ATENÇÃO: esse review contem spoilers!
Em certo ponto de “The Axeman Cometh”, frente a frente com uma Madison ressucitada (long story), Nan pergunta: “Did you see a bright light?”. Os veteranos de American Horror Story devem ter até soltado um risinho cínico com a pergunta da personagem, posta ali exclusivamente, é claro, para que a série pudesse nos encarar francamente e posicionar mais uma vez sua filosofia: o mundo é um lugar escuro, assombrado por todos os tipos de horrores que a natureza humana pode trazer consigo, e é quase inacreditável o quanto nos agarramos uns nos outros (e na nossa própria existencia, nessa realidade maleável e abstrata que temos em mãos), ao ponto que o misericordioso beijo da morte soe ainda como uma sentença. Nessa sexta entrada de Coven, a série recupera a identidade e mostra o que a história das bruxas de New Orleans veio para acrescentar a ela.
Depois voltamos a todo o affair em torno de Madison, porque vale começar a discussão comentando sobre a pungente e desoladora cena de Fiona no hospital, iniciando seu tratamento de quimioterapia. Não só Jessica Lange continua fabulosa no papel, e a cada semana mais conforme conhecemos sua personagem, mas o roteiro de Douglas Petrie – estreante na série – se presta a realizar um retrato honesto das últimas esperanças e arrependimentos que cada um dos companheiros de sala de Fiona guardam em pensamento. É uma passagem emocionante como a da semana passada, que reforçou o lado maternal da personagem da maneira abstrata e sombria típica de AHS, e é um daqueles momentos de narrativa em que a premissa e a elaboração da série chegam ao seu ápice de ressonância, passeando por um horror melancólico e humano que é criminosamente raro hoje em dia.
Manter o roteirista Petrie por perto, aliás, não seria má ideia. Além desse b-plot brilhante, o moço faz o trabalho de juntar duas storylines que estavam com pontas soltas e encaminhá-las para outras direções, tudo enquanto conta uma história razoavelmente isolada com o episódio. “The Axeman Cometh” tira seu título de um assassino que conhecemos na New Orleans de 1919, um Danny Huston genericamente creepy (embora fazendo uso glorioso da voz rouca) que aterrorizou a cidade ao matar moças com um machado, enquanto linkava os assassinatos com o jazz que bombava nos bares da época. A grande novidade é que o flashback de início mostra-se mais contundente do que os da primeira temporada da série jamais conseguiram ser, quando descobrimos que o espírito do psicopata ainda assombra a casa das bruxas, e Zoe é obrigada a trazê-lo para o plano dos vivos em troca de saber onde está Madison.
Encontrado o corpo da estrela de cinema/futura Suprema (ou não!), é hora de chamar Misty para revivê-la, uma vez que seu trabalho com Kyle e Myrtle foi tão prestativo – mentira, a série explica que a moça tem mesmo o “dom da ressurgência”, ou algo do tipo. Na verdade, aceitamos praticamente qualquer desculpa minimamente plausível para ter Lily Rabe por perto por mais tempo, porque a atriz está se divertindo com o papel como não fez nem mesmo na temporada anterior com a Irmã Mary Eunice. Convenientemente, quando Zoe vai procurá-la um desvairado Kyle já está de banho tomado e dando um ataque psicótico (“Get him out of here. He broke Stevie!”). A personagem de Taissa Farmiga leva esse Frankenstein traumatizado para a casa das bruxas, em mais um desenvolvimento pouco útil em uma história que tem sido basicamente um beco sem saída.
Falando em Farmiga, “The Axeman Cometh” também segue a deixa do episódio anterior e começa a apresentar Zoe como uma personagem mais proativa. A atriz agradece a oportunidade de fazer algo além de reagir aos outros atores em cena, e já ensaia uma performance conquistadora para quem estava reclamando da decisão de colocar a personagem como a provável próxima Suprema (ou não!). Quem também adiciona sabor a sua performance é Gabourey Sidibe, que tempera com um sadismo debochado sua Queenie, aos poucos se desenvolvendo como uma favorita fácil entre as bruxas adolescentes da série. Ela é também parte de uma tendência de Coven em mostrar as mulheres negras como as que vêem mais claramente o que está realmente acontecendo ao seu redor. Enquanto a conversa de “extinção das bruxas” de Zoe e Fiona é vaga, as advertências de Queenie são imediatas e concretas, assim como as de Leveau.
Essa é a nossa visão do ressurgimento da discussão em torno de ser “um tempo perigoso para as bruxas” nesse episódio, aliás: American Horror Story está querendo nos mostrar que na nossa visão megalômana de nós mesmos e daquilo que nos cerca, na nossa psique torta de que nossa vida é mais importante do que as circunstâncias ao redor dela, não somos só as vítimas desse mundo cruel que a série sempre retratou. Em igual medida, conforme nos envolvemos em conflitos uns com os outros e nos deixamos levar por pretextos falsos para justificá-los, somos nossos próprios Anjos da Morte.
Observações adicionais:
- A direção de Michael Uppendahl, já veterano na série, é mais contida das estilizações do que a de alguns de seus companheiros, mas a cena inicial do flashback ganha tratamento diferenciado. Os takes baseados em sombras e o tratamento de um gore “artistizado” através do exagero mecânico são toques bem delicados e bacanas.
- Não deu tempo de falar, mas Sara Paulson está fucking amazing na pele da Cordelia cega. A capacidade que a atriz tem de filtrar pela loucura da premissa de AHS e construir tão meticulosamente uma personagem de detalhes e fundação forte é formidável.
- Also, a revelação de que o marido de Cordelia era um caçador de bruxas contratato por Leveau coloca a “divisão de lados” em perspetiva para Coven. Não foi Fiona que começou a guerra, então? Era preciso que se equilibrasse essa equação.
***** (4,5/5)
Próximo American Horror Story Coven:
Ep. 7 – The Dead
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