30 de jul. de 2013

Review: A disputa de poder nos sets de Hitchcock em “The Girl”

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Não é a toa que as obras de ficção brinquem tanto com aquele estereótipo do gênio atormentado: graças as muitas biografias de artistas e criadores de todas as épocas, sabemos que as mentes mais brilhantes são aquelas capazes de conceber a si mesmas como matéria-prima e, ao mesmo tempo, resultado da arte. Em The Girl, Alfred Hitchcock não é retratado diferente, como um mestre da narrativa e da linguagem cinematográfica que usa as obsessões e distúrbios de sua vida particular para moldar a fixação presente em seus filmes. O fato de que este fiilme da HBO e também o Hitchcock com Anthony Hopkins se concentram numa fase mais avançada de sua vida e carreira prova que a intenção era mostrar o diretor durante a realização de seus filmes mais simbólicos, alegóricos e metafóricos.

O ponto de estudo aqui é o período entre 1962 e 1964 em que a protegée do mestre era a modelo-tornada-atriz Tippi Hedren. Órfão de uma ingenue loira para chamar de sua depois da precoce aposentadoria de Grace Kelly, Hitch descobriu a moça em um comercial de TV e a chamou para estrelar Os Pássaros, que viria a ser um dos títulos mais reconhecidos da sua filmografia. Além deste, o diretor e a musa fizeram juntos Marnie, um preferido dos fãs, cujas filmagens foram turbulentas graças ao relacionamento cada vez mais abusivo entre os dois. É dito, e endossado por The Girl, que Hitch teria se apaixonado por Tippi, e que os métodos sádicos com os quais a dirigia eram uma retaliação a rejeição dela a suas investidas.

É na quieta relação de poder entre os dois protagonistas que The Girl tem seu às na manga, e o diretor Julian Jarrold (Kinky Boots) precisa ser louvado por tirar o melhor dos momentos mais tensos desse relacionamento, mesmo em detrimento de algumas cenas que poderiam se beneficiar de uma abordagem mais sutil. Há momentos de pura fascinação em nesses pouco menos de 90 minutos, e eles acontecem quando a dinâmica atriz-diretor é posta a prova e conflitada com aquela entre apaixonado e musa relutante. No roteiro de Gwyneth Hughes, veterano da televisão que encontra alguns problemas quando tenta construir a progressão de uma narrativa cinematográfica, Hitchcock deseja Tippi justamente porque ela não o deseja de volta, e a objetifica porque ela se recusa a ser objetificada.

O filme confia muito em Toby Jones para nos vender um Hitchcock amargurado e em certos momentos odiável, e sua performance é poderosa no sentido que prende o personagem em uma jaula de auto-paródia e deixa a verdadeira tristeza por baixo dela brilhar apenas e somente através dos olhos. Além da maquiagem pesada, é claro, Jones tem a grandeza de reconhecer que Hitch era um cineasta tanto quanto era um ator interpretando a si mesmo. O equilíbrio para acertar essa definição é delicado, mas Jones é mais que qualificado para tal. Sienna Miller, por sua vez, é permitida pintar um quadro bem mais amplo de Tippi Hedren, e aproveita a liberdade para criar um retrato fiel e tocante de uma personagem que o script pinta como heróica.

Se você espera que The Girl pinte uma linha clara entre o que aconteceu e não aconteceu na turbulenta relação entre Hitch e Hedren, é melhor ajustar suas expectativas: a missão do filme de Julian Jarrold é muito mais borrar os limites entre realidade e ficção do que esclarecê-los.

**** (3,5/5)

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The Girl está indicado há 6 Emmys, incluindo:
- Melhor Trilha Sonora para Minissérie, Filme ou Especial (Philip Miller)
- Melhor Fotografia para Minssérie ou Filme (John Pardue)
- Melhor Direção para Minissérie, Filme ou Especial Dramático (Julian Jarrold)
- Melhor Ator em Minissérie ou Filme (Toby Jones)
- Melhor Atriz em Minissérie ou Filme (Imelda Staunton)

Caio

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