21 de jan. de 2013

Review: Cloud Atlas e a ligação cósmica entre passado, presente e futuro

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por Andreas Lieber
(Tumblr)

O que um manuscrito escrito durante o século XIX em uma viagem no porão de um navio de volta a California tem a ver com um compositor clássico que tenta fugir do passado e criar sua obra prima enquanto troca cartas com seu amante, influenciando uma jornalista nos anos 70 a derrubar uma grande usina nuclear? De longe, nada; de perto, todo um universo. E o que acontece quando enquanto isso, em outros tempos, uma revolução está prestes a nascer nos porões da distópica e futurística Neo-Seoul e levará o mundo para um futuro ainda mais distante e apocalíptico? Em Cloud Atlas (no Brasil com o infeliz título de A Viagem), o mais recente projeto cinematográfico dos irmãos Wachowski (Matrix) em parceria com Tom Tykwer (Run Lola Run), aprendemos que nossas vidas não são apenas nossas e todas as ações que tomamos, por mais infímas que sejam, afetam o tempo, o espaço e o destino de todos.

Baseado no romance homônimo do inglês David Mitchell, a adaptação cinematográfica de Cloud Atlas tornou-se, instantaneamete, igualmente aclamada e odiada pela crítica. Acompanhando seis narrativas diferentes ao mesmo tempo e apresentando conexões entre elas que andam mais pelo campo da percepção do telespctador do que pelo concreto, Cloud Atlas é um filme que exige uma atenção brutalmente ferrenha para se tornar conexo em todos os níveis que apresenta. Para entendermos a narrativa agitada do filme, é preciso uma desconstrução primária da mesma e uma análise separada das personagens. Mas como fazer uma coisa dessas em uma história tão intrinsecamente ligada?

A história de Cloud Atlas inicia-se com a vigem do jovem Adam Ewing (Jim Sturgess), advogado americano que vai à uma ilha do Pacífico no século XIX fechar negócio em nome do sogro; lá, ele é testemunha do açoitamento de um dos nativos que, na volta, se infiltra no navio e acaba se tornando amigo de Ewing. Estando o jovem advogado contaminado por uma doença, ele é posto de quarentena no porão da embarcação, onde narra seus infortúneos por meio de escritos. Tais escritos se transfomaram em livro, que é lido ferozmente por Robert Frobisher (Ben Whishaw), compositor com um passado infame que tenta criar sua obra prima, The Atlas Cloud Sextet, ao morar com o renomado musicista Vyvyan Ayrs (Jim Broadbent) nos anos 30. Durante esse tempo, ele troca cartas com o amante, Rufus Sixmith (James D’arcy), que no futuro trabalha na construção de um reator nuclear comandada por Lloyd Hooks (Hugh Grant). Por um acaso do destino (ou não?), Sixmisth encontra a jornalista Luisa Rey (Halle Berry), que começa a investigar anomalias no funcionamento do reator e se encontra fascinada pelas cartas trocadas entre Frobisher e Sixsmith.

Em outro tempo, mais precisamente o ano de 2012, o editor de livros Timothy Cavendish (Jim Broadbent de novo!) é internado em uma clínica de repouso por seu irmão após mais uma de suas confusões. Lá, ele sofre as ações da tirana enfermeira Noakes (que eu não vou contar de quem é a personagem pra não quebrar o encanto, ahem) e narra sua permanência por lá e seu plano de fuga com alguns colegas também residentes. Tal narração, entende-se, virou um filme, que é visto em Neo-Seoul no ano de 2144 por Sonmi-451 (Doona Bae), uma garçonete clone criada especificamente para essa função.

Encontrando-se no meio de uma conspiração para a derrocada do atual governo, que domina um futuro distópico, Sonmi foge com Hae-Joo Chang (oi pra um Jim Sturgess meio japonês) e vira símbolo da Queda, uma revolução que dizimou grande parte da população. Em um futuro mais distante ainda, um ano 2321 com características apocalípticas, Sonmi virou uma deusa, representada na figura terrena de Abess (Susan Sarandon) para o povo da sociedade conhecida por The Valley, onde desembarca Meronym (Halle Berry novamente), uma Prescient – uma pequena parcela da populão que se agarrou à tecnologia dos antigos – que procura ajuda em Zachry (Tom Hanks) para chegar ao topo de uma montanha onde se encontra o Cloud Atlas, um sistema de comunicação para com as pessoas que abandonaram a Terra e agora vivem em outros planetas.

Sonmi-451 cita no filme que: “Our lives are not our own, we are bound to others, past and present. And by each crime and every kindness, we birth our future.”. Cloud Atlas é um filme que nos mostra a efemeridade das escolhas, dos atos corriqueiros e palavras que proferimos. Nos faz perguntar como seria nossas vidas na pele de outras pessoas, vivendo um outro tempo. Com um desenvolvimento sagaz e inteligente, cada cena dura exatamente o tempo certo para se desenvolver mas conter o clímax, nos deixando na ponta dos assentos com o cérebro fumengando ao trabalhar em ligações complexas. Para cada ação, há uma reação; para cada ato; há uma consequência; e para cada decisão que tomamos, uma teia enorme interliga o nosso passado ao presente e cria um futuro imediato.

Cloud Atlas está fadado a se tornar um clássico. Não pela direção (que é fantástica), a trilha sonora (que é incrível) ou ainda a maquiagem e fotografia (que são apenas… superlativas), não, ele se tornará um clássico por nos mostrar que o poder para uma revolução está em nós, em cada um de nós, que o amor não se limita à idade, sexo, raça ou condição social. Ele nos ensina que a ligação cósmica entre passado, presente e futuro está contida nas nossas decisões, nas nossas memórias, pensamentos e ações. Que nós, todos nós, somos o tempo.

****(4,5/5)


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Halle Berry como Meronym, Jocasta Ayrs e Luisa Rey (da esquerda para a direita)  e Tom Hanks como Isaac Sachs, Dermot Hoggins e Zachry (da esquerda para a direita)

1 comentários:

Cainã Monteiro disse...

Muito bom, mas faltou você estabelecer o paralelo entre a historia do reator (da dec. de 70) com a de 2012. Existe uma lacuna aí.