por Marcelo Antunes
(Diz Que Fui Por Aí...)
Não consigo me recordar, exatamente, do primeiro filme que assisti no cinema, talvez porque sempre fui ao cinema. Desde que me entendo por gente, me recordo dos meus velhos nos levando - meus irmãos e eu - à sala escura, por isso não houve tempo de se criar expectativa. Quando a maioria dos meus amiguinhos de escola ou da rua festejavam sua primeira ida, conferir um filme na telona, para nós, lá em casa, já não era novidade. Assim foi com a maioria dos filmes d'Os Trapalhões - que lançavam suas aventuras duas vezes ao ano, em janeiro e julho, época de férias -, Xuxa, um dos Superman - não me recordo exatamente qual -, Karatê Kid, entre outros. Guardo com riqueza de detalhes cada uma dessas sessões, os lanches que fazíamos depois, as balas de hortelã chupadas durante o filme.
Dia desses, meus pais conversavam sobre o número de salas em nossa cidade. Era praticamente uma por bairro. Isso nos anos 60 e 70, quando ir ao cinema era a maior diversão. Tempos distantes esses, onde os ingressos não eram uma facada e todo mundo podia assistir três, quatro filmes no fim de semana.
Nem sou tão velho assim - tá, só um pouquinho - mas ainda peguei a era pré-salas de shopping. Havia de tudo. Cinema que passava filme pornô de noite e de dia era local de culto evangélico. Cinema de arte com seu aparelho de ar condicionado ferrado e os estofados fedendo a mofo. E até uma pequena jóia do art-decó.
Em Niterói, minha cidade natal, perdemos, recentemente, duas salas guerreiras, que ainda não tinham sucumbido à especulação religiosa nem aos Kinoplex e Cinemarks da vida. Uma era o Cine Arte Uff, mantido pela Universidade Federal Fluminense. Em prédio anexo ao que, no passado, foi um cassino - Cassino Icharay - e que nos dias atuais abriga a Reitoria da Universidade, fechou a porta para reformas e nunca mais abriu. Segundo representantes da Universidade, durante a obra, foi verificado que o prédio não tinha estrutura para uma reforma do tipo, tendo que ir literalmente abaixo. Fundado em 1968, a sala ficou conhecida como espaço de exibição de filmes "alternativos" a preços diferenciados. Fui à muitas sessões de segunda-feira, onde o ingresso custava apenas dois reais. Isso sem falar das restropectivas anuais. Minha mãe diz que viu "Acossado" lá. Eu mesmo vi um Festival Bergman, maravilhoso. Se não me falha a memória, um dos últimos filmes que conferi na sala foi "Diários de Motocicleta". A outra perda chamava-se Cine Icaraí, uma das mais charmosas do país. Localizado numa praça onde, desde 1907 funcionava o Cinematographo Icarahy que, mais tarde, deu lugar ao Cinema Icaraí - que estreou em 1916, com os filmes “O crime da meia noite” e “Uma causa célebre" -, teve o atual prédio construído na década de 30. Tombado em 2001 e, lamentavalmente, destombado em 2005, o cinema hoje abriga famílias de sem-tetos e viciados em drogas. Final trágico para um história que tinha tudo para acabar feliz. Foi ali que vi a Trilogia de O Senhor dos Anéis, por exemplo.
Para quem conhece Niterói, sabe que os dois cinemas que citei são vizinhos. Ficam praticamente lado a lado, na beira da praia, constituindo um importante conjunto arquitetônico. Mas para quem curte cinema, o mais importante era tê-los funcionando a pleno vapor. Na internet correm manifestos pela volta das duas salas. Se você é fã de cinema, mesmo não morando na cidade, dá uma força aí. Maiores informações: Pelo Cine Icaraí e Centro de Artes da UFF. A Sétima Arte agradece. E os amantes dela mais ainda.
Marcelo Antunes escreve todo dia 03.
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