19 de jul. de 2013

Review: O noir feminista e a boa narrativa de “Top of The Lake”

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Exibida em 7 episódios entre Março e Abril desse ano pelo Sundance Channel nos EUA (pela BBC Two na Inglaterra, e pela UKTV na Austrália), Top of The Lake não pode e não deve ser visto como um drama serializado. Sua estrutura em nada tem a ver com a de títulos como Breaking Bad, The Following e The Killing, entre tantos outros. Ao invés de tentar contar uma história e construir um universo através de peças temáticas de uma hora, a minissérie de Jane Campion prefere estruturar sua narrativa como cinematográfica, instituindo conflitos e revelações crescentes até os momentos finais, culminando em um clímax único ao invés de um por semana. É, portanto, um longo filme, contando em por volta de 350 minutos uma história que, para aqueles personagens, tem um início, um meio, e um final.

Chamado de “noir feminista” por alguns representantes da crítica, Top of The Lake tem como protagonista a detetive Robin Griffin (Elizabeth Moss, de Mad Men), que retorna a sua cidade natal para cuidar da mãe com câncer, Jude (Robyn Nevin), mas se vê às voltas com um caso pessoal demais para ser ignorado: a tentativa de suicídio e consequente desaparecimento da garota Tui (Jacqueline Joe), de 12 anos. O detalhe importante é que a menina estava grávida quando sumiu. As suspeitas caem sobre o pai de Tui, o chefão do crime local Matt Mitcham (Peter Mullan), cujos hábitos vis e histórico nada limpo fazem dele o nêmesis de Robin. Mas Top of The Lake é bem mais simbólico que isso, e a oposição entre a “heróina” e o “vilão” é apenas a setpiece central de uma obra maior com a intenção de retratar a opressão feminina e a sociedade patriarcal da cidade fictícia.

Criadora e roteirista em todos os episódios, Jane Campion é conhecida por filmes como O Piano e Retrato de uma Mulher, e é impossível negar que a ênfase no tema e na divisão de sexos é um tanto excessiva, mas a neozelandesa gosta de sublinhar a tintas fortes suas teses, e Top of The Lake tira momentos impressionantes dessa tendência. O enterro de um personagem no episódio 6, embalado por uma linda versão de “Joga”, da islandesa Bjork; a silenciosa confissão de Robin quanto a um trauma de seu passado no episódio 4; as explosões de violência que revelam o âmago desses personagens quebrados e sombrios, espalhadas por toda a série. Campion sabe que pegar pesado só funciona se nos importamos com os personagens em tela, e por isso os faz tão ambíguos e complexos, finalizando com uma direção que parece incluir e isolar ao mesmo tempo, aludindo a ilusão de pertença a uma comunidade da protagonista.

O elenco ganha uma nota a parte, como esperado: com sete longas horas para construirem seus personagens, eles fazem um trabalho uniformemente brilhante. Moss, para quem não acompanha Mad Men, é uma revelação com sua presença insinuante, seus olhos inquisitivos e sua habilidade ímpar de desconstruir a personagem sem que a exposição de seus sentimentos ao espectador soe pouco natural. Peter Mullen é uma presença magistralmente forte na pele de Mitcham, e não é pouco o que o roteiro de Campion exige dele, passeando por gamas de emoções e reações muitas vezes indecifráveis. Robyn Nevin faz as vezes de sabedoria da narrativa enquanto está em tela, é presenteada com algumas das melhores linhas de diálogo dos episódios iniciais, e consegue transmitir afeição e resiliência em um só olhar. Por fim, Holly Hunter brilha como uma espécie de guru contemporânea de uma comunidade de mulheres que se muda para uma parte da propriedade da família Mitcham, emprestando olhos duros como aço e linguagem corporal absolutamente particular a personagem.

Top of The Lake poderia ser apenas uma alegoria óbvia (embora maravilhosamente executada), mas Campion mostra que conhece os fundamentos do storytelling e faz sua minissérie brilhar como, antes de mais nada, um drama de personagens marcantes. É na vontade de ser o básico primeiro, e o complexo depois, que ela ganha o jogo.

**** (4/5)

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Top of The Lake está indicada a 8 Emmys, incluindo:
- Melhor Elenco para Minissérie, Filme ou Especial de TV
- Melhor Direção para Minissérie, Filme ou Especial Dramático (Jane Campion)
- Melhor Ator Coadjuvante em Minissérie ou Filme (Peter Mullan)
- Melhor Atriz em Minissérie ou Filme (Elizabeth Moss)
- Melhor Minissérie ou Filme
- Melhor Roteiro para Minissérie, Filme ou Especial Dramático (Jane Campion)

Caio

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