27 de set. de 2010

Decifradores – Entrevista: Fábio Christofoli

variedades (nunc excl)entrevista fabioc

Uma das minhas primeiras descobertas nesse mundo fascinante da blogosfera, quando meu leque de assuntos ainda era limitado ao cinema e ao Filme-Pipoca, o blog do gaúcho Fábio Christofoli foi um dos primeiros que me chamou a atenção. Se como escritor vejo dificuldade em fugir de uma composição mais formal, como leitor o que me encanta é a dinâmica, a reflexão e a poesia surgida do acaso que marca mais essa geração de escritores virtuais. E, nesse sentido, como espaço mais do que pessoal, o Clube do Camaleão é um dos espaços mais completos e interessantes que se acha por aí. Isso porque seu autor não fica atrás, é claro.

De literatura a futebol, passando por cinema e música (meus momentos preferidos, é claro), o blog do Fabioc, como ele se identifica na blogosfera, é um espaço plural, agradável e surpreendente a cada novo post. E não deixa dúvidas de que seu autor, hoje um dos principais comentaristas do Anagrama e um dos mais valiosos amigos que fiz na blogosfera, é alguém que vale a pena conhecer. Deixemos ele falar, então.

Parte Um: As letras…

Uma palavra: Disciplina.

Um filme: “Na Natureza Selvagem” (Into The Wild, 2007).

Uma banda: The Strokes.                         Uma série de TV: House M.D.

Um ator: Denzel Washington.                Uma atriz: Fernanda Montenegro.

Um cantor: Tim Maia.                               Uma cantora: Julieta Venegas.

Uma citação: “A felicidade só é real quando compartilhada” (Emile Hirsch em Into The Wild).

Um blog: Lista 10.org

Dia ou noite? Dia.                          Inverno ou verão? Inverno.                     Acaso ou destino? Acaso.

Twitter ou Orkut? Twitter.        Orkut ou Blogger? Blogger.

Último filme que viu (gostou?): “A Origem” (Inception, 2010) – Fabuloso, uma obra-prima do cinema.

Tocando agora: Julieta Venegas – Despedida.

Parte Dois: O Anagrama…

Escrevo porque…

Porque acho que boas ideias não devem ficar presas ao pensamento. Elas devem ser eternizadas, seja em forma de papel ou em um arquivo de Internet. Nossas palavras de hoje são nosso legado de amanhã, a nossa visão atual do mundo. Eu adoro ler coisas que escrevi um ano atrás e perceber o quanto minha visão de mudou ou permaneceu a mesma, o pensamento não permite isso, pois ele se renova e muitas vezes deleta a ideia anterior. Nossa existência é evolutiva e a escrita permite um registro dessa evolução.

Também escrevo para exercitar minha mente, ampliar meus conhecimentos e interagir com o mundo.

Planeja antes de escrever ou deixa as coisas fluírem conforme escreve?

Depende do que vou escrever. Planejo se o texto é opinativo e envolve uma realidade que desconheço, por exemplo. Não gosto de ser ignorante, opinar sobre coisas que não tenho domínio. Mas existem coisas que sinto muita vontade de opinar, mesmo não tendo um grande conhecimento sobre o tema. Então planejo uma pesquisa e uso as informações para compor meu texto. Quando o texto é mais “poético” ou envolve emoção, prefiro deixar as coisas fluírem, pois seria um erro planejar textos assim.

Na Internet as pessoas mudam? Ela é capaz de mudar a vida das pessoas? Se sim, de que forma você mudou?

Não acho que as pessoas mudam, apenas são mais verdadeiras na Internet e revelam sua real identidade. Isso acontece porque a Internet oferece duas coisas muito tentadoras ao ser humano: privacidade e liberdade.

Através da privacidade, podemos ver um sujeito tímido tornar-se um líder com sucesso, capaz de cativar multidões ou um cidadão exemplar transformar-se em um monstro debaixo da proteção de um falso perfil. É o paraíso dos covardes. Isso revelou um lado extremamente selvagem do ser humano. Pessoas que xingam desconhecidos com uma ferocidade assustadora, que carregam uma inexplicável raiva do mundo. O pior é que esse comportamento está se popularizando e hoje os jovens estão cada vez mais agressivos e intolerantes com a opinião dos outros, até mesmo na vida real. Para comprovar isso basta ves o que acontece com as celebridades do Twitter, que são atacadas diariamente sem motivo, ou ler comentários de uma notícia em sites que permitem isso, como o Terra, por exemplo.

Através da liberdade oferecida pela Internet, nos movimentamos em diversos canais de informação e temos acesso a qualquer conteúdo. Isso é fantástico para quem sabe usar, mas terrível para quem não sabe. E a maioria não sabe. Tanto que estamos assistindo o nascimento de uma geração digital, extremamente dependente das possibilidades da Internet. É algo assustador, pois presencio rupturas inaceitáveis. Antigamente o pai ansiava ter um filho para ensinar algo para ele. Hoje o pai está ocupado demais e o filho aprende tudo no Google.  A cultura da sociedade mudou muito, estamos nos distanciando da nossa humanidade, tornando o nosso comportamento cada vez mais digital.

Eu tive a sorte de crescer em um mundo sem Internet, ao mesmo tempo em que vi seu surgimento. Claro que ela mudou minha vida, mas tenho consciência de que ela é apenas uma ferramenta que serve para facilitar as coisas. A nova geração não tem essa visão, pois já nasceu com a Internet inserida na sua vida.

Como você compara música nacional e internacional? Qual escuta mais é porquê?

Musicalmente falando, temos muita sorte de viver no Brasil. Aqui crescemos ouvindo artistas como Marisa Monte, Nando Reis, Paralamas do Sucesso, Caetano Veloso, Legião Urbana, Tim Maia e etc. Ao mesmo tempo temos fácil acesso a música internacional. Infelizmente, muitos brasileiros ignoram seus grandes músicos e adotam a ideia de que a qualidade musical só pode ser importada.

Não estou dizendo que a música internacional é ruim, só que a nossa tem um diferencial que não podemos comparar, pois são realidades e culturas distintas. Por isso defendo a música brasileira, que é singular, tem suas próprias características e é reconhecida pelo mundo. Não precisamos imitar os artistas internacionais para sermos bons e é isso que está acontecendo, basta ver a qualidade das bandas de rock da atualidade. Temos ótimas bandas, mas que valorizam a arte e não estão dispostas a pagar para estar nas rádios.

Atualmente escuto mais música internacional, mas sem descuidar as novidades nacionais. Vivo numa fase de pesquisa e ando fascinado pela música latina.

Escolha uma personalidade (de cinema, música, literatura…) que acha injustiçada e defenda-a!

Meu maior ídolo na música é o rapper, poeta e ator Tupac Shakur. Eu acho que ele é uma figura muito injustiçada tanto pela mídia, quanto por alguns críticos.

Ao morrer em 1996, Tupac nos deixou uma mensagem de paz, apesar da maioria de suas letras falarem sobre a violência. Na verdade, acredito que Tupac não promovia a violência, apenas a denunciava através de relatos extremamente crus e detalhistas. É verdade que às vezes ele exagerava, mas seu intuito era falar com as massas que não tinham voz. Ele trouxe a voz do bandido, da prostituta, do mendigo, da mãe solteira, do viciado em drogas, dos que sofrem com o preconceito. Vozes que a sociedade precisava ouvir, para perceber que as coisas não estavam bem. Ao trazes essas realidades, Tupac expôs várias falhas no sistema, deixando claro que a criminalidade nasce da desigualdade social. Ele lutou por mudanças, tentou uma comunicação e conseguiu cativar pessoas que aceitavam o seu destino de pobreza. Até hoje eu me arrepio quando escuto suas músicas. É impossível não se emocionar com “Keep Ya Head Up”, “Dear Mama”, “Better Dayz”, “Brenda’s Got a Baby”, “Me Against The World” ou “Changes”, por exemplo.

As letras falam de dor, de violência, de miséria, de sonhos, desejos e, acima de tudo, de esperança. É verdade que no final da vida ele arrumou problemas desnecessários e mudou o foco do seu trabalho, mas o cara sofreu um atentato e foi preso sem provas, qualquer um se sentiria perseguido.

Admiro ele não só pelas letras, mas pela emoção com que ele as interpretava. Falava de amor e ódio com a mesma intensidade, pois era movido a paixão. Gravou uma incrível quantidade de músicas em apenas um ano, tanto que muitos álbuns foram lançados após sua morte.

Morreu aos 25 anos e, mesmo tão jovem, conseguiu propagar sua voz pelo mundo e mudar muitas mentes esquecidas. Eternizou sua música espiritual, como ele mesmo definia. É triste ver que parte de sua luta foi má interpretada por alguns, incluindo admiradores. Seu discurso visava trazer paz às ruas, mas foi adotado e distorcido por rappers sem ideais e com a cabeça vazia como 50 Cent, que usaram o gangsta rap para enriquecer e esabanjar essa riqueza.

Como define sua forma de escrever, seu blog e a si mesmo?

Acredito que minha forma de escrever é indefinida, pois essa é a regra do meu blog. Admiro blogs que mantem um padrão, adoraria estabeleceu um só meu, mas não consigo. Antes eu odiava essa bagunça, mas hoje começo a encarar essa realidade sob um ponto de vista positivo. Minha escrita é sem rumo e isso é uma característica minha. Sou um cara que detesta fazer o mesmo caminho todos os dias, tento sempre descobrir novas ruas, mesmo que elas me façam caminhar mais. Sou curioso por natureza e ansioso por adquirir conhecimento. Meu blog reflete isso, reflete tudo o que penso e expõe minhas ansiedades. Se adotasse uma fórmula eu me sentiria limitado, pois fugiria do meu estilo de agir.

O blog passou por várias mudanças ultimamente, além de um tempo quase parado. Como você define/justifica essa reinvenção? Como saber o momento certo para renovar?

Ter um blog é um desafio. Digo isso apoiado em uma vasta experiência, porque desde 2002 eu já tive quatro (eu acho). Antes de criar o Clube do Camaleão eu pensei muito, queria evitar as decepções anteriores. Lembrei que o que mais me frustrava era o fato de ter pouco retorno, já que eu fazia um blog esperando 100 comentários e isso nunca acontecia. Então decidi mudar minha meta. Criei um espaço para ser um depósito de pensamentos, onde eu não teria nenhuma pretensão. Deu certo. Hoje estou feliz com o que ele representa para mim. Mesmo assim o fator “leitores” ainda mexe comigo. Não nego que às vezes a falta de comentários me desmotiva e que os elogios estimulam mais posts. A grande diferença é que a enventual falta de público tem um efeito mais ameno, que pode ocasionar um período de afastamento, mas não a eliminação do blog.

Me reinvento sempre, buscando um aperfeiçoamento como blogueiro e como pessoa. Hoje sou mais maduro, abracei a ideia de que o blog antes de tudo deve me satisfazer. Não penso em agradar ninguém a não ser eu mesmo – é claro que aceito opiniões. Mudo quando sinto que algo não me agrada mais.

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Livros que se tornam best-sellers muitas vezes são desqualificados por críticos pseudo-intelectuais, cujo maior prazer é desprezar o que agrada a maioria. Por sorte, tenho a mente aberta, o que me impede de adotar este pensamento limitado. É preciso entender que a quantidade de exemplares vendidos não determina a qualidade de um livro ou qualquer produto cultural.”

(Fabioc no post “A fórmula do sucesso – O Símbolo Perdido”)

3 comentários:

Anônimo disse...

Nossa Caio, adorei esse quadro de entrevistas!
Sucesso e um super beijo;*

Fabio Christofoli disse...

Caio, valeu pelo reconhecimento. Nem tenho palavras pra dizer o quanto estou me sentindo importante por ter um espaço aqui neste blog importante. Já disse que vc tem potencial para ser um blog cult, com um reconhecimento mto maior do que já tem. Continue trilhando este caminho, a evolução do Anagrama é notória e tem tudo pra alcançar voos maiores.
Um grande abraço.

Oráculo disse...

Muito intensas as suas entrevistas Caio, parabens, comecei a ler seu blog justamente por causa delas, vale a pena.

www.harmoniaemamarelo.blogspot.com