos leve junto com esses personagens em uma jornada de tirar o fôlego de sobrevivência, o grande arco de No Coração do Mar é ético, seja na evolução do personagem de Hemsworth (que, como ator, continua sendo um ótimo Thor – mas tem se esforçado cada vez mais ultimamente) ou nos dois momentos distintos em que vemos Nickerson, e no marcado amadurecimento (e envelhecimento) que os separam. Em seu filme mais recente, Ron Howard só quer nos contar uma história, e isso pode ser refrescante em uma Hollywood, e uma temporada de premiações, que cada vez mais coloca técnica sobre substância.

✰✰✰✰✰ (4,5/5)

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Star Wars: O Despertar da Força (Star Wars: Episode VII – The Force Awakens, EUA, 2015)
Direção: J.J. Abrams
Roteiro: Lawrence Kasdan, J.J. Abrams, Michard Arndt
Elenco: Harrison Ford, Mark Hammill, Carrie Fisher, Adam Driver, Daisy Ridley, John Boyega, Oscar Isaac, Lupina Nyong’o, Andy Serkis, Domhnall Gleeson, Max Von Sydow, Gwendoline Christie
135 minutos

No seu coração, Star Wars sempre foi uma novela pulp de ficção científica, como o herói dos quadrinhos Flash Gordon ou os livros de Edgar Rice Borroughs, o homem que concebeu Conan, Tarzan e John Carter. Os primeiros três filmes de George Lucas, feitos entre 1977 e 1983 e amados por uma multiplicidade de gerações, tiram seu duradouro charme da vontade de serem descaradamente óperas espaciais influenciadas pelo gosto de seu autor/diretor por serials televisivos e westerns. Quando Lucas voltou a franquia, no entanto, em 1999, o gigantesco e sufocante sucesso de sua criação e de tudo o que derivou dela fez do diretor uma criatura mais cínica, e os três filmes lançados entre 1999 e 2005 são mais sombrios e complexos por conta disso – cheios de estratagemas políticos e subtextos morais, carregados de uma noção de destino e karma que é inevitavelmente obscura, e contando a queda do inocente e idealista Anakin Skywalker, que se transformou em Darth Vader. Não são filmes tão ruins quanto muitos fãs parecem achar, vale dizer, mas são obras fundamentalmente falhas e imensamente menos divertidas que os filmes originais, ou que esse O Despertar da Força, que trouxe a franquia de volta à vida sob o comando de J.J. Abrams, que já havia revitalizado Star Trek em 2009.

Abrams faz seu filme como uma carta de amor ao espírito kitsch (mas levado à sério) que guiou o Guerra nas Estrelas de 1977, hoje chamado de Star Wars: Episódio IV – Uma Nova Esperança. Ao invés de tomar o caminho da segunda trilogia, que contou o que aconteceu antes do que assistimos no primeiro filme, O Despertar da Força nos transporta 30 anos para o futuro depois do final de O Retorno de Jedi (1983) e nos reapresenta velhos personagens e seus destinos enquanto coloca novos heróis e vilões conectados invariavelmente ao passado da saga de alguma forma. Simplificando a política, Abrams e os companheiros de roteiro Lawrence Kasdan (que escreveu parte da trilogia original) e Micharl Arndt (Toy Story 3) colocam mais uma vez uma parte da galáxia tendo que lutar contra os desmandos de um poder autoritário em forma de rebelião, e uma insuspeita moradora de um planeta em que ninguém presta muita atenção revelando poderes extraordinários da Força e se tornando a esperança dos Jedi.

Tudo poderia parecer familiar demais, apesar da nostalgia criada pelo retorno de Harrison Ford como Han Solo (em uma atuação extraordinária, há de se dizer) e de Carrie Fisher como a agora General Leia. Em certo momento de O Despertar da Força, parece que as partes estreladas pelos dois veteranos da franquia serão as melhores do filme, mas aos poucos Abrams vai construindo seus novos heróis Poe Dameron (Oscar Isaac), Rey (Daisy Ridley) e Finn (John Boyega) e articulando um tema que é muito caro a toda a sua filmografia: a forma como fugimos ou abraçamos as nossas responsabilidades e os nossos deveres morais. Esse dilema está em Finn, um ex-Stormtrooper cujo primeiro instinto é simplesmente ir para o mais longe possível, e não ficar e lutar; está no arco de Solo, Leia e seu filho Kylo Ren (Adam Driver), o vilão da trama, e na forma como um trauma do passado afastou o casal, fugindo dos sentimentos levantados por esse fatídico acontecimento, e levou o filho ainda mais longe para o caminho do lado negro da Força; e está, de forma menor, nas jornadas de cada um dos outros personagens. Em suma, então, O Despertar da Força é o melhor de dois mundos: o bom e velho Star Wars com uma nova mensagem para passar.

✰✰✰✰✰ (4,5/5)

30 de mar. de 2016

Review: “A Garota Dinamarquesa” está interessado demais em aparências, e de menos em essências

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por Caio Coletti

Suponhamos que a gente consiga deixar de lado, só por um instante, o fato de que a escalação de Eddie Redmayne em A Garota Dinamarquesa é mais uma em uma longa linha de casos em que Hollywood preferiu escalar um ator cisgênero para interpretar uma personagem transgênero. Vamos tentar relevar, mesmo que talvez não devamos, o fato de que essa prática provavelmente vai ser vista, nas décadas futuras, da mesma forma que vemos o hábito que Hollywood tinha (e, a bem da verdade, ainda tem) de escalar atores brancos para interpretar papéis afro-descendentes – uma afronta que faz cada um dos filmes que a perpetuou uma lembrança embaraçosa do preconceito que carregávamos. Se conseguirmos esquecer a representatividade nula que um ator cisgênero traz para a causa trans quando aceita um papel dessa natureza, e o fato de que ele foi considerado pela produção muito antes de quaisquer profissionais transgênero que almejassem o trabalho, A Garota Dinamarquesa ainda tem algo a oferecer, como filme?

A resposta é mais complicada do que eu gostaria. O diretor Tom Hooper, criticado por muitos resenhistas como um classicista sem alma e com a maior inclinação para dramas acadêmicos “redondinhos” da atualidade, não ajuda a inferir muita vitalidade ao filme. O cineasta responsável por O Discurso do Rei e pelo bem mais vibrante Os Miseráveis desperdiça o  capricho do trabalho de figurino e direção de arte ao aliá-los a uma fotografia burocrática, algo surpreendente vindo de Danny Cohen, responsável pela câmera de O Quarto de Jack. A encenação é lotada de sussurros e tensão física, e certas delicadezas aparecem sob a câmera vigilante de Cohen, mas o filme perde a oportunidade de nos mergulhar no mundo que apresenta timidamente, como se calculasse quão fundo pode entrar no mar que escolheu desbravar.

A trama cobre a jornada de Lili Elbe (Redmayne), uma pintora dos anos 20, durante o descobrimento de sua identidade como uma mulher transgênero, a jornada dela e da sua esposa Gerda Wegener (Alicia Vikander), suas tentativas erráticas de receber apoio da comunidade artística e de profissionais da saúde, e sua eventual cirurgia de mudança de sexo, operada pelo pioneiro Dr. Warnekros (Sebastian Koch). O problema é que A Garota Dinamarquesa se preocupa muito em manifestar essa jornada emocional de Lili em forma de imagem, e o resultado dessa preocupação é uma representação da feminilidade que não é só estereotípica como exacerbada, e um desserviço a qualquer retrato de personagem transgênero no cinema. Traçar a “transformação” de Lili através apenas de roupas, maquiagens, gestos e mímicas (a vemos imitando movimentos de mulheres mais de uma vez no filme) não é o bastante, e ainda limita a identidade feminina a um conjunto de trejeitos e maneirismos.

Isso em grande parte é culpa do roteiro, é claro, e o trabalho de Lucinda Coxon (Matador em Perigo) não é mesmo nem um pouco exemplar – onde ela acerta é na relação entre Lili e a esposa Gerda, interpretada com tal bravado e luminosidade por Alicia Vikander que fica difícil de engolir o seu prêmio como Melhor Atriz Coadjuvante no Oscar desse ano, quando ela é claramente tão protagonista quando Redmayne. É ainda mais contrastante perceber isso quando a Gerda de Vikander, independente, impetuosa e tão absolutamente viva, é colocada em cena com a pálida imitação de uma mulher que o roteiro quer obstinadamente que Lili seja. Coxon não investe sua Lili com detalhes e arcos dentro de sua própria história, que a tornariam tridimensional como Gerda. Em grande parte, o único traço que define a mulher transgênero que protagoniza A Garota Dinamarquesa é sua transgeneridade.

Quem também se vê preso nessas limitações é Redmayne, que, escolha ética ou não para o papel, é um ator de habilidades extraordinárias. Seu retrato sensível de Lili é esforçado e estudado da forma como aprendemos a esperar dele, cheio de pequenos detalhes que casam bem com a narrativa e tentam aprofundar uma personagem que desesperadamente carece de aprofundamento – em um contexto maior, no entanto, ele estava destinado a falhar nessa missão de uma forma ou de outra, então quem sabe não seria melhor ter recusado? Ben Whishaw, Matthias Schoenaerts e Sebastian Koch também encontram grandeza em seus papéis coadjuvantes, mas a máxima do cinema já diz que atores podem fazer muita coisa, mas são incapazes de fazer tudo.

E ainda assim, mesmo com todas essas objeções éticas e artísticas ao trabalho envolvido em A Garota Dinamarquesa, o filme emociona simplesmente pela virtude da história que conta. Em alguns momentos melancólica, em outros cruelmente impiedosa, e em raras cenas recheada com a alegria que vem da liberdade, a história de Lili é uma inspiração e uma marca indelével em quem quer que a ouça, independente da forma como foi contada. Uma figura simbólica de uma fatia da população que muitos ainda veem de forma assustadoramente negativa ou simplesmente ignorante, da violência que as pessoas transgênero sofrem diariamente e da crua invisibilidade de seus problemas para o resto do mundo, Elbe sem dúvida merecia um filme melhor, mas eleva esse só por estar, de certa forma, nele. O que falta à produção de A Garota Dinamarquesa é a coragem de ser tão desafiadora, autêntica e única quanto a personagem que a inspirou.

✰✰✰✰ (3,5/5)

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A Garota Dinamarquesa (The Danish Girl, Inglaterra/EUA/Bélgica/Dinamarca/Alemanha, 2015)
Direção: Tom Hooper
Roteiro: David Evershoff, baseado no livro de Lucinda Coxon
Elenco: Eddie Redmayne, Alicia Vikander, Amber Heard, Ben Whishaw, Matthias Schoenaerts, Sebastian Koch, Adrian Schiller
119 minutos

27 de mar. de 2016

Review: “Batman vs. Superman” só erra quando não está totalmente comprometido com a sua proposta

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por Caio Coletti

“Você sabe qual é a mentira mais antiga da América, senadora? É a que diz que o poder pode ser inocente”. A frase, que sai da boca de Lex Luthor (Jesse Eisenberg) em uma conversa que se promete profética com a Senadora Finch (Holly Hunter), foi polêmica durante o tempo de divulgação de Batman vs. Superman, porque um dos trailers editou a primeira metade dessa fala de Luthor com uma outra resposta, tirada de outro momento do filme. A versão final da sentença que ouvimos, no entanto, não poderia ser outra se ponderarmos os temas e a narrativa de Batman vs Superman – essencialmente, esse é um filme sobre a corrupção do poder, a cegueira que vem dos privilégios, a forma com o mito do super-herói está enrolado em uma névoa desse privilégio, e a forma como eles representam, no subconsciente que manifestam nas páginas dos quadrinhos, tanto o sonho e a aspiração da nobreza humana quanto o medo e o autoritarismo da submissão a uma justiça vigilante essencialmente bárbara.

Então sim, Lex, o poder não pode ser inocente, e nenhum dos nossos dois heróis também pode. Somos reapresentados ao Superman de Henry Cavill, que vimos em O Homem de Aço, e ficamos sabendo que a batalha de proporções gigantescas que assolou a cidade de Metrópolis inteira no clímax do filme de 2013 voltou uma parte do público e do poder político contra ele, especialmente vítimas de danos colaterais e alguns desconfiados da onipotência desse Deus que anda entre nós. Amado e odiado ao mesmo tempo, é difícil passar o Superman como o mocinho injustiçado quando sua preocupação real com as vítimas do que causou de destruição é abordada só de passagem, e quando Cavill, ridiculamente bonito como de costume, o interpreta como um menino mimado que tenta ser responsável pela primeira vez na vida mesmo que tenha brinquedos demais nas mãos. De sua forma, Superman é a esperança e a derrocada do sonho americano, ao mesmo tempo que é um estrangeiro, essencialmente, o que muitos não deixam passar – por isso talvez tão apropriado que Cavill seja o primeiro britânico a fazer o papel, se conectando com essa vibração de peixe fora d’água de Kal-El.

Já ao Batman, feito por Ben Affleck pela primeira vez, somos apresentados com a história de origem de sempre, com o assassinato dos pais, o trauma com morcegos na caverna perto da residência dos Wayne, e as habilidades de detetive que fazem par com a potência física impressionante que essa versão do personagem carrega. O Bruce Wayne e o Batman de Affleck não são dois (playboy e vigilante) ou três (playboy, garoto órfão e vigilante) pessoas distintas – ao invés disso, o ator investiu em uma performance que acompanha o filme em que está inserida ao se basear em uma nota fundamental e colorir ao redor dela conforme vai se tornando necessário. A atuação de Affleck é parte importante da engrenagem do filme, e ele parece estar em sincronia o tempo todo com a história.

Em suma, o Batman daqui é o nosso Cavaleiro das Trevas mais velho, ainda agindo em Gotham City, mas mostrando sinais de cansaço para o mordomo Aflred (Jeremy Irons) – após perder muitos funcionários e amigos na batalha de Metrópolis, Wayne só precisa de um empurrãozinho amigável e engenhoso de Lex Luthor para partir para uma guerra em que ninguém espera que ele vença. E e aí que entra a questão: por dois terços de seus colossais 151 minutos, o filme de Zack Snyder flerta (ou melhor, entra em um namoro sério) com o terror, seja nos sonhos e pesadelos delirantes de Bruce ou na opressiva viagem do Superman em direção a uma dúvida crucial sobre si mesmo e sua situação no nosso planeta e na jornada da humanidade.

Aqui, Kal-El está questionando os ensinamentos do pai adotivo Jonathan (Kevin Costner, que retorna para uma cena rápida), que lhe disse desde a infância que ele foi mandado aqui por um motivo; e Bruce, por sua vez, busca forçar uma espécie de sentido ou motivo para sua própria vida e combate ao crime, que ele já conjuga em grande parte no passado. São arcos parecidos, como o leitor deve ter percebido, e isso em muitos sentidos coloca Batman vs. Superman não só como um suspense de ação tremendamente bem escrito, como uma meditação mais do que válida sobre a visão que temos de nós mesmos e da sociedade que construímos ao nosso redor, as doses do nosso cinismo e do nosso idealismo, a nossa crença em algo maior que nos une ou que nos separa, a corrupção do poder e o medo dele.

São temas complexos para se costurar em um filme de super-heróis, e embora pause de vez em quando para nos lembrar que é parte de uma franquia de blockbusters que vai invadir os cinemas nos próximos anos, Batman vs. Superman majoritariamente faz seu trabalho com brilhantismo. O roteirista David S. Goyer, voltando da labuta decente, mas muito mais cheia de problemas, em O Homem de Aço, ganhou a ajuda de Chris Terrio, o cara que ganhou o Oscar por Argo, e o resultado é uma trama muito mais redonda, personagens absurdamente mais bem-definidos e tridimensionais, diálogos mais inteligentes e precisos. Enquanto está comprometido com a sua visão, Batman vs. Superman é quase uniformemente excelente – o clímax (o verdadeiro), em que o plano de Luthor é revelado e os dois titãs finalmente descem o pau um no outro, é eletrizante e agourento, pesando sobre o espectador como uma pedra: estamos vendo um Deus, e tudo o que ele representa, sangrar, e a sensação por cima das estetizações de Snyder é de absoluto pânico.

E então, perto do final, Batman vs. Superman se lembra de que precisa ser um filme de super-heróis, e a direção cinética de Snyder nos leva para um caminho completamente diferente, que serve perfeitamente à franquia que a DC está buscando construir mas, por mais absurdamente divertida e badass que seja, diminui um pouco os mais que valiosos esforços do restante do filme de construir uma reflexão, uma narrativa metafórica sobre esses ícones, suas falhas e seus significados para nós, espectadores, representados na população que aparece no filme.

A Mulher Maravilha de Gal Gadot é uma revelação, a atuação de Eisenberg como Luthor é absolutamente dominante do filme, e a trilha-sonora de Hans Zimmer e Junkie XL seria uma concorrente ao Oscar do ano que vem em um mundo justo. As cenas de luta são sensacionais, um dos maiores feitos das equipes de efeitos especiais de Hollywood até hoje, e é inegavelmente empolgante ver uma gama de personagens da DC sendo colocados em tela como vemos acontecer com a Marvel há algum tempo já. Como entretenimento, Batman vs. Superman é perfeito, e não há nada de errado em você querer desfrutar dele assim. No entanto, nada disso muda o fato de que, como arte e narrativa, o filme segue fundamentalmente incompleto – e seus momentos menos satisfatórios vem exatamente quando ele não se compromete à tão criticada proposta sombria de Snyder e da Warner.

Antes um filme ambicioso incompleto, no entanto, do que um sem ambição nenhuma – e é por isso que, da última leva de histórias de super-heróis, Batman vs. Superman sem dúvida é uma das melhores.

✰✰✰✰✰(4,5/5)

Batman-V-Superman-Movie

Batman vs. Superman: A Origem da Justiça (Batman v Superman: Dawn of Justice, EUA, 2016)
Direção: Zack Snyder
Roteiro: Chris Terrio, David S. Goyer
Elenco: Ben Affleck, Henry Cavill, Amy Adams, Jesse Eisenberg, Diane Lane, Laurence Fishburne, Jeremy Irons, Holly Hunter, Gal Gadot
151 minutos

9 de mar. de 2016

10 ótimos atores que estão só esperando por um papel à altura

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por Caio Coletti

Um dos padrões mais fáceis de se observar no Oscar 2016 é que, entre os atores indicados (e os que todo mundo reclamou que foram esnobados)  estão vários que parecem ter encontrado no ano passado, depois de algum tempo de carreira, aquele personagem que os permitiu mostrar a um público maior a extensão dos seus talentos. É uma trajetória bastante comum em Hollywood, essa terra de produtores confusos que nem sempre sabem como melhor usar o talento que tem em mãos – seja porque suas escolhas não são as mais espertas, porque sua aparência ou estilo não concordam com o padrão Hollywood, ou por pura falta de sorte, esses jovens (ou não tanto) talentos da lista aí embaixo ainda não encontraram um papel que mostre sua grandeza na tela da forma certa. A nossa torcida é para que isso aconteça logo.

1

Ben Foster

Americano natural de Boston, Foster tem 35 anos mas já tem se mostrado maravilhoso em tela há um bom tempo. A primeira vez que o notamos foi em 2005, com Refém, suspense mediano estrelado por Bruce Willis em que Foster interpreta um dos sequestradores de uma família – sua interpretação intensa rouba a cena em cada reviravolta, mesmo com um roteiro fraco a seu serviço. Logo em seguida ele deu um passo em falso ao encarnar o mutante Anjo no pior dos filmes da série X-Men, O Confronto Final – seu papel, drasticamente diminuído na versão final e perdido completamente em meio à confusão do roteiro, passou tão batido pela cronologia da franquia que Foster será substituído por Ben Hardy em X-Men: Apocalipse, que sai esse ano.

Foster fez bem em escorar sua carreira até agora em escolhas pouco convencionais, se destacando mesmo com parceiros de cena como Christian Bale e Russell Crowe no injustamente esquecido faroeste revisionista Os Indomáveis, refilmagem do clássico Galante e Sanguinário, de 1957. Um crítico brasileiro brincou, à época do lançamento do filme, que mesmo entre Bale e Crowe, Foster era o elemento mais “galante e sanguinário” de Os Indomáveis. Ele também encarou o sempre excelente Woody Harrelson de igual para igual no drama O Mensageiro, incorporando um soldado com stress pós-traumático que toma para si a ingrata missão de notificar famílias de jovens militares mortos na guerra. Em geral, não importa com quem contracene, Foster se sobressai – vide a atuação fundamental em Amor Fora da Lei (na foto), equilibrando as intensidades de Rooney Mara e Casey Affleck com o seu policial centrado e trágico.

Dono de um Daytime Emmy pela performance em um programa infantil americano, Foster poderia ter tido o seu grande momento ano passado, com The Program, em que interpretou o famoso ciclista Lance Armstrong, pego em um dos escândalos de dopping mais conhecidos do mundo do esporte. O filme, no entanto, sofreu duras críticas quando foi lançado. Ele está no recentemente lançado Horas Decisivas, e tem outras duas super-produções alinhadas para o ano: a adaptação do game Warcraft (9 de Junho) e o novo filme baseado nas aventuras de Robert Langdon (Tom Hanks), Inferno (13 de Outubro). Só lhe falta um papel dramático que o coloque no mapa de vez.

INTO THE WOODS

Chris Pine

Também aos 35 anos, o californiano Chris Pine é um bom Capitão Kirk nas novas instalações cinematográficas da franquia Star Trek, sim, mas não é bem aí que o jovem galã mostra o melhor do seu potencial. No radar de Hollywood desde que estrelou O Diário da Princesa 2 ao lado de Anne Hathaway, ele passou por uma série de papeis esquecíveis antes de amadurecer como ator e começar a receber roteiros mais interessantes, com personagens que o desafiavam mais. E é aí que Pine mostrou estar disposto a elevar o jogo – em Caminhos da Floresta, ele encarnou um Príncipe Encantado brutalmente honesto com senso de humor e de ridículo que fez do seu número musical ao lado de Billy Magnussen um dos destaques do musical de Rob Marshall.

Já na minissérie do Netflix Wet Hot American Summer: First Day of Camp, Pine faz um rockstar recluso que a jornalista interpretada por Elizabeth Banks descobre estar vivendo em uma cabana isolada no acampamento de verão no qual a história se passa. É uma trama desenhada para ser ridícula e tirar o máximo de todos os clichês envolvidos nela, como tudo em Wet Hot American Summer, e Pine mostra-se capaz de jogar com essas cartas satíricas, em uma performance que parece tão espontânea quanto é cuidadosamente calculada para espelhar e magnificar os aspectos mais ridículos do personagem. Será que a vocação de Pine é a comédia, então? Possivelmente, mas ele também está ótimo em Z for Zachariah, conto metafórico pós-apocalíptico em que interpreta a Serpente para o Adão e Eva de Chiwetel Ejiofor e Margot Robbie.

Em 2016, ele volta ao papel de Kirk em Star Trek: Sem Fronteiras (21 de Julho), e contracena com o companheiro de lista Ben Foster e com o veterano Jeff Bridges em Comancheria, filme do talentosíssimo David Mackenzie (Sentidos do Amor, Encarcerado). Pine também está filmando participação no filme-solo da Mulher-Maravilha, marcado para 23 de Junho de 2017.

3

Daniel Radcliffe

Radcliffe está só com 26 anos, mas os projetos pós-Harry Potter do ator britânico já mostraram que o tempo dentro da franquia o fez desenvolver a habilidade rara de ser um leading man verdadeiramente carismático, que comanda a atenção em tela mesmo com um personagem mais “comum”. A bem da verdade, mesmo dentro dos limites do personagem da saga de J.K. Rowling, Radcliffe já mostrava habilidade excepcional de expressão. Tanto Ordem da Fênix quanto Relíquias da Morte – Parte 2 são filmes todos seus, transmitindo a angústia, a confusão ou a determinação do personagem (em diferentes fases da história) com facilidade. Radcliffe é um daqueles raros atores que se comunica com o público melhor do que o próprio roteiro poderia.

Para um bom exemplo não é preciso ir mais longe do que Amaldiçoado (na foto), em que Radcliffe interpreta um jovem que se afunda em depressão após a morte de sua namorada, pela qual todos o culpam. Quando chifres de demônio começam a crescer sem explicação na cabeça do personagem, e todos começam a confessar seus pensamentos mais sombrios e perturbados a ele, o garoto parte para tentar desvendar o mistério da morte da amada. Geniosamente concebido, Amaldiçoado não acerta todos os tons e batidas da história, mas Radcliffe está consistentemente brilhante durante o filme – o mesmo vale para a comédia romântica Será Que?, em que encarna um estudante de medicina frustrado na vida acadêmica e amorosa; em Versos de um Crime, em que encarna o poeta Allen Ginsberg; e em Victor Frankenstein, na sua versão física e bem elaborada de Igor, o famoso ajudante do Dr. Frankenstein, feito com Jamec McAvoy.

Até como um cadáver (?) em Swiss Army Man, exibido recentemente em Sundance, Radcliffe recebeu elogios da crítica. Dado o papel certo, o ator britânico é capaz de ainda surpreender muita gente com a atuação e a forma como faz o espectador se identificar com e entender seus personagens – em 2016, ele estará na continuação Truque de Mestre 2 (9 de Junho), mas também nos mais interessantes Imperium, thriller baseado em história real sobre um agente do FBI que infiltra uma célula terrorista, e Young Americans, comédia sobre dois famosos conselheiros políticos republicanos em sua juventude. Esse último o reúne com o diretor de Versos de um Crime, John Krokidas.

4

Derek Luke

Um dos mais velhos na nossa lista, Derek Luke é a prova de que é mais difícil ser um ator negro em Hollywood. Especialmente levando em conta que ele está por aí desde 2002, quando o edificante drama autobiográfico Aprendendo a Viver foi produzido com Luke no papel principal, o de um marujo da Marinha americana que é obrigado a ver um psiquiatra após uma explosão de violência contra um colega. Apesar dos muitos elogios recebidos pelo filme, incluindo uma vitória para Luke no Independent Spirit Awards, o ator seguiu carreira em papeis bem menores do que era de se esperar. Ele é uniformemente excelente em tudo o que faz, no entanto, o que só prova que ainda merece um papel de destaque em que possa mostrar o melhor de suas habilidades.

Seus papeis mais destacados desde então foram em Milagre em Sta. Anna, épico de guerra do diretor Spike Lee, pelo qual recebeu uma indicação ao Image Awards (um dos prêmios mais respeitados do cinema negro americano); na cinebiografia Notorious, em que interpretou o rapper  Sean Combbs, conhecido como Puff Daddy; e no musical Sparkle, estrelado pelas cantoras Whitney Houston e Jordin Sparks. A TV tem tratado Derek um pouco melhor, vide sua excelente participação na primeira temporada de The Americans, e seu papel como um segurança que se envolve com Cookie no primeiro ano de Empire. É também na TV seu único projeto para o futuro próximo, uma reedição da minissérie Roots, a história de um escravo africano e seus descendentes no decorrer da história americana, adaptada anteriormente em uma ultra-bem-sucedida minissérie em 1977.

5

Kodi Smit-McPhee

Esse australiano de nome diferente só tem 19 aninhos, mas já está por aí desde 2009, quando co-estrelou A Estrada  com Viggo Mortensen. E caso vocês não tenham visto o tempo passar, isso já faz 7 anos! Provando-se um ator de escolhas cuidadosas, Smit-McPhee não trabalhou demais durante a adolescência, deixando-se amadurecer como intérprete e aos poucos encarnando papeis desafiadores que provaram o brilho que todo mundo já via em A Estrada. O remake do elogiadíssimo thriller de vampiros sueco Deixe-me Entrar é uma dessas escolhas arriscadas, contracenando com a sempre ótima Chloe Moretz em uma das poucas refilmagens bem-recebidas por público e crítica dos últimos anos.

Smit-McPhee esteve em pequenas pérolas indies como o drama de amadurecimento Criando Asas, em que contracenou com Ben Kingsley, e o meio-animação meio-live action O Congresso Futurista, que pertence todo à Robin Wright, apesar da ótima performance de Smit-McPhee como o filho da protagonista, que sofre de uma rara doença que lhe rouba os sentidos. Ele embarcou em um de seus primeiros blockbusters com Planeta dos Macacos: O Confronto, no ano passado, ganhando notoriedade o bastante para ser escalado como a versão mais jovem do mutante Noturno no vindouro X-Men: Apocalipse (19 de Maio). Quem quiser absorver o melhor de McPhee, no entanto, precisa ver o excêntrico faroeste Slow West, em que McPhee é o centro de um elenco que inclui Michael Fassbender e Ben Mendelsohn, encarnando um inocente jovem apaixonado que se mete no mundo cínico o violento do Velho Oeste americano.

Ainda em 2016, Smit-McPhee estará no curioso projeto The Solutrean, um thriller de Albert Hughes (Do Inferno, O Livro de Eli) que cobre uma história de sobrevivência passada durante a última era do gelo, 20.000 anos atrás. McPhee é o único nome conhecido do elenco, o que vai ser no mínimo interessante dada a premissa da obra.

6

Taissa Farmiga

Taissa Farmiga não queria atuar. Taissa tem seis irmãos e irmãs, e uma delas é a atriz Vera Farmiga, conhecida hoje em dia como a Norma Bates de Bates Motel foi na estreia na direção de Vera, intitulada Em Busca da Fé, que Taissa fez sua estreia no cinema, interpretando uma versão adolescente da personagem da irmã, que passa o filme lutando para reafirmar sua fé. Embarcar logo em seguida em American Horror Story foi uma jogada interessante, que explorou locais dramáticos diferentes da jovem atriz, especialmente quando Taissa retornou para estrelar Coven, a terceira temporada da série. De 2013 para cá, a jovem americana, que completa 22 anos em Agosto, fez escolhas cada vez mais interessantes na carreira, nunca se aproximando demais dos blockbusters.

Esteve sob o comando de Sofia Coppola no esperto Bling Ring: A Gangue de Hollywood; voltou a atuar com a irmã mais velha (dessa vez interpretando a filha de sua personagem) no romance Um Novo Amor; embarcou no thriller psicológico Regressão; e fez a divertida paródia do cinema de terror Terror nos Bastidores, ao lado de um elenco lotado de talentos da sua geração (Alia Shawkat, Adam DeVine, Thomas Middleditch). Todas essas investidas foram recebidas de forma morna pela crítica no fim das contas, mas fica difícil ignorar sua performance em 6 Years, drama de relacionamento da diretora Hannah Fidell. Filmado largamente com diálogos improvisados seguindo um script mínimo, o filme retrata o momento em que o longo relacionamento entre dois jovens namorados começa a desmoronar – Ben Rosenfield está ótimo em seu papel, mas é Farmiga que impressiona e que emociona como a sua contraparte feminina, abusando da sensibilidade e caminhando no limite do melodrama com extraordinária destreza.

Dois projetos promissores compõem a agenda de Taissa para 2016: ao lado do elogiado diretor de terror Ti West (A Casa do Diabo), ela contracena com John Travolta, Karen Gillan e Ethan Hawke no faroeste de vingança In a Valley of Violence; e sob o comando de ninguém menos que a lenda de Hollywood Warren Beatty ela interpreta a jovem atriz que teve um caso com o produtor Howard Hughes no final de sua vida, no drama histórico ainda sem título, a ser dirigido, escrito e estrelado por Beatty.

THE PERKS OF BEING A WALLFLOWER

Mae Whitman

A californiana Whitman é uma das melhores character actresses por aí há mais ou menos 20 anos. Leve em consideração que a atriz acabou de completar 28 e já deu para entender que Mae cresceu diante das lentes – ao contrário de colegas com trajetória semelhante, no entanto, ela nunca ascendeu ao estrelato completo, preferindo papeis na televisão, trabalhos de dublagem e personagens coadjuvantes. Recentemente, Whitman brincou com o fato de que não se encaixa nos padrões absurdos de Hollywood (ela nunca foi magra como uma super-modelo, nem tem os olhos claros e cabelos loiros de Dakota Fanning e cia) ao interpretar a “amiga feia” de um grupo popular de um colegial americano em The DUFF, que recebeu críticas empolgadas quando do seu lançamento, no ano passado. Além desse, seu papel mais reconhecível talvez seja Amber Holt, uma das protagonistas de Parenthood, que durou entre 2010 e 2015 na NBC.

Internacionalmente, talvez o público se lembre mais dela como Mary Elizabeth em As Vantagens de Ser Invisível, no entanto, o que é ótimo, visto que é uma das atuações mais perfeitamente balanceadas de Whitman. Entendendo intimamente sua personagem, ela evita fazer de Mary Elizabeth um objeto de antipatia e a humaniza como uma outsider buscando por atenção nos lugares errados. Seu timing cômico também foi testado em um papel recorrente em Arrested Development, em que todos sempre esqueciam da existência de sua personagem, Ann, namorada de George-Michael (Michael Cera), e em uma participação na sempre subestimada Suburgatory, como a líder de um culto estranhíssimo em que a protagonista Tessa se envolve. Ela também é, no momento, a voz de April O’Neill na elogiada nova série de As Tartarugas Ninja.

Os próximos projetos de Whitman são a animação Rock Dog, do elogiado diretor de Tá Dando Onda, contando a história de um cachorro que sonha ser um astro de rock; e a curiosa dramédia indie Operator, em que ela interpreta uma comediante de stand-up cujo casamento começa a ruir quando ela tenta usar suas experiências com o marido (Martin Starr, de Ligeiramente Grávidos) na elaboração das piadas, enquanto ele a usa como modelo para uma criação do último video-game que programou. Será a porta de entrada para Whitman finalmente começar a ganhar mais papeis adultos e interessantes?

8

Bryce Dallas Howard

Bryce Dallas Howard devia ter sido indicada ao Oscar em 2012. Encarnando duas personagens essencialmente detestáveis, a atriz, filha do diretor Ron Howard (Uma Mente Brilhante, Frost/Nixon), foi uma das melhores coisas no cinema daquele ano. Em Histórias Cruzadas, sua Hilly não foi só a oposição perfeita para a heroína vivida por Emma Stone, como foi construída com cuidado e tom de paródia acertado, realçando algumas das melhores cenas do filme e o conflito racial que é o coração da história. E em 50%, na pele da ex traiçoeira do personagem de Joseph Gordon-Levitt, Howard exerceu um egoísmo tão feio quanto é facilmente identificável e humano. Num mundo ideal, a indicaríamos por essa segunda performance, mas na realidade o único fiapo de reconhecimento que Bryce já ganhou foi uma nomeação ao Globo de Ouro por Como Você Quiser, adaptação de Shakespeare do diretor Kenneth Branagh.

Fora de pequenas participações especiais nos filmes do pai, Bryce estreou no cinema em 2004, aos 23 anos, logo cravando uma performance impressionante em A Vila, talvez o filme mais “ame-ou-odeie” da polêmica carreira de M. Night Shyamalan. Nós particularmente amamos, mas inegável mesmo é a precisão da atuação de Bryce como uma moradora cega do vilarejo misterioso do título. Ela atuaria de novo com Shyamalan no ainda mais criticado A Dama na Água, e novamente sua atuação atrairia elogios que não foram necessariamente estendidos ao filme. Entre uma coisa e outra, substituiu Nicole Kidman na continuação de Dogville de Lars Von Trier, intitulada Manderlay, e embarcou em uma série de franquias com resultados variáveis de sucesso. Foi Gwen Stacy em Homem-Aranha 3, Kate Connor em O Exterminador do Futuro – A Salvação, e Victoria em A Saga Crepúsculo: Eclipse antes de se encontrar como a Claire de  Jurassic World, emprestando poder feminino e dignidade a uma personagem que o roteiro não trata muito bem.

Além de confirmada na sequência do filme dos dinossauros, marcada para 2018, Bryce está na adaptação da Disney de Meu Amigo o Dragão, marcada para 18 de Agosto, sobre um menino órfão perdido em uma floresta por anos a fio e o seu único companheiro, um enorme réptil voador; e em Gold, novo filme de Stephen Gaghan (Syriana), dessa vez centrado em garimpeiros adentrando a selva indonésia em busca de ouro. Matthew McConaughey, Corey Stoll (House of Cards) e Bruce Greenwood (American Crime Story) acompanham Bryce nessa aventura.

9

Andrea Riseborough

Em meio a tantos excelentes atores em alguns dos seus melhores momentos, a britânica Andrea Riseborough talvez não seja o destaque de Birdman como a namorada psicótica do protagonista vivido por Michael Keaton, mas ela ainda é parte da canção tocada harmonicamente pelo elenco e suas performances, e arquiva uma certa energia que é impossível de ignorar. Quem se sentir seduzido pela atriz não está sozinho: somos apaixonados por ela desde W.E.: O Romance do Século, filme de época dirigido por Madonna (!) em que Andrea interpreta uma americana divorciada por quem o rei da Inglaterra, Edward VIII (James D’Arcy) se apaixona. Feito com bom gosto, o filme é um deleite para os fãs do gênero, e a confiança de Riseborough em tela, mesmo com o sotaque falso, é perceptível. O mesmo vale para Oblivion, em que interpreta a esposa do personagem de Tom Cruise – ressentida, pensativa e fascinante de se assistir, a performance de Riseborough dá voltas e voltas em torno de seus companheiros de cena.

Conhecida em terras britânicas desde que encarnou um papel coadjuvante em Simplesmente Feliz, em 2007, Riseborough ainda teve a honra de interpretar a ex-primeira-ministra Margaret Thatcher em sua juventude em Long Walk to Finchley, um telefilme britânico muito elogiado, levando uma indicação ao BAFTA no processo. Esteve também na minissérie The Devil’s Whore, interpretando uma personagem bem mais nova que ela mesma (Andrea tinha 27 na época, e a personagem 17); em um papel menor na triste ficção científica Não me Abandone Jamais; no docudrama histórico (e feminista) Revolução em Dagenham; e no elogiadíssimo thriller Agente C, ao lado de Clive Owen; além de na primeira fase da série Bloodline, do Netflix.

Andrea tem dois projetos para o futuro: Shepherds and Butchers, um drama sobre um advogado (Steve Coogan) que assume o caso de de guarda de prisão da África do Sul que se diz traumatizado pelas execuções que teve que testemunhar; e The Crow, reformulação do clássico de 1994 estrelado por Brandon Lee como um homem assassinado que volta à vida para vingar o crime. Na nova adaptação, que deve seguir mais de perto os quadrinhos originais, Riseborough está escalada para viver Top Dollar, a chefona do crime que é o alvo final do protagonista – vale notar um detalhe: em filmes anteriores, Top Dollar sempre foi um personagem masculino.

10

Maggie Gyllenhaal

Há muito tempo Maggie Gyllenhaal já está interpretando personagens à sua altura, na verdade. O problema é que muita gente ainda não enxergou. Seja na performance indicada ao Oscar (justamente) em Coração Louco, na pele de uma jornalista que se envolve com a lenda quebrada do country interpretada por Jeff Bridges, ou em qualquer outro papel, Maggie habita cada uma de suas personagens com coragem e certa doçura que são só dela. Não é preciso olhar além de suas participações em As Torres Gêmeas e Mais Estranho que a Ficção para provar de que se trata de um dos grandes talentos dessa geração, mas se nem isso o convencer vale dar uma olhada em Secretária, em que Maggie interpreta uma empregada que se envolve em um relacionamento sadomasoquista com seu chefe, e em The Honorable Woman, em que ela dá vida a uma herdeira judia que tenta meter o bedelho no conflito entre muçulmanos e judeus na Faixa de Gaza, com consequências desastrosas.

Elogiada também pela participação em O Cavaleiro das Trevas e pela emocionante história de Sherrybaby, em que interpreta uma ex-presidiária que tenta se reintegrar na sociedade, Maggie tem uma indicação ao Emmy (por The Honorable Woman) e três ao Globo de Ouro, tendo vencido também pela minissérie exibida no SundanceTV. Mais legal ainda é explorar os filmes menores, em que sua performance mal foi notada, mas merece ser redescoberta – no divertido e feminista Histeria, ela faz par romântico (e dá uma aula de atuação) com Hugh Dancy; no pouco visto 171, forma um trio de peso com John C. Reilly e Diego Luna, que sozinhos fazem valer a pena essa comédia criminal mediana; ela é uma das garotas tutoradas por Julia Roberts no bonitinho O Sorriso de Mona Lisa; faz uma pequena participação no clássico contemporâneo Adaptação, com Nicolas Cage e Meryl Streep (ambos nomeados ao Oscar); faz a voz da personagem Zee em A Casa Monstro; faz par com Viola Davis no edificante A Luta por um Ideal; e esteve na elogiadíssima comédia musical Frank.

Tendo tomado gosto pela televisão, em 2017 ela vai aparecer como a co-protagonista de James Franco em The Deuce, uma análise da Nova York dos anos 60 e 70, e mais especificamente do submundo do pornô e do erotismo. Maggie está escalada também em Three Seconds, drama sobre um ex-presidiário trabalhando para o FBI por baixo dos panos, que acaba sendo preso novamente para conseguir infiltrar-se na máfia de um presídio de segurança máxima. Olivia Munn (The Newsroom), Josh Brolin (Milk), Luke Evans (Drácula) e David Oyelowo (Selma) também estão no elenco.