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29 de nov. de 2013

Review: Person of Interest, 03x10 – The Devil’s Share

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ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

Todas as melhores séries de todos os tempos tem alguns denominadores comuns que as fazem tão boas, e um desses pontos similares é, sem dúvida nenhuma, a moral sempre avessa a definições fechadas. Está na própria concepção da narrativa televisiva episódica que o tempo todo a trama precisa ser um processo em construção, do primeiro minuto do piloto ao último do series finale (um luxo que poucas séries tem, infelizmente, é a possibilidade de “fechar” a narrativa da forma como se pretendia ou se desejava). Não é diferente para o aspecto moral da série, é claro, especialmente para aquelas nas quais essa questão em particular é tão central quanto é em Person of Interest.

Isso tudo para explicar que a completa indefinição e ambiguidade moral que pudemos perceber no episódio dessa semana nada mais é do que um dos sinais que, aos poucos, e especialmente pela mão firme do criador Jonathan Nolan (que aqui também assina o roteiro do epiósido), Person está se tornando uma daquelas séries que, daqui a anos e anos, vão ser lembradas como exemplo do que todas as outras podem ser se fizerem tudo certo. “The Devil’s Share” é o melhor episódio da temporada até o momento, e fica bem no alto se formos fazer um ranking dos melhores desses três anos de série, e o é simplesmente porque, ao mesmo tempo que conhece seus personagens e o coração da discussão que a trama em que eles estão envolvidos levanta, não quer deixá-los definidos demais a ponto de não nos dizer nada de novo. Esse é bem o ponto com Person, aliás. Mesmo três temporadas adentro, a série ainda consegue ser essencialmente nova.

Nessa semana, acompanhamos nosso quarteto de protagonistas (mais Root, menos Carter – RIP) lidando com as consequencias da morte de sua parceira, no final do episódio anterior. Nolan sabe articular o que cada um desses personagens vai sentir e como eles vão agir: o complexo de culpa de Finch é aumentado para o volume máximo, ou talvez seja mesmo o seu complexo de Deus que não admite que, sob a vigilância de sua máquina, uma policial limpa como Carter poderia ser morta; a “casca dura” de Shaw a impede de demonstrar sentimento no velório da amiga, e qualquer vestígio de luto se torna violência e combustível para fazer sua forma particular de justiça; Reese, que perdeu a âncora do que significava sua “nova vida”, volta aos antigos instintos e mais uma vez se parece com o homem que matou dezenas, talvez centenas, sob as ordens de quem quer que fosse o contrator da vez; e Fusco, bom, Fusco mostra que é o único que desenvolveu uma base moral forte o bastante para honrar a memória de Carter de verdade.

“The Devil’s Share” é em muitos sentidos um episódio sobre o que acontece com esses personagens quando eles perdem o chão, e mesmo com o seu final redentor, o retrato que Jonathan Nolan pinta não é tão bonito. E é muito um paralelo com o processo de luto que todos nós já passamos, também. A culpa, a raiva e a vontade de ser digno de se lembrar e agir de acordo com o que aquela pessoa queria. Esses personagens dão carne, osso e expressão a cada uma dessas “fases”, e estabelecem também, como fica claro no monólogo de Elias no final, que essa é uma trama sobre aqueles que vivem à margem da sociedade, e por isso precisam forjar seus próprios códigos morais. O problema é que qualquer que seja o que eles escolherem moldar, códigos morais tem a mania de trazer consequencias. Ou você é a vítima humana, ou você é o algoz desumano.

Elias está mais do que feliz em ser a segunda opção. Fusco, por outro lado, monta uma setpiece corajosa e extremamente comovente para advogar o lado da primeira. Seu monólogo ao derrotar Simmons em uma briga corpo a corpo acena para o fato de que Person não está pronta para dar crédito à justiça pelas próprias mãos, e ainda se amarra à jornada do personagem de maneira espetacular. “The Devil’s Share” abre com um take em close-up do monitor de um aparelho cardíaco, registrando os batimentos de Mr. Reese, e termina com a linha reta indicando o perecimento de Simmons perante o capanga de Elias. A diferenciação que Person faz entre o certo e o errado é tão primal quanto uma escolha simples entre a vida e a morte, mas a série faz um trabalho brilhante em mostrar que nem essa dicotomia fundamental é tão simples assim.

Observações adicionais:

- Não coube no review: Root é a personificação do clima de embate que existe entre Finch e a máquina na terceira temporada. A série está mantendo Root presa, assim como a força da máquina interferindo mais diretamente na trama e nas ações dos personagens. É uma força poderosa de narrativa que, por ser raramente liberada, fica ainda mais impressionante quando o é.

- Com Shaw, Person insiste na humanidade, mas vê a excitação de uma personagem que não mostra a sua. É uma casca que quase nunca se desfaz, mas traz reflexões muito interessantes ao fazê-lo. A personagem pertence a trama, e isso é raro e lindo.

- “Just when I think life with you people can’t get any weirder, one of you take it to the next level”

- A iluminação em todas as cenas é genial nesse episódio. Um trabalho maravilhoso do diretor Chris Fisher em casar esse detalhe de produção com a fotografia para dar o tom do episódio.

- Os flashbacks se apresentam todos como os personagens fingindo ser o que não são. É um retrato de convenção social que fica brilhante nessas setpieces convesacionais, e ainda são essenciais para entendermos a trama e os conceitos do episódio.

***** (5/5)

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Próximo Person of Interest: 03x11 – Lethe (17/12)

Caio

27 de nov. de 2013

Review: Mom, 01x10 – Belgian Waffles and Bathroom Privileges

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ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

Completando sua primeira dezena de episódios no ar, Mom está mais confortável com sua premissa e seus personagens do que qualquer série de Chuck Lorre já esteve. Semana após semana, é impressionante a consciência que a série tem de quem são essas pessoas em tela, e a forma delicada e gradual com a qual vai revelando novas facetas delas, nos levando a lugares novos e interessantes com sua trama. A Christy de Anna Faris é no momento uma das protagonistas de sitcom mais improváveis e imprevisíveis da televisão ameriana, e “Belgian Waffles and Bathroom Privileges” explora mais um lado dela sem cerimonias.

Na “trama” dessa semana (com aspas, porque Mom não faz muita questão de construir uma narrativa absolutamente estruturada), Christy se depara com o fato de que não há nada de absurdamente errado com sua vida no momento. Seus filhos estão felizes, o trabalho é ok, Bonnie vem sendo extremamente prestativa desde que se mudou para a casa da filha, e nada de muito maluco acontece para quebrar essa composição mais ou menos arranjada. O problema é que tudo isso a deixa muito frustrada, e a raiva que ela sente, talvez de si mesma, é direcionada toda a outras pessoas, seja a Bonnie ou a Baxter, o ex-marido que, depois de perder o apartamento, se muda para o quintal de Christy com sua vã.

Em certos momentos, dá para entender esse sentimento de Christy, principalmente porque Anna Faris o vende sem fazê-lo parecer patético ou imediatamente odiável, mas também porque a personagem de Allison Janney parece interferir um pouco demais nas questões da filha. Especialmente na subtrama da semana, que presumidamente vai se “completar’ nos próximos episódios, proque parte do nada e chega a lugar nenhum: Violet está sendo levada a frequentar a Igreja dos pais de Luke, o pai do seu bebê, e acaba se tornando uma crente que leva a Bíblia embaixo do braço. Ou quase isso. Sadie Calvano e os roteiristas trabalham juntos para não descaracterizar Violet nesse processo, e torná-lo compreensível como decisão de personagem.

Mom resvala na questão de Christy ter uma luta interna que nunca vai ser amenizada, especialmente nas cenas das reuniões do AAA, que aqui servem como uma ilustração e exposição do que a personagem está sentido. Mesmo quando vai tudo bem, Christy tem em si a necessidade de lutar contra o impulso do seu vício, e suas próprias memórias dele. “Belgian Waffles and Bathroom Privileges” é um episódio muito mais leve do que o da semana passada, naturalmente, mas é refrescante observar que Mom nunca perde de vista os lados sombrios de sua premissa. Isso faz do humor da série tanto algo mais natural quanto algo mais prazeroso. 

Observações adicionais:

- ‘Rejected!”

- Matt Jones está perfeitamente charmoso e engraçado como Baxter. Essa série deve uma participação maior – e algumas tramas próprias, talvez – a ele.

**** (4/5)

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Próximo Mom: 01x11 – Cotton Candy and Blended Fish (02/12)

Caio

Review: The Blacklist, 01x09 – Anslo Garrick, Part 1

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ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

“I’m gonna be around for the sequel”. Talvez seja só a minha leitura que é muito franca, mas The Blacklist é muito provavelmente a série mais aberta com o próprio público no mundo da televisão pós-Lost, em que as maquinações e intenções das narrativas televisivas se tornaram tão ou mais intrigantes e misteriosas do que os próprios desenvolvimentos da trama. Poucas foram as vezes nessa primeira temporada em que The Blacklist se achou no direito de blefar com o espectador, e todas as vezes que comprou essa aposta, a série se saiu bem. Na maior parte do tempo, no entanto, ela se safa de várias falhas de narrativa pelo simples motivo de não inspirar a uma complexidade tão intrinseca quanto a que The Following tentou alcançar, por exemplo. The Blacklist quer nos divertir, e nos mostrar cada vez mais desses dois protagonistas fenomenais que tem, e em boa parte do tempo isso é mais do que o bastante.

“Anslo Garrick, Part 1” faz muito bem em seguir essa tendência, indicando que mesmo os episódios especiais da série não tendem a almejar uma mudança nas regras do jogo. Quando muito, se trata de um realce de todos os riscos envolvidos em jogá-lo. Para começar, The Blacklist não abandona o pulp e acerta em cheio com o vilão da semana, o Anslo Garrick do título, interpretado por um Ritchie Coster (Luck, O Cavaleiro das Trevas) a beira da caricatura, com um dos olhos “cegado”, uma grande cicatriz no rosto e metade da boca paralisada. É o tipo de criminoso completamente irrealista, e ainda assim estranhamente ameaçador, que The Blacklist faz funcionar largamente ao seu favor, dando a ele alguns dos melhores diálogos do episódio e uma abundância de cenário para mastigar.

Garrick, ao que parece, é um velho inimigo de Red – que inclusive é o responsável pelo dano ao rosto do moço –, e um “extrator” profissional, o que torna fácil invadir o black site do FBI onde o personagem de James Spader estava após os federais receberem uma ameaça de morte contra ele. Num episódio mais puramente de ação e suspense do que qualquer um até agora, The Blacklist joga com seus protagonistas presos no prédio e tanto suas reações a essa situação extrema quanto seus inesperados aliados em campo. Red acaba preso com um Agente Ressler mutilado na perna, e Liz justa forças com o técnico Aram para desbloquear o sinal de comunicações que a equipe de Garrick anulou.

Mais importante que qualquer coisa, no entanto, é que Joe Carnahan está de volta à direção, emprestando a The Blacklist sua perícia visual e realçando um sentido de valor de produção que tem faltado nas últimas semanas. A câmera do diretor de A Última Cartada conjuga pequenas ousadias imagéticas que melhoram a experiência subjetiva do espectador no episódio com uma coesão e contundência visual que nenhum dos outros diretores que assumiram a série depois do piloto conseguiu manejar. Quem ganha com isso também é o elenco, que tem um pulso firme para guiá-los atraves da trama: James Spader está de volta a melhor forma, recitando diálogos longos e imbuindo Red de uma profundidade que não está no roteiro, e sim na sua atuação; Megan Boone supera o fato de que o episódio coloca Liz como uma heroína de ação completa de uma hora para a outra ao conseguir passar a estado de desespero que a personagem passa internamente ao realizar os atos mostrados em tela (que incluem dois assassinatos a sangue frio, pasmem!).

Os coadjuvantes, como é de costume, não ganham muito destaque. A performance de Diego Kattlehoff ganha força e profundidade nesse episódio, mas o tempo todo em que Red está preso com Ressler na caixa, o agente se torna mais interessante simplesmente porque está ali como um espelho para dizer algo sobre o personagem de James Spader. Em dois monólogos especialmente essenciais, The Blacklist se deixa dizer muita coisa sobre si mesma: o primeiro, enquanto Red realiza uma transfusão de sangue com Ressler, toca na questão da ambiguidade moral que é central para a série e admite que mesmo no mundo extremamente complexo declamado por Red, certos valores universais são mais humanos do que lógicos; o segundo joga uma nova luz sobre o personagem, dando dicas de que ele encara essa trama toda que estivemos a nove semanas como simplesmente uma forma de sobreviver. Num episódio com riscos tão altos, isso só realça a ação.

Observações adicionais:

- A série ainda aposta na coolness da própria premissa de ter James Spader em um colete a prova de balas e armado até os dentes.

***** (4,5/5)

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Próximo The Blacklist: 01x10 – Anslo Garrick, Part 2 (02/12)

Caio

26 de nov. de 2013

O triângulo amoroso do Icona Pop (em Paris!) no clipe de “Just Another Night”

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por Caio Coletti

Como um hit só não faz carreira, o Icona Pop tá investindo pesado na divulgação do seu primeiro álbum com lançamento americano, o This Is…, lançado em Setembro último. A ótima “All Night” não pegou, provavelmente por causa do conceitual (e lindo) videoclipe, mas a balada “Just Another Night” tem uma chance mais concreta.

O vídeo da canção de vibe oitentista ganhou tratamento simples mas sofisticado, contando a curiosa e engraçada história de um triângulo amoroso formado por “duas garotas suecas e um homem italiano em Paris”. Filmado em preto e branco, com filtro de filme antigo, o clipe é um charmezinho a ser apreciado.

25 de nov. de 2013

Vem ser nostálgico com o The Killers e a Dianna Agron (!) em “Just Another Girl”

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por Caio Coletti

Dez anos de The Killers condensados em 4 minutos. Essa é a missão que “Just Another Girl”, mais um clipe de uma música inédita do Direct Hits, coleção de singles lançada pela banda de Brandon Flowers e cia lançado no últmo dia 11. Para fazer essa recapitulação ficar ainda mais divertida, eles chamaram Dianna Agron, a Quinn de Glee, para vestir os vários mantos do vocalista Flowers nessa década de carreira.

A moça passa pelas ombreiras e maquiagem de “Mr. Brightside”, pelo traje ridículo e espacial de “Spaceman”, pelos cenários desérticos que marcaram a era Sam’s Town e pelos cenários de outros hits como “Human” e “Somebody Told Me”. Tudo com a expressão de eterno desprezo e os movimentos inconfundíveis de Brandon.

The Boss is back: Bruce Springsteen lança o novo single, “High Hopes”

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por Caio Coletti

Depois de ser declarado “o melhor show da Terra” do alto de seus 64 anos, o coroa mais-que-enérgico Bruce Springsteen, ou The Boss, como é chamado pelos americanos, anunciou ontem (25) o lançamento do 18º álbum de estudio da carreira. Intitulado High Hopes, o disco ganhou uma prévia quando Springsteen lançou a faixa-título e primeiro single no Youtube.

A canção tem batida forte e violão acústico, com a mesma pegada acelerada do último álbum, Wrecking Ball, mas uma instrumentação menos evocativa e mais crua. É a contribuição do guitarrista Tom Morello, conhecido pelo trabalho no Rage Against The Machine, com quem Springsteen e a E Street Band escreveram oito das músicas do álbum durante uma fatia da turnê para promover o último álbum.

O restante do tracklist vai incluir algumas canções antigas nunca lançadas ou gravadas em estúdio, algumas delas especialmente com a participação do falecido saxofonista da E Street Band, Clarence Clemmons. High Hopes sai no dia 14 de Janeiro de 2014.

Review: Masters of Sex, 01x09 – Involuntary

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ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

Existe uma particularidade em Masters of Sex que talvez nenhuma outra série no ar tenha tão palpavelmente: ela é muito menos sobre a trama que desenrola em tela do que é sobre os temas contidos nela. A construção de arcos de personagem tem sido nessa primeira temporada – que aos poucos se aproxima da reta final – mais micro do que macroscópica, com exceção da enorme e extremamente cuidadosa evolução do relacionamento de Bill e Virginia (e suas consequencias para o casamento do doutor com Libby). Dessa forma, a série fica mais livre para explorar as múltiplas facetas da complexa relação social que examina entre a sexualidade na década de 50 e a repressão à natureza humana.

A diversidade de cores no mosaico pintado por Masters é deslumbrante, mas também implica que a série precisa ter protagonistas sólidos como uma rocha em seu centro. É essa parte do desenvolvimento que por vezes (como em “Love & Marriage”, na semana passada) fica um pouco negligenciada, especialmente tendo em vista a personagem de Virginia. Vejam bem, em uma série movida essencialmente por plot, como The Blacklist, por exemplo, não há nada de mal em usar uma personagem como dispositivo de trama, mas a partir do momento que a história contada é parte de um tema tão intrínseco a lógica da série, e que cumpre um papel tão grande em seu desenvolvimento, o truque simplesmente não funciona. É um testamento a inteligência do time de desenvolvedores de Masters que “Involuntary” faça um trabalho tão bom em vulnerabilizar Virginia, e é um exemplo que deveria ser seguido nas próximas instâncias da série.

Para uma série que olha tão intimamente para os seus personagens, Masters sempre retratou a personagem de Lizzy Caplan como essencialmente infalível. Claro, ela tem problemas com o filho que a odeia, mas até isso é uma consequencia de sua dedicação pioneira a um trabalho científico quebrador de fronteiras, e sua obstinação em conseguir um diploma de medicina. Não há nada de errado, pelo contrário, em fazer de Virginia uma mulher destemida e o exemplo-maior de personagem feminina a frente de seu tempo nessa trama (ao lado da Dra. DePaul, é claro). O problema é que até as mulheres destemidas e pioneiras da liberação sexual precisam ser seres humanos de verdade, e seres humanos de verdade falham. Frustram-se. Decepcionam-se.

Lá pelo final de “Involuntary”, essa dedicação pioneira de Virginia ao trabalho dela e do Dr. Masters esbarra no fato de que ela se envolveu demais com o que os dois estavam fazendo (seja a pesquisa, seja o caso extra-conjugal que estavam conduzindo). A intimidade construída entre os dois nos últimos episódios desaba, e é sobre a cabeça de Virginia que fica o peso. Há dicas de que, além de tudo isso, a moça é uma pessoa extremamente solitária, mesmo na bobinha side-story sobre os problemas dela na faculdade. Não é o caso de pintá-la como carente, ou patética. Virginia é uma mulher magnífica, mas aínda é uma mulher, e está na condição humana que todos nós esporadicamente nos deixamos enganar quanto a natureza de algo. É trágico que, no caso da personagem, tenha sido justamente aquilo que ela mais preza em sua vida, mas a tragédia está no coração de Masters of Sex.

Tanto que as duas outras histórias principais do episódio não escapam muito desse tom. As desventuras de Libby tentando lidar com a gravidez e, mais tarde, com a reação de Bill a notícia, são verdadeiramente comoventes, em grande parte porque Caitlin FitzGerald interpreta tudo o que essa série joga para ela com o mesmo toque de fragilidade e dignidade. O trabalho que os escritores tem feito com a personagem é exemplar, aliás, e Noelle Valdivia (Smash) não deixa cair a peteca nesse nono episódio, elaborando uma linha crescente que culmina em um exasperante monólogo: “The purpose of sex isn’t an orgasm. It’s making life”. É curioso como a série apresenta Libby com uma perspectiva tão conservadora sem minimizá-la, e não dá ao espectador essa opção tampouco. O que ela diz sobre o amor e a família serem o que prende o homem a Terra e ao propósito da vida tem algo de inegavel, e está no coração de Masters. A série admite ambiguidade e relativismo no seu próprio cerne moral, e isso é lindo.

No lado de Ethan e Vivian, assistimos a queda de um relacionamento que, embora as perspectivas interessantes construídas nos últimos episódios, estava fadado a ter esse destino. “No. You picked me, Viv”, dispara Ethan (Nicholas D’Agosto não exatamente se mostrou apto ao desafio do personagem mais complexo que vemos nesse episódio) no diálogo conceitualmente brilhante que tem com a não-mais-futura-esposa. O episódio apresenta o Dr. Haas sobre uma nova perspectiva, ou talvez esclareça aquela que sempre esteve presente no personagem, como um homem que não realiza as próprias escolhas, e deixa a maré social levá-lo para onde for. A reflexão de um paciente mais velho em certo momento do episódio é mais do que esclarecedora, se conectando com o próprio ponto da série ao mostrar os arrependimentos e amarguras que vem de seguir algo além dos seus próprios desejos.

Observações adicionais:

- E tudo isso num episódio sem traço de Allison Janney. De fato, essa série pode fazer qualquer coisa.

- Talvez seja uma das últimas vezes que vemos Rose McIver como Vivian, então façamos nossos aplausos ao trabalho absurdamente versátil que a atriz fez nesses episódios em que esteve em foco.

- A primeira cena de Bill com a mãe é um trainwreck emocional. Um jogo de vontades e amarguras que só uma relação mãe e filho especialmente bem retratada e honesta poderia ter. Ann Dowd e Michael Sheen interpretam maravilhosamente juntos. A história toda envolvendo o personagem e a mãe serve para nos mostrar que o limite e o fantasma de Bill é o seu passado, um para o qual ele se recusa a olhar.

- O humor com que a série trata o sexo amadureceu. Ele não mais diminui ou convencionaliza aquilo que a trama tenta desmistificar. É um alívio cômico que acompanha a excitação da descoberta.

***** (4,5/5)

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Próximo Masters of Sex: 01x10 – Fallout (01/12)

Caio

Três performances que roubaram o show no AMA 2013

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Katy desafinou, tirando a graça da lindíssima “Unconditionally”. Miley e seu pseudo-kitsch não empolgam mais ninguém. A maravilhosa “Say Something”, do A Great Big World com participação de Christina Aguilera, ganhou a apresentação sóbria e lacrimejante que todo mundo esperava. E apesar da boa energia, artistas como Imagine Dragons, Luke Bryan, Florida Georgia Line, One Direction, Jennifer Lopez e Pitbul (com Ke$ha!) não chegaram a empolgar, mesmo com apresentações bem calculadinhas. Eis que sobrou, portanto, para três nomes titânicos do pop levantarem a bola do AMA 2013, que aconteceu ontem (24): Lady Gaga, Rihanna e Justin Timberlake.

Com muita gente taxando o ARTPOP como um flop sem precedentes (injustamente, visto que todos os grandes lançamentos pop de 2013, com pouquíssimas exceções, fecharam sua primeira semana de vendas com números bem parecidos com os do novo álbum da ítalo-americana), Lady Gaga realizou uma performance que não pode ser descrita de outra forma: uma piece de resistance. Em mais uma de suas elaborações narrativas, a cantora viveu a secretária do presidente R. Kelly, numa referência mista de Marilyn & JFK com Bill Clinton & Monica Lewinski. O importante é que o affair entre os dois termina – não antes da já polêmica dança sexy em cima da mesa presidencial, com o comandante-em-chefe americano negando para os repórteres que conhece a secretária de Gaga.

Daí para os vocais crus em cima de um piano, enquanto no telão do fundo apareciam imagens de Gaga na infância e manchetes do tipo “Lady Gaga is over! Lady Gaga is fat!”, foi um pulo. Tudo ao som do genial refrão de uma canção que, além dele, tem muito pouco de realmente bom: “You can’t stop my voice ‘cause/ You don’t own my life, but/ Do what you want with my body”. É preciso se render ao novo single do ARTPOP, no entanto, e dizer que é uma das canções que melhor capturam a relação de amor e ódio de Gaga com a cultura da celebridade e, especialmente, com as consequencias que a exposição tão completa dos seus ideais nada convencionais traz para ela. A performance de ontem no AMA valoriza muito a música ao expor esse lado perfeitamente.

2013 marcou a entrega do primeiro prêmio honorário concedido pelo AMA, e quem levou o Icon Award para casa foi Rihanna. Aos 25 anos, a cantora foi celebrada pelo seus recordes absurdos de vendas e posições em paradas, pela contribuição à música pop e pela inspiração que tem dado às mulheres da nova geração. A premiação foi marcada primeiro por uma performance de “Diamonds”, um dos seus doze singles a alcançar o #1 na Billboard Hot 100, toda diferente. De cabelo preso e elegante em seu vestido preto, Rihanna cantou acompanhada de orquestra e deu um show de magnetismo e voz no palco, passeando facilmente por uma das canções que mais marcaram sua carreira.

Antes ainda de receber seu prêmio, no entanto, a barbadiana foi pega de surpresa pela entrada da mãe, Monia Fenty, no palco para discursar sobre a filha (momento que rendeu um “how cute Rihanna’s mom is, though?” de Justin Timberlake quando o moço subiu no palco logo depois receber outro prêmio). Emocionada e extremamente delicada como sempre, Rihanna não se alongou no discurso e levou com graça e elegância um prêmio mais do que merecido para casa.

Por falar em Justin Timberlake, o moço (re-re-re-re)confirmou que 2013 foi mesmo o ano dele ao levar três troféus na noite: Favorite Pop/Rock Male, Favorite R&B/Soul Male, Favorite R&B/Soul Album, esse último pela edição completa do The 20/20 Experience, reunindo as duas “partes”  do álbum. Foi também a primeira vez que Justin performou uma da canções da segunda fatia da sua experiência musical, que saiu no final de Setembro último. A escolha foi sábia, porque “Drink You Away” é mesmo uma das melhores faixas do álbum, introduzida pelo cantor da maneira insinuante que já conhecemos (“We are JT and The Tennesee Kids, and this is a song about alcohol”) e executada com garra e soul. Um absoluto deleite.

21 de nov. de 2013

Demi Lovato mais diva pop do que nunca no iluminado clipe de “Neon Lights”

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por Caio Coletti

Depois de colocar “Heart Attack” no top 10 da Billboard e não conseguir o mesmo feito com “Made in The USA”, Demi Lovato resolveu apostar na faixa que sempre teve o potencial comercial mais forte do seu álbum auto-intitulado de Maio passado. “Neon Lights” é uma explosão eletrônica à la Ryan Tedder, que ganhou clipe hoje (21) para apoiar tanto o álbum quanto a turnê Neon Lights Tour, que Demi inicia em Fevereiro de 2014.

No vídeo, a cantora aparece com o cabelo azul que esteve usando nos últimos episódios do X Factor US, onde é jurada, e maquiada com tinata neon em outros momentos. Bem produzido, cheio de águas e espelhos e super adequado para a música, o clipe leva Demi para mais perto do posto de diva pop do que ele jamais esteve.

20 de nov. de 2013

Review: Person of Interest, 03x09 – The Crossing

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ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

Uma míriade de possibilidades passou pela cabeça deste que vos fala ao considerar começar o review de “The Crossing”, nona entrada da terceira e fenomenal temporada de Person of Interest. A que mais chegou perto de tocar o significado e a essência dessa hora de televisão, no entanto, soou técnica demais: existe uma regra nunca dita no mundo da narrativa, ou seja, no mundo que observa o comportamento e a condição humana de forma mais aguda, que dita mais ou menos que nenhum plot point, conceito ou traço de personagem pode se sobrepor ao fato de que há pessoas nas suas vidas que eles amam mais do que tudo. Mais do que qualquer plano de vingança, ambição ou trama complicada, é nessa característica que mora a chave para fazer cada personagem verdadeiramente humano. Parece piegas, mas é simplesmente infalível.

“The Crossing”, no entanto, é mais que um excelente exemplo da soberania dessa elaboração na construção de narrativa. Difícil explicar, a não ser para quem passou por experiência semelhante, o quão parecida (guardadas as proporções) com a dor de uma perda real é de se despedir de verdade de um personagem que fez parte de uma fatia da vida do espectador. Assim como tudo na ficção, essa dor é um espelho conceitual do mundo real, e mistura o choque, a contemplação do quanto ficou inacabado para trás da vida daquele personagem, a revolta pelo mérito ou desmérito dessa morte. Nesse episódio, porque estamos falando de Person e não de American Horror Story, nos despedimos da Detetive Carter de Taraji Henson. E é uma despedida que explode tudo o que veio antes, e coloca o episódio acima de qualquer crítica.

Damos a partida onde terminamos na semana passada, com Reese e Carter, com Alonzo Quinn como refém, correndo contra o tempo e os infinitos recursos da HR para levar o chefão do grupo direto para um prédio do FBI, a única instituição onde Quinn não deve ter agentes infiltrados. A caçada de uma noite por Nova York  envolve todos, como era de se esperar, de Fusco e Shaw formando uma dupla improvável até o primeiro ser sequestrado e torturado pelos policiais corruptos dos quais foi um dia colega, até Mr. Finch lutando contra a perspectiva de pedir ajuda para Root (e para a máquina, por conseguinte) e tendo que intervir de corpo presente no último minuto. A máquina cospe o número de Reese, o que complica ainda mais as coisas, porque traz a atenção o fato de que 2/3 da comunidade criminosa da cidade, graças a uma recompensa oferecida pelo HR, está a procura da cabeça do moço.

Denise Thé, já em sua sétima colaboração na série, assina o roteiro, costurando tramas significativas para todos os personagens (Finch e Shaw são um pouco secundários, mas tem sua parcela de brilho) e mostrando o quanto os entende. Fusco, por exemplo, tem várias setpieces incríveis no decorrer do episódio, o que é sempre bem-vindo, porque Kevin Chapman é um ator extraordinário, visceral e carismático quando lhe é dada a oportunidade. Conhecemos o filho do personagem, e logo depois vemos seu desespero quando a HR passa absurdamente perto de executar o garoto, seu alívio quando Shaw aparece no último minuto para salvar o dia, e sua conflituosa raiva ao sufocar um dos policiais que estava o mantendo preso com as correntes das algemas.

O ponto principal aqui, no entanto, exatamente como eu disse lá em cima, é que nada disso nunca ultrapassa o amor como tema central. O triunfo da HR, no final das contas, é saber que aqueles que estão sob seu comando podem aguentar tudo, menos perder aqueles que amam. Por outro lado, o triunfo dos subjugados – e o que os leva a deixar de ser – é o quanto eles realmente amam. O episódio aplica isso a Fusco e ao filho, a Finch e a Reese (é a menção de que John pode morrer que faz Harold considerar o indíviduo sobre a sociedade pela primeira vez em sua vida), e especialmente a Carter. A personagem de Taraji Henson, que fez um trabalho estupendo e precisa ser reconhecida por isso, nos deixa no meio de seu arco de personagem, mas seu ensinamento é claro: se existe algum ponto de equilíbrio entre as trevas e a luz, ele está no genuíno sentimento de afeição por aqueles que nos cercam.

Observações adicionais:

- “The Crossing” começa com a máquina escutando uma conversa entre Reese e Carter! Person está definitivalmente virando o jogo nessa temporada, um plot point que está sendo trabalhado muito sutilmente no passar dos episódios. Colocar Reese como o número da vez aqui também faz parte desse movimento, e a hesitação de Finch em recorrer a uma intervenção mais direta da máquina também.

- É mais do que hora de reconhecer o bom trabalho de Robert John Burke em ser completamente odiável como Simmons. A voz monótona e rouca e a atitude ameaçadora são uma presença assombrosa em “The Crossing”.

- “You know the dog’s the only one that likes you, right?”

- O episódio também toca de leve na relação de Finch com Reese como complexa. Seja ao sabermos que em parte ele é responsável pela quase morte do moço, seja agora que descobrimos que ele não é o primeiro “ajudante” do personagem, esse distanciamento coloca Harold como um quase monstro, mas salienta também o quanto ele tenta não ser.

- “Seems like the only time you need a name now is when you’re in trouble”

- Eu não citei o súbito romance entre Reese e Carter porque é uma jogada barata em um episódio que de barato não tem nada. A própria série parece reconhecer isso. A conexão entre Reese e Carter é de almas parecidas, com experiências e conceitos parecidos. Essa dor era o bastante para transformar o personagem de Caviezel, não era preciso forçar um sentimento romântico que nunca esteve em pauta na série.

***** (5/5)

PERSON OF INTEREST

Próximo Person of Interest: 03x10 – The Devil’s Share (26/11)

Caio

Estreia: “Almost Human” faz jus ao seu título, e precisa de só um pouco mais para funcionar

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ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

Se há uma característica que distingue todas as boas séries no ar atualmente, é que em cada uma delas existe uma nuance absolutamente particular. No formato televisivo convencional, de episódios semanais, uma trama triunfa quando evolui ao ponto de poder se desenvolver dentro de uma linguagem própria, criar lógicas e códigos morais e visuais internos para se guiar (e guiar o espectador). O relacionamento de lealdade do espectador para com a série depende muito do quanto os showrunners são competentes para criar esse mundo completo, que funciona de acordo com as próprias regras.

Person of Interest, para citar um exemplo de procedural – mais sobre esse “gênero” e sua relação com Almost Human nos próximos parágrafos – já no decorrer da primeira temporada se mostrou capaz de torcer a perspectiva sobre a sua premissa em uma infinidade de maneiras novas, procurando sempre seguir a lógica paranóica e comunitária, ao mesmo tempo, que estabeleceu. O problema de Almost Human nesses dois primeiros episódios exibidos pela Fox no último final-de-semana é que, enquanto não tem experiência o bastante para definir qual será sua abordagem ao universo que constrói e que tipo de “internalidade” será sua linha-mestra, a série resolve substituir esse sentimento por… nada.

Eu não quero ser pessimista em relação a nova série de J.J. Abrams e J.H. Wyman, primariamente porque eu acho que ela tem pessoas talentosas o bastante envolvidas com ela para se constituir, nas próximas semanas, como algo bem melhor do que foi apresentado até agora. Ao mesmo tempo, não posso deixar de dizer que essas duas horas iniciais de Almost Human não tem absolutamente nada de realmente particular para se apoiar. Pelo contrário, são uma colagem de referências, estilos e clichês da ficção científica, que minimamente funcionam pela pura força de vontade do elenco e da produção, uma das mais apuradas da TV atualmente.

Para começar, temos as referências óbvias: Eu Robô, Blade Runner e Fringe. O mundo cyberpunk de 2048 é claramente inspirado pela obra do escritor Phillip K. Dick, enquanto a premissa de um robô mostrando a um humano o quão sensitivo ele pode ser vem direto das viagens sentimentais de Asimov. A mistura deve empolgar os fãs de ficção científica (este que vos fala é um deles, então posso falar!), mas a verdade é que o conceito é melhor que a trama: um policial que passou 2 anos em coma e carrega uma perna sintética (Karl Urban – no papel do policial, não da perna) ganha um parceiro andróide (Michael Ealy) de uma linha obsoleta, e é incumbido por sua superior (Lili Taylor) de investigar uma série de crimes atribuidos a uma organização conhecida como Insyndicate, responsável pelo incidente que o deixou apagado – e pela morte de seu parceiro na época.

Fringe entra na mistura devido a forma como a série articula desde já um “grande mistério”, envolvendo tanto a tal Insyndicate (cujos objetivos nunca são deixados claros) quanto a ex-namorada do protagonista, que aparentemente estava na equipe que o nocauteou anos atrás. O senso de gore e de pulp também são emprestados da série materna de J.H. Wyman, que assina o roteiro do episódio piloto. Nas mãos dele, os personagens principais ganham formas interessantes, ainda que o detetive de Urban seja um herói estoico e cínico daqueles que precisa reagir a outros bons personagens para funcionar. Isso é um crédito quando ele divide a cena com Ealy, em estado de graça com uma vivaz atuação  para um personagem já de antemão cheio de nuances. Um dos maiores problemas de Almost Human, no entanto, é que o time de coadjuvantes não parece se impor para além de ferramentas de trama.

É no segundo episódio, “Skin”, que fica mais claro que muito disso a série herda dos procedurals clássicos como CSI e NCIS. Não por acaso, o episódio é escrito por um colaborador dessa última, Cheo Hodari Coker, o que significa que uma parte do material emocional de personagens funciona, e uma boa parte da trama da semana não. Pese aí uma trilha-sonora mão-pesada, e a decisão mais uma vez nada particular de explorar a sexualidade e a mortalidade como temas. De Blade Runner a AI, essas foram as duas grandes questões da ficção científica, especialmente a que envolve andróides, e não há nada de errado nisso – afinal, esses também são grandes temas da natureza humana –, mas Almost Human precisa se posicionar em meio a esses clichês para se revelar como a série de personalidade que pode ser.

Observações adicionais:

- Urban e Ealy são seriamente ótimos em cena juntos. A química funciona, os diálogos exploratórios e intrusivos passam batidos pela natureza do personagem de Ealy, e muitas das partes mais interessantes de “Skin” acontecem quando os dois estão conversando, sozinhos, no carro.

- Há mais do que um pouco de Ridley Scott na forma como o diretor Michael Offer filma as sexbots em “Skin”.

**** (3,5/5)

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Próximo Almost Human: 01x03 – Are You Receiving? (25/11)

Caio

Review: Mom, 01x09 – Zombies and Cobb Salad

MOM

ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

“Zombies and Cobb Salad", assim como a série da qual faz parte, não é um episódio perfeito. Lá perto do final, quando descamba para a farsa em três cenas repetidas de personagens literalmente pulando nos pescoços um dos outros, soa forçado e nada engraçado. Aliás, para ser toralmente sincero, essa meia hora de televisão tira boa parte de suas risadas do desconforto de quão descabido é rir de uma situação assim, mas isso é estranhamente adequado. Na sua nona entrada da temporada (o que significa que estamos mais ou menos na metade do primeiro ano), Mom entrega um episódio excepcionalmente sombrio para uma sitcom – “a bit of a downer”, como os americanos costumam dizer.

Essa sobriedade, para usar o termo perfeito para a trama, no entanto, é mais do que bem-vinda para uma série com a premissa de Mom. No final das contas, não dá para fugir das sombras quando você tem uma série sobre mãe e filha alcoólatras vivendo uma vida infernal e tentando ficar sóbrias ao mesmo tempo, enquanto a rebenta dessa última, em seus anos de adolescência, aparece grávida. “Zombies and Cobb Salad” é naturalmente dark por encarar esse assunto de frente quando Bonnie perde seu emprego – e também o apartamento – e comete um deslize de sobriedade. Por mais divertido que seja ver Allison Janney encarnando uma Bonnie bêbada, é ainda mais pungente o seu retrato do quanto essa mulher não quer desapontar Christy novamente.

É curioso como Mom tira humor dessa premissa, porque é a abordagem perfeita: ao invés de fazer graça com a situação pela qual passam as personagens, Chuck Lorre e companhia preferem realçar o humor na forma como elas lidam com isso. O pressuposto vale para Christy (embora menos nesse episódio) e Bonnie, mas também para as coadjuvantes Marjorie e Regina (Mimi Kennedy e Octavia Spencer estão de volta!). Kennedy, especialmente, faz um trabalho surpreendente no papel da junkie sessentista que passou os últimos 30 e poucos anos sóbria. A atriz não perde o senso de ridículo da personagem, mas não parece disposta a abdicar do fato que existe nela uma dignidade inerente e, ao mesmo tempo, uma experiência passada, que falam alto.

Testamento aos roteiristas de Mom é o fato que “Zombies and Cobb Salad” só não é engraçado quando não deve ser (nominalmente, em um par de cenas no AAA, e no momento confessional de Bonnie com Marjorie e Regina). O episódio dá um passo importante na premissa da série, que continua se desenvolvendo a passos graduais e amadurecidos conforme os personagens se solidificam em tela. Ao desacelerar o seu processo de crescimento, Mom escapa das dores que vem com ele, e garante que ele permaneça constante.

Observações adicionais:

- “Wow, does everyone wanna strangle you, or just me?”

**** (4/5)

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Próximo Mom: 01x10 (25/11)

Caio

19 de nov. de 2013

Katy Perry e “Unconditionally”, uma obra de arte em forma de clipe

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por Caio Coletti

“Some say the world will end in fire,
Some say in ice.
From what I've tasted of desire
I hold with those who favor fire.
But if it had to perish twice,
I think I know enough of hate
To know that for destruction ice
Is also great
And would suffice.”
(Fire and Ice, Robert Frost)

“Unconditionally” não é só o melhor videoclipe da carreira de Katy Perry. É também, provavelmente, o melhor videoclipe do ano. Ainda assim, no entanto, isso não basta para descrever o que a artista pop fez com esse novo single, em termos de beleza estética e narrativa cifrada. A poeminha aí em cima, um clássico, tem muito a ver com o que “Unconditionally” quer nos dizer. Além de, é claro, inspirar muito o simbolismo do clipe.

Durante os 4 minutos de vídeo, vemos Katy em dois ambientes diferentes, embora ambos pareçam se misturar devido aos dançarinos que realizam uma coreografia ininterrupta entre eles. No primeiro, um largo aposento luxuoso com uma enorme cama, aos poucos dá para perceber que vemos o mundo se consumir em fogo (primeiro a própria Katy, depois a cama), enquanto aos lados da cena vários atores posam para quadros vivos representando, não por acaso, os desejos humanos. É notável a beleza das composições que misturam figuras de maternidade, envelhecimento, afeto e atração sexual. São os momentos mais perfeitamente compostos do clipe.

No segundo ambiente, neva. O dançarinos prosseguem sua dança de entrelaçar de mãos e olhares ao ar livre, enquanto Katy canta e, lá perto do final, transforma o lugar em uma rodovia, onde é atingida por um carro que se despedaça. A tragédia, talvez como no cenário do fogo (e interligada a ela em uma assombrosa e linda imagem do carro batido transbordando em flores – as mesmas que explodem atrás de Katy no outro ambiente), consome as aspirações e beleza da “personagem” da cantora. Numa canção sobre amor incondicional não correspondido e, em última instância, sobre aprender a estender esse amor a si mesmo, é mais do que apropriado que a tragédia toda resulte em uma imagem tão bonita quanto a do final do clipe.

Jessie J revela o lado sombrio do Alive no novo clipe, o ótimo “Thunder”

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por Caio Coletti

“Thunder”, terceiro single retirado do Alive de Jessie J, chega não só com a incumbência de ser a primeira música de trabalho realmente boa do novo álbum, como também de, quem sabe, reafirmar que o sucesso de Jessie J nas paradas vai além de sua Inglaterra natal, onde virtualmente tudo o que ela lança é garantia de hit.

A canção produzida pelo duo StarGate e por Benny Blanco traz um clima de synthpop oitentista que é uma boa quebra com as guitarras e quedas de tom dos dois singles anteriores, e o vídeo ganhou tratamento visual bem apurado, com Jessie performando acompanhada de longos véus pretos nos braços, evocando um pouco “I Drove All Night”, de Cyndi Lauper.

Franz Ferdinand vertiginoso – ou será o Keane? – no clipe de “Bullet”

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por Caio Coletti

Depois das cores de “Right Action”, do surreal mundo de “Love Illumination” e do filme de terror de “Evil Eye”, o Franz Ferdinand apostou em algo mais simples para o seu novo vídeo: “Bullet” consiste na banda, filmada em preto-e-branco, no meio de trilhos circulares que rodam uma camera ao redor da performance.

A ideia não é nova, como os fãs do Keane devem se lembrar, mas ainda é um conceito simples e que prende a atenção, especialmente porque o diretor de “Bullet” resolveu explorar outras opções com as imagens que conseguiu, aplicaqndo closes nos músicos e congelando imagens marcantes.

A energia ao vivo de Phillip Phillips no clipe de “Where We Came From”

phillip

por Caio Coletti

Talvez o mais bem-sucedido vencedor do Idol em muito tempo, Phillip Phillips viu seu álbum de estreia passar recentemente da marca de 1 milhão de unidades vendidas, número só igualado por Scotty McCreery entre os vencedores das últimas 5 temporadas do programa.

Talvez parte uma celebração, “Where We Came From” é o terceiro clipe do moço, e pretende capturar a energia que os shows de Phillip desprendem. Quem esteve em São Paulo na Arena Anhembi – onde ele abriu o show de John Mayer – ou no Rock in Rio, sabe do que estou falando.

18 de nov. de 2013

Review: Masters of Sex, 01x08 – Love and Marriage

MASTERS OF SEX (SEASON 1)

ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

Quando pela primeira vez o tema da homossexualidade surgiu na mira de Masters of Sex, lá no terceiro episódio (“Standard Deviation”), fixou extremamente claro que a série tomava posição simpática ao assunto, mas talvez pretendesse manter a distância, assim como seus protagonistas, porque não estava nessa discussão o seu centro nervoso. Nessa semana, cinco episódios depois, Masters volta a investir com peso no assunto após algumas storylines secundárias em oportunidades anteriores, protagonizadas pelo Provost Scully de Beau Bridges, mas observadas sempre do ponto de vista “de fora” (o do Dr. Masters, o da esposa Margaret, o do garoto de programa Dale).

A tentativa de elabborar a discussão em torno da homossexualidade dentro de uma história que é essencialmente sobre os limites de gênero, no entanto, não soa exatamente natural. Com a maior centralização em Barton, somos levados a observar as intimidades de sua vergonha e medo da própria orientação sexual, chegando ao ponto de mentir para Margaret mais uma vez, dizendo que a trai com prostitutas ao invés de confessar que Dale é seu “amante”. É um retrato pungente, principalmente quando o personagem do talentoso Finn Wittrock expressa em uma explosão de raiva um sentimento parecido de auto-rejeição, mesmo que envernizado sob uma camada de indiferença amarga.

Então, não é que Masters lide mal com a questão da homossexualidade em sua ambientação de época. Pelo contrário, é uma das abordagens mais honestas que a televisão já foi capaz de produzir, e é importante que ela seja repetida e imitada muitas vezes. O problema é que essa parte da trama parece tão desconectada do restante do tema que até estraga uma parte de “Love and Marriage”, episódio não tão bem amarrado em torno de um motivo como os três anteriores, mas com o meso senso de direção e minúcia com os personagens. Quase tudo nessa hora de televisão é extremamente coerente, como peças só levemente interconectadas que aos poucos vão se juntando em um movimento impressioante, mas a storyline de Barton soa como se a série estivesse esticando seus braços longe demais. A discussão de gênero e a de sexualidade, afinal, são bem diferentes.

Esse tema central está bem disposto no título, emprestado de um standard pop (famosamente gravado por Frank Sinatra) que fatalmente seria cantarolado por algum personagem no meio do episódio. Escolha perfeita foi dá-lo para Vivian Scully, não só porque Rose McIver faz uma rendição adorável da canção, mas porque é ela quem representa a instituição tradicional em Masters. Embora sua personagem passe por enormes mudanças de tom de episódio por episódio, é notória a desenvoltura da atriz em retratá-la como uma mulher determinada em seu objetivo, mesmo que ela seja uma convenção conservadora. Eu disse na semana passada que Masters via as interações entre o Dr. Haas e Vivian como uma forma de provar que, mesmo com o modenro permitido, o tradicional ainda funciona para algumas pessoas. “Love and Marriage” não nos leva muito fora dessa rota, mas faz um bom trabalho em expandí-la.

A história de Ethan e Vivian corre paralela a de Barton e Margaret, e uma parece existir para contrapor a outra, ao mesmo tempo que observamos Masters e Virgina desmoronarem as noções conservadoras do sexo. A Margaret de Allison Janney, em um ponto do episódio, aconselha Dale – sem saber que ele é o amante do marido – a nunca se casar, porque é tolo pensar que seu relacionamento vai ser a exceção daqueles que se desgastam e perdem o brilho com o tempo. A personagem não sabe que seu matrimônio nunca teve esse brilho por outros motivos, é claro, mas ainda assim é preciso apreciar a performance de Janney, uma das melhores coisas em Masters of Sex desde que apareceu divinamente em “Catherine”, três semanas atrás. Em seu olhar há dúvida, baixo-estima e, ao mesmo tempo, resiliência e elegância, uma mistura poderosa nas mãos de uma atriz que sabe lidar com ela.

Há um certo cinismo, e nele uma certa dualidade, na forma como a série enxerga esse seu tema matrimonial, no entanto. Algo na storyline entre Bill e Virginia sugere que a instituição do relacionamento advem de uma vontade de controle, especialmente quando o personagem de Michael Sheen mostra-se temeroso ao saber que sua companheira de pesquisa e amante está completando a faculdade e logo será uma “igual”. Não há muitas esperanças na história das continuadas traições do Dr. Langham tampouco. Se muito, o que ele faz é validar o ponto de Margaret, mas não é que é justamente ela que faz a separação entre os dois conceitos do título, “Love and Marriage”? Ela vive no fato de que, embora a sociedade da época as coloque inseparavelmente juntas, o primeiro pode existir sem desejo, sem atração. O segundo, não.

Observações adicionais:

- Liz Caplan e Michael Sheen estão em seu melhor quando juntos. O jogo de malícias, intimidades e a disputa de poder entre os personagens não é só excitante, como complexo e instintivo para o espectador. Uma experiência de storytelling fascinante.

- No entanto, há alguma preocupação quanto a personagem de Virginia a esse ponto da temporada, no sentido em que muita gente vem observando que ela é construída mais como uma ideia (ou seria um ideal?) do que como um ser humano de verdade. Todas as suas storylines e características existem para apoiar o fato de que ela é a incorporação da modernidade e da libertação feminina

- A exceção, no entanto, talvez esteja na relação entre Virginia e DePaul, que está chegando ao ponto de uma storyline em que a primeira aprende da segunda o fato de que, assim como os homens, as mulheres precisam se esforçar para chegar a algo. Essa é uma boa perspectiva para a personagem, e Julianne Nicholson está fazendo um ótimo trabalho como a Dr. DePaul.

**** (4/5)

MASTERS OF SEX (SEASON 1)

Próximo Masters of Sex: 01x09 – Involuntary (24/11)

Caio

Colbie Caillat e o novo single “Hold On” podem surpreender muita gente

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por Caio Coletti

Depois de surpreender sutilmente com algumas faixas bem diferentes no All of You, de 2011, Colbie Caillat parece estar pronta para navegar novos estilos. Pelo menos é a direção que aponta “Hold On”, o novo single produzido por Ryan Tedder (não por acaso, também autor de “Higher Than The Sun” da moça), lançado hoje (18) um dia antes de sair no iTunes americano.

O quarto álbum de estúdio da carreira de Colbie  – sem contar o especial de Natal lançado no ano passado – ainda não tem data de estreia, nome, nem capa, mas a julgar por “Hold On”, pode ter alguns tons eletrônicos e R&B em meio a doçura acústica que todos nós amamos. Ansioso, já? Ouve o single aí embaixo:

17 de nov. de 2013

Christina Perri está de volta, e ainda é uma linda, com o single “Human”

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por Caio Coletti

Talvez a estrela do Youtube que chegou mais longe na carreira de gravadora – são dois singles no top 50 da Billboard, e mais 1 millhão e meio de unidades vendidas do álbum de estreia –, Christina Perri está pronta para o próximo passo. Ainda sem data, nem nome, nem capa anunciados, o segundo álbum da cantora abre trabalhos com o lançamento do single “Human” hoje (18) no iTunes.

No Youtube a canção chegou ontem, mostrando que a moça não perdeu a mão para as baladas românticas melancólicas, mas que os produtores resolveram adicionar uma camada de produção épica para fazer a diferença nesse novo álbum. Com pacotes de cordas e um refrão que leva a lindíssima voz de Perri às alturas, a canção já é uma preferida fácil.

Review: Katy Perry amadurece e experimenta no ótimo “Prism”

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Uma das coisas que eu sempre digo sobre Katy Perry – e sou acompanhado nisso por alguns artistas do meio, vide o depoimento de Adele no Katy Perry: Part of Me – tem a ver com a cantora americana ser uma das mais talentosas contadoras de história da música pop hoje em dia. Isso fica mais evidente em baladas confessionais e inspiracionais, normalmente quando a moça resolve desacelerar o passo de estrela pop conquistando o mundo para, muitas vezes à violão-e-voz, se comunicar com o seu público de maneira mais direta. Nesses momentos, ouvir Perry é como sentar-se para assistir Forrest Gump; a “caixa de chocolates” é aberta, degustada e saboreada por cada um de nós através dos versos e das inflexões de voz da cantora, uma vocalista muito melhor do que lhe é dado crédito.

Prism, quarto álbum de Katy (contando o lançado sob o nome de batismo, Katy Hudson, em 2001), me abriu os olhos para uma nova faceta desse talento. Como contadora de histórias exímia, talvez a garota que “beijou uma moça e gostou disso” esteja nos conduzindo por uma jornada pessoal muito mais ampla com a sua carreira do que podemos imaginar. Aí entra um pouco de evolução natural, um pouco de respeito ao próprio amadurecimento, e um pouco de esperteza marketeira, é claro, mas é evidente o “arco narrativo” que existe se encadearmos, por exemplo, o Teenage Dream a esse novo disco. A Katy daqui, já tendo o mundo em suas mãos, nos prepara para o próximo passo, e essa é uma jornada excitante de se acompanhar.

Com a batida e o piano sincopado de “Brave”, da amiga Sara Bareilles, Perry cria “Roar”, sua primeira balada inspiracional verdadeiramente voltada para o público do piano-rock alternativo, e ensaia se tornar uma mistura pra lá de interessante desse estilo com o poderio pop fornecido por produtores como Dr. Luke e Cirkut, aqui misturando um sintetizador grave e insinuante com timbres de guitarra de arena, no refrão. Nos vocais, Katy mostra que aprendeu a duras penas os limites de sua voz, e o resultado é uma performance ao mesmo tempo sonoramente impressionante e perfeitamente manejável em uma apresentação ao vivo.

Uma Katy de calculado e bem interpretado monotom toma conta dos vocais em “This Is How We Do”, composta na medida para se tornar o grande hit do verão americano, mas adicionando toques de requinte que só Perry e o produtor Klas Ahlund poderiam inserir tão sutilmente. A grande jogada é a cantora se colocar como parte distanciada daquilo que narra: apesar do “we” do refrão, a Katy de “This Is How We Do” soa muito mais como uma hostess perfeitamente blasé e, ao mesmo tempo, mais do que pronta para celebrar a vida gloriosamente ridícula dessas wild kids ao seu redor. É a abordagem perfeita para a Katy amadurecida do Prism, que não abre mão de ser divertida.

A outra colaboração de Perry e Ahlund é igualmente geniosa: com os sintetizadores claramente inspirados pelo dream pop alternativo (o momento em que isso fica mais claro é nas primeiras incidências do refrão, em quedas de tom) e a batida deep house noventista finalmente recolocada ao lado dos toques de soul que a completam, “Walking On Air” não é só um potencial hit, como uma das mais visionárias e interessantes incursões pop de Perry. Aqui, ela mostra que não só é uma boa observadora das tendências, como também tem algo para ensinar a elas: deve ter ouvido os teclados de Calvin Harris e pensado que faltava um toquezinho de CeCe Penniston naquilo tudo. Acertou na mosca.

Abrindo com um riff de toques orientais que acompanha quase toda a música, “Legendary Lovers” prenuncia o surgimento da melodia mais forte do Prism, com seu refrão poderoso que sintetiza os clichês espiritualistas que Perry habilidosamente mistura com sua alegoria amorosa/sexual – menos atrevida e mais sofisticada nesse novo álbum: “Take me down to the river/ Underneath the blood orange Sun/ Say my name like a scripture/ Keep my heart beating like a drum”. Além de grudenta, a faixa é climática e ganha pontos ao usar bem as referências eletrônicas num contexto mais estranho à música pop, especialmente a de Katy.

“Birthday” é como o delicioso elo perdido entre Prince do começo dos anos 70 e Mariah do começo dos 90. Tem a malícia, o baixo funkeado e os falsetes do primeiro, misturados com a batida francamente pop, as seções de sopro e as extravagâncias vocais da segunda, com dois “Happy Birthday” à moda Marilyn Monroe jogados no meio dessa salada. “Dark Horse” é uma mistura das mais bem engendradas do Prism, dos versos insinuantes que seguem com o tema espiritual do álbum (“Make me your Aphrodite/ Make me your one and only”) ao refrão abertamente pop, com notas altas que Perry alcança sem dificuldades, e à pincelada final de trap music nas bridges.

Do bloco oitentista chegam “Ghost” e “Love Me”. A primeira é uma balada amarga como toda e qualquer break-up song precisa ser, com Katy remanescendo a mensagem de texto com a qual Russell Brand rompeu o casamento de pouco mais de um ano com a cantora, lamentando que não tenha visto esse lado “cruel” dele desde o início, e clamando que agora ele não passa de um “fantasma” de seu passado. O golpe de misericórdia: “I see through you now”. A segunda é quase uma súplica de Perry para si mesma. Começa com um lamento (“I lost myself in fear of losing you”), e passa por uma afirmação de cabeça erguida (“Now, I don’t negotiate with insecurities”), mas em última instância é a tentativa desesperada de frear um impulso de sacrifício de si pelo outro. O sabor não é amargo porque Perry recorre ao clichê do “amar a si mesmo para que alguém te ame”, que não deixa de ser extremamente verdadeiro, especialmente quando vem adoçado pela produção de Bloodshy, um dos maiores arquitetos da música pop texturizada eletronicamente no século XXI.

Os únicos tropeços do álbum são “International Smile”, que sofre de falta de personalidade frente as outras faixas, e se encaixaria muito melhor no Teenage Dream, e “This Moment”, uma tentativa nada produtiva de colar as harmonias do hit “Dancing On My Own”, de Robyn, em uma balada inspiracional baseada em princípios de auto-ajuda. Por outro lado, não é a toa que “Unconditionally” é a preferida pessoal de Perry no álbum: além de ecoar as melhores baladas de sua própria carreira, tão bem representadas por outros singles como “Thinking of You” e “The One That Got Away”, a canção mostra que ainda vive uma vocalista cheia de particularidades e floreios dentro da moça que estoura os pulmões quase diariamente para cantar “Firework”. Com requintes de Alanis Morrisette – uma inspiração que Perry nunca negou – a cantora enriquece a já belíssima letra: “All your insecurities/ All the dirty laundry/ Never made me blink one time”.

“By The Grace of God” fecha o Prism em missão parecida com a de “Roar” ao abri-lo: trazer, ainda que através de filtros pop, a voz de Katy para um gênero e uma expressão diferentes, próxima do adulto alternativo e do piano pop. Não a toa, nas duas faixas o instrumento é bem proeminente, ainda que “By The Grace of God” tenha subtons temáticos bem diferentes, se estruturando como inspiracional de uma maneira diversa. Mais franca e aberta sobre a separação pela qual passou, Perry escreve sobre depressão e até contemplação de suicídio, e não é nenhum pecado fazê-lo sob o filtro de R&B clássico que Greg Wells coloca na canção. Essa polivalência ainda estrutura Perry como uma artista pop. E não é que o Teenage Dream não o tenha feito, mas por mais bem que aquele álbum tenha trazido à Katy que é a maior estrela de todas as rádios Top 40 do mundo todo, Prism faz muito mais pela artista que vive dentro dela.

***** (4,5/5)

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Prism
Lançamento: 18 de Outubro de 2013
Produção: Katy Perry, Dr. Luke, Max Martin, Klas Ahlund, Benny Blanco, Bloodshy, Cirkut, Greg Kurstin, Greg Wells, StarGate
Duração: 48m39s

Caio

16 de nov. de 2013

Review: American Horror Story Coven, Ep. 6 – The Axeman Cometh

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ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

Em certo ponto de “The Axeman Cometh”, frente a frente com uma Madison ressucitada (long story), Nan pergunta: “Did you see a bright light?”. Os veteranos de American Horror Story devem ter até soltado um risinho cínico com a pergunta da personagem, posta ali exclusivamente, é claro, para que a série pudesse nos encarar francamente e posicionar mais uma vez sua filosofia: o mundo é um lugar escuro, assombrado por todos os tipos de horrores que a natureza humana pode trazer consigo, e é quase inacreditável o quanto nos agarramos uns nos outros (e na nossa própria existencia, nessa realidade maleável e abstrata que temos em mãos), ao ponto que o misericordioso beijo da morte soe ainda como uma sentença. Nessa sexta entrada de Coven, a série recupera a identidade e mostra o que a história das bruxas de New Orleans veio para acrescentar a ela.

Depois voltamos a todo o affair em torno de Madison, porque vale começar a discussão comentando sobre a pungente e desoladora cena de Fiona no hospital, iniciando seu tratamento de quimioterapia. Não só Jessica Lange continua fabulosa no papel, e a cada semana mais conforme conhecemos sua personagem, mas o roteiro de Douglas Petrie – estreante na série – se presta a realizar um retrato honesto das últimas esperanças e arrependimentos que cada um dos companheiros de sala de Fiona guardam em pensamento. É uma passagem emocionante como a da semana passada, que reforçou o lado maternal da personagem da maneira abstrata e sombria típica de AHS, e é um daqueles momentos de narrativa em que a premissa e a elaboração da série chegam ao seu ápice de ressonância, passeando por um horror melancólico e humano que é criminosamente raro hoje em dia.

Manter o roteirista Petrie por perto, aliás, não seria má ideia. Além desse b-plot brilhante, o moço faz o trabalho de juntar duas storylines que estavam com pontas soltas e encaminhá-las para outras direções, tudo enquanto conta uma história razoavelmente isolada com o episódio. “The Axeman Cometh” tira seu título de um assassino que conhecemos na New Orleans de 1919, um Danny Huston genericamente creepy (embora fazendo uso glorioso da voz rouca) que aterrorizou a cidade ao matar moças com um machado, enquanto linkava os assassinatos com o jazz que bombava nos bares da época. A grande novidade é que o flashback de início mostra-se mais contundente do que os da primeira temporada da série jamais conseguiram ser, quando descobrimos que o espírito do psicopata ainda assombra a casa das bruxas, e Zoe é obrigada a trazê-lo para o plano dos vivos em troca de saber onde está Madison.

Encontrado o corpo da estrela de cinema/futura Suprema (ou não!), é hora de chamar Misty para revivê-la, uma vez que seu trabalho com Kyle e Myrtle foi tão prestativo – mentira, a série explica que a moça tem mesmo o “dom da ressurgência”, ou algo do tipo. Na verdade, aceitamos praticamente qualquer desculpa minimamente plausível para ter Lily Rabe por perto por mais tempo, porque a atriz está se divertindo com o papel como não fez nem mesmo na temporada anterior com a Irmã Mary Eunice. Convenientemente, quando Zoe vai procurá-la um desvairado Kyle já está de banho tomado e dando um ataque psicótico (“Get him out of here. He broke Stevie!”). A personagem de Taissa Farmiga leva esse Frankenstein traumatizado para a casa das bruxas, em mais um desenvolvimento pouco útil em uma história que tem sido basicamente um beco sem saída.

Falando em Farmiga, “The Axeman Cometh” também segue a deixa do episódio anterior e começa a apresentar Zoe como uma personagem mais proativa. A atriz agradece a oportunidade de fazer algo além de reagir aos outros atores em cena, e já ensaia uma performance conquistadora para quem estava reclamando da decisão de colocar a personagem como a provável próxima Suprema (ou não!). Quem também adiciona sabor a sua performance é Gabourey Sidibe, que tempera com um sadismo debochado sua Queenie, aos poucos se desenvolvendo como uma favorita fácil entre as bruxas adolescentes da série. Ela é também parte de uma tendência de Coven em mostrar as mulheres negras como as que vêem mais claramente o que está realmente acontecendo ao seu redor. Enquanto a conversa de “extinção das bruxas” de Zoe e Fiona é vaga, as advertências de Queenie são imediatas e concretas, assim como as de Leveau.

Essa é a nossa visão do ressurgimento da discussão em torno de ser “um tempo perigoso para as bruxas” nesse episódio, aliás: American Horror Story está querendo nos mostrar que na nossa visão megalômana de nós mesmos e daquilo que nos cerca, na nossa psique torta  de que nossa vida é mais importante do que as circunstâncias ao redor dela, não somos só as vítimas desse mundo cruel que a série sempre retratou. Em igual medida, conforme nos envolvemos em conflitos uns com os outros e nos deixamos levar por pretextos falsos para justificá-los, somos nossos próprios Anjos da Morte.

Observações adicionais:

- A direção de Michael Uppendahl, já veterano na série, é mais contida das estilizações do que a de alguns de seus companheiros, mas a cena inicial do flashback ganha tratamento diferenciado. Os takes baseados em sombras e o tratamento de um gore “artistizado” através do exagero mecânico são toques bem delicados e bacanas.

- Não deu tempo de falar, mas Sara Paulson está fucking amazing na pele da Cordelia cega. A capacidade que a atriz tem de filtrar pela loucura da premissa de AHS e construir tão meticulosamente uma personagem de detalhes e fundação forte é formidável.

- Also, a revelação de que o marido de Cordelia era um caçador de bruxas contratato por Leveau coloca a “divisão de lados” em perspetiva para Coven. Não foi Fiona que começou a guerra, então? Era preciso que se equilibrasse essa equação.

***** (4,5/5)

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Próximo American Horror Story Coven:
Ep. 7 – The Dead

Caio

Rihanna rasteja para dentro de uma mente perturbada no clipe de “What Now”

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por Caio Coletti

A identidade visual de Rihanna é tão fluida e versátil que há poucas coisas que a moça não tenha feito e feito bem nesses 8 anos de carreira. O vídeo anterior do Unapologetic, “Pour it Up”, cruzou uma das poucas linhas que faltavam, colocando a moça num contexto do kitsch contemporâneo. “What Now”, por outro lado, é mais familiar: seja em “Roussian Roulette” ou “Dirturbia”, Rihanna já navegou as águas da representação visual de uma mente perturbada.

Não deixa de ser adequado, é claro, para a pungente balada atormentada que é a faixa. Uma das canções mais marcantes do Unapologetic ganhou tratamento visual clean e clima baseado na própria performance de Rihanna em câmera, com movimentos quebrados e expressões assombrosas.