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ATENÇÃO: esse review contem spoilers!
Todas as melhores séries de todos os tempos tem alguns denominadores comuns que as fazem tão boas, e um desses pontos similares é, sem dúvida nenhuma, a moral sempre avessa a definições fechadas. Está na própria concepção da narrativa televisiva episódica que o tempo todo a trama precisa ser um processo em construção, do primeiro minuto do piloto ao último do series finale (um luxo que poucas séries tem, infelizmente, é a possibilidade de “fechar” a narrativa da forma como se pretendia ou se desejava). Não é diferente para o aspecto moral da série, é claro, especialmente para aquelas nas quais essa questão em particular é tão central quanto é em Person of Interest.
Isso tudo para explicar que a completa indefinição e ambiguidade moral que pudemos perceber no episódio dessa semana nada mais é do que um dos sinais que, aos poucos, e especialmente pela mão firme do criador Jonathan Nolan (que aqui também assina o roteiro do epiósido), Person está se tornando uma daquelas séries que, daqui a anos e anos, vão ser lembradas como exemplo do que todas as outras podem ser se fizerem tudo certo. “The Devil’s Share” é o melhor episódio da temporada até o momento, e fica bem no alto se formos fazer um ranking dos melhores desses três anos de série, e o é simplesmente porque, ao mesmo tempo que conhece seus personagens e o coração da discussão que a trama em que eles estão envolvidos levanta, não quer deixá-los definidos demais a ponto de não nos dizer nada de novo. Esse é bem o ponto com Person, aliás. Mesmo três temporadas adentro, a série ainda consegue ser essencialmente nova.
Nessa semana, acompanhamos nosso quarteto de protagonistas (mais Root, menos Carter – RIP) lidando com as consequencias da morte de sua parceira, no final do episódio anterior. Nolan sabe articular o que cada um desses personagens vai sentir e como eles vão agir: o complexo de culpa de Finch é aumentado para o volume máximo, ou talvez seja mesmo o seu complexo de Deus que não admite que, sob a vigilância de sua máquina, uma policial limpa como Carter poderia ser morta; a “casca dura” de Shaw a impede de demonstrar sentimento no velório da amiga, e qualquer vestígio de luto se torna violência e combustível para fazer sua forma particular de justiça; Reese, que perdeu a âncora do que significava sua “nova vida”, volta aos antigos instintos e mais uma vez se parece com o homem que matou dezenas, talvez centenas, sob as ordens de quem quer que fosse o contrator da vez; e Fusco, bom, Fusco mostra que é o único que desenvolveu uma base moral forte o bastante para honrar a memória de Carter de verdade.
“The Devil’s Share” é em muitos sentidos um episódio sobre o que acontece com esses personagens quando eles perdem o chão, e mesmo com o seu final redentor, o retrato que Jonathan Nolan pinta não é tão bonito. E é muito um paralelo com o processo de luto que todos nós já passamos, também. A culpa, a raiva e a vontade de ser digno de se lembrar e agir de acordo com o que aquela pessoa queria. Esses personagens dão carne, osso e expressão a cada uma dessas “fases”, e estabelecem também, como fica claro no monólogo de Elias no final, que essa é uma trama sobre aqueles que vivem à margem da sociedade, e por isso precisam forjar seus próprios códigos morais. O problema é que qualquer que seja o que eles escolherem moldar, códigos morais tem a mania de trazer consequencias. Ou você é a vítima humana, ou você é o algoz desumano.
Elias está mais do que feliz em ser a segunda opção. Fusco, por outro lado, monta uma setpiece corajosa e extremamente comovente para advogar o lado da primeira. Seu monólogo ao derrotar Simmons em uma briga corpo a corpo acena para o fato de que Person não está pronta para dar crédito à justiça pelas próprias mãos, e ainda se amarra à jornada do personagem de maneira espetacular. “The Devil’s Share” abre com um take em close-up do monitor de um aparelho cardíaco, registrando os batimentos de Mr. Reese, e termina com a linha reta indicando o perecimento de Simmons perante o capanga de Elias. A diferenciação que Person faz entre o certo e o errado é tão primal quanto uma escolha simples entre a vida e a morte, mas a série faz um trabalho brilhante em mostrar que nem essa dicotomia fundamental é tão simples assim.
Observações adicionais:
- Não coube no review: Root é a personificação do clima de embate que existe entre Finch e a máquina na terceira temporada. A série está mantendo Root presa, assim como a força da máquina interferindo mais diretamente na trama e nas ações dos personagens. É uma força poderosa de narrativa que, por ser raramente liberada, fica ainda mais impressionante quando o é.
- Com Shaw, Person insiste na humanidade, mas vê a excitação de uma personagem que não mostra a sua. É uma casca que quase nunca se desfaz, mas traz reflexões muito interessantes ao fazê-lo. A personagem pertence a trama, e isso é raro e lindo.
- “Just when I think life with you people can’t get any weirder, one of you take it to the next level”
- A iluminação em todas as cenas é genial nesse episódio. Um trabalho maravilhoso do diretor Chris Fisher em casar esse detalhe de produção com a fotografia para dar o tom do episódio.
- Os flashbacks se apresentam todos como os personagens fingindo ser o que não são. É um retrato de convenção social que fica brilhante nessas setpieces convesacionais, e ainda são essenciais para entendermos a trama e os conceitos do episódio.
***** (5/5)
Próximo Person of Interest: 03x11 – Lethe (17/12)
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