Curta Person of Interest Oficial Brasil no Facebook
ATENÇÃO: esse review contem spoilers!
Existe uma mágica indefinível na boa narrativa, mais especificamente a televisiva, que é a marca indelével das melhores séries no ar desde que The Sopranos inaugurou a era do drama serializado. Embora as propostas da série de David Chase tenham muitas vezes desde então sido levadas um pouco além das fronteiras definidas por ela, o conceito básico ainda funciona: numa base semanal, através de histórias episódicas razoavelmente isoladas, a verdadeira herdeira da tradição do drama serializado constrói pouco a pouco arcos narrativos maiores, para definir suas temporadas, e ainda mais amplos, para construir quase aritmeticamente os personagens. Não é missão para qualquer grupo de escritores desenvolver um ciclo satisfatório, sem perder o fio da meada, num espaço tão largo de tempo.
Existem razões bem sólidas para “Endgame”, oitava entrada da terceira temporada de Person of Interest (uma série, que, em seus melhores momentos, é uma dessas herdeiras legítimas, a sua maneira, da tradição Soprano), funcionar tão bem quanto funciona: primeiro, ela é centralmente a resolução de uma trama sugerida e trabalhada em pequenas doses semanais, em meio aos procedimentos mais corriqueiros de Person, desde a fase final da segunda temporada, lá em Abril, quando o Detetive Cal Beecher, amigo e interesse romântico de Carter, foi morto pelas mãos da HR. Desse ponto para frente, e mais solidamente durante essa primeira leva de episódios do terceiro ano, Person contruiu uma jornada sólida nessa caçada humana que a Detetive de Taraji Henson empreendeu contra o grupo de policiais corrputos.
Em segundo lugar, no entanto, “Endgame” é a culminação de uma jornada emocional intensa e angustiante, na qual Carter esteve metida desde o início da terceira temporada. Inclua aí o período de suspeita em relação a Laskey, a posterior virada de jogo, e na semana passada o assassinato do garoto por outro acólito da HR. Na arrepiante cena que fechou “The Perfect Mark”, Carter implorava que o tal capanga, já com um tiro alojado no peito e prestes a morrer, fosse um policial de verdade e entregasse o nome do líder da organização. Essa escalada moral e essa perseverança que observamos da personagem nos ajuda na parte do envolvimento com a trama, que tira das “bordas” essa storyline e coloca no centro do episódio.
A razão fundamental pela qual “Endgame” funciona tão bem, no entanto, é que o roteiro de Nic Van Zeebroeck e Michael Sopczynski (dupla que assinou “Booked Solid”, um divertido episódio do ano passado, e outras pérolas da série) estrutura essa história construída com toda a paciência no curso das últimas dez semanas no ar, contando o final da segunda temporada e o início dessa, como uma consequencia do arco ainda mais abrangente de Carter, definida para além de suas ações. As melhores personagens para a televisão são aquelas que expõem suas fraquezas sem que nós percebamos, num processo gradual e orgânico a narrativa, e que atingem um momento de culminação em que é trazido a tona toda essa elaboração.
Por isso, quando percebemos que “Endgame” é uma inteligentíssima piece de resistance sobre a necessidade de conexão inter-pessoal no mundo contemporâneo, cruel e individualista que Person retrata (essa é uma faceta da temática da série que nunca havia se posto clara para mim, pelo menos), esse traço de martirização e isolamento parece tão natural em Carter. Em parte porque o enxergamos, mesmo que um pouco, em nós mesmos. E em parte porque ele sempre esteve lá, vivendo dentro das expressões e linguagens da interpretação de Taraji Henson. A boa série é, afinal, aquela que nos mostra o que já sabemos, mas não faziamos ideia o quanto.
Observações adicionais:
- Com uma elaboração temática tão grande, muita coisa ficou de fora do corpo do review, então vamos lá: primeiro, é admirável o quanto Person é firme na sua decisão de trazer resoluções para suas histórias, ao invés de tentar deixar as coisas interessantes enquanto os pratos continuam girando no ar. É um testamento a criatividade dos roteiristas que eles ainda encontrem maneiras originais de lidar com esses personagens e essa situação.
- Num momento no início do episódio, a série coloca Reese e Fusco conversando fora da tela, numa daquelas intervenções de “vigilância auditiva” da máquina que é normalmente reservada para os vilões do episódio, e geralmente na primeira cena. É mais um sinal de que Person quer afirmar de todas as formas que, nessa temporada, nossos “mocinhos” são tão fantoches da tecnologia que “domam” quanto qualquer outro de nós.
- Uma observação um pouco fútil, mas muito oportuna: finalmente encontraram um terno que sirva bem para Jim Caviezel! Nos últimos episódios vinha sendo extremamente irritante ver o ator com peças grandes demais para ele, o que por conseguinte o fazia parecer bem menos ameaçador e mais mirrado.
- O elenco está pegando fogo essa semana: os destaques são para Kevin Chapman, que ganha uma cena realmente comovente entre Fusco e Carter; Enrico Colantoni, que em duas cenas na pele de Elias mastiga mais cenário do que a dieta semanal de Jessica Lange em American Horror Story; e, É CLARO, Taraji Henson, numa atuação perfeita em absolutamente todos os sentidos, equilibrada na dosagem emocional, de quebrar o coração e provocar admiração pela personagem e por ela.
- “Your social circle isn’t terribly wide”
***** (5/5) – 5,5/5, se isso fosse possível
Próximo Person of Interest: 03x09 (19/11)
0 comentários:
Postar um comentário