16 de fev. de 2015

The Americans 3x02/03: Baggage/Open House

THE AMERICANS -- "Baggage" Episode 302 (Airs Wednesday, February 4, 10:00 PM e/p) Pictured: Matthew Rhys as Philip Jennings. CR: Michael Parmelee/FX

ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

por Caio Coletti

3x02 – Baggage

Durante os 45 minutos de “Baggage”, este que vos fala perdeu as contas da quantidade de takes de portas sendo fechadas, trancas sendo acionadas ou soltas, pessoas presas atrás de vidros, grades ou paredes, que compõem o episódio. O tema quase obsessivo registrado pela câmera do diretor Daniel Sackheim, em sua terceira colaboração seguida com a série, tem muito a ver com o que “Baggage” quer nos dizer, no contexto da terceira (e já excepcional) temporada de The Americans. Como o episódio intensamente claustrofóbico e quase completamente passado em ambientes interiores que é, ele parece querer nos traduzir em visuais as várias prisões em que esses personagens se trancam. Seja na vida doméstica de faz-de-conta (ou não?) de Elizabeth e Phillip, seja no cárcere literal em que Nina está metida, é como se cada ambiente fechado retratado pelo diretor fosse uma reflexão dos traços de personalidade, da determinista construção pessoal de cada um desses seres humanos.

De certa forma, essa tese é quase uma resposta direta à “EST Men” (review), que pareceu celebrar, do seu jeito particular, as virtudes de viver desprendido dos hábitos e das determinações do passado. “Baggage” quer nos dizer que esses hábitos e essas determinações são a mais pura essência do que nos faz quem somos, para o bem ou para o mal. Materializada em imagens da forma como está no episódio, essa noção é inescapável, e é a prisão mais cruel com a qual precisamos todos lidar dia após dia – e “Baggage” é ótima em mostrar o quanto seus personagens adorariam fugir disso: seja o Agente Beeman e sua mania de esconder as emoções fundo dentro de uma armadura de impassibilidade, o que ele descobre ser o real motivo do afastamento de Sandra (em uma cena lindamente interpretada por Noah Emmerich e Susan Misner); Elizabeth, que foi ensinada pela mãe a ser dura e colocar a “missão” (a ideia, o país, etc) acima da individualidade e da possibilidade dar uma vida tranquila e diferente para sua filha; ou mesmo Phillip, que gostaria de fugir das complicações do casamento entre ele e Elizabeth e viver independente da guerra de ideologias que povoa, ainda, a sua cabeça e a sua rotina.

Todas essas características, e essas circunstâncias em que viveram e vivem, são fundamentais para esses personagens serem quem são, e The Americans tira uma dolorosa amargura disso. “Baggage” é um episódio em certos momentos chocante, terrivelmente trágico e, ainda por cima, contido e silencioso da forma que só essa série conseguiria ser. Pensado e atuado como uma verdadeira elegia a essa vida sombria que os personagens levam, é também uma das melhores peças de televisão do ano até agora, e o mais impressionante é que não será surpresa se a própria The Americans se superar nas próximas semanas. Nem o céu é o limite para a história dos Jennings.

✰✰✰✰✰ (5/5)

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3x03 – Open House

Há algo de brutal em “Open House” que reflete um pouco da intimidade e proximidade com os personagens que The Americans criou nesse terceiro ano. É difícil imaginar a série que estreou em 2013  nos mostrando momentos como o desmembramento e descarte do corpo de Annelise, que foi parte fundamental de “Baggage”, e a agoniante sessão de extração dental entre Phillip e Elizabeth nesse “Open House”. Essa queda na resistência às estratégias de choque do espectador não faz de The Americans uma série barulhenta ou tampouco menos sutil do que sempre foi, mas nos ajuda a entender o mundo em que esses personagens vivem, e a forma como o relacionamento entre eles e as tribulações em suas mentes se desenvolvem. A trama da FX encontra um jeito de incluir largos subtextos mesmo nesses momentos em que trazem a emoção da trama à flor da pele, e o resultado é que a densidade da narrativa só ganha com isso.

O roteiro de Stu Zicherman (2x10, “Yousaf” – review) faz hora extra ao trabalhar todo esse conteúdo emocional ao mesmo tempo em que move a trama da temporada adiante com agilidade. Em “Open House”, vemos os Jennings se aproximando dos integrantes da comissão da CIA para o Afeganistão, e quase sendo apanhados pelo FBI no processo – é especialmente enervante a sequência em que Elizabeth fica sozinha no carro sendo perseguida pelos agentes governamentais, dirigida com um senso de dinâmica cênica único por Thomas Schlamme (2x01, “Comrades” – review). Enquanto o cerco aos nossos protagonistas se fecha, o episódio faz pequenos avanços na frente doméstica da trama, enfrentando de frente a discordância ideológica entre Phillip e Elizabeth quanto ao recrutamento de Paige.

É justamente essas entrelinhas que se refletem na notável cena em que marido e mulher se juntam para um procedimento dentário de emergência, se é que podemos chamá-lo assim. O close-up nos olhos de Matthew Rhys e Keri Russell revela mais que todos os diálogos entre os dois já fizeram, estabelecendo, mesmo que sutilmente, um jogo de algoz e vítima, uma espécie de punição física pelos conflitos emocionais que os dois passam e passaram durante todos os três anos de série. The Americans entende esse casamento também como um jogo de poder, e deixa isso claro de sua maneira muito particular, extrapolando as tensões de um episódio fervilhante em uma cena que vem como um choque para o espectador.

Poucas vezes em sua curta história The Americans foi tão ousado, e tão bem-sucedido no que se propôs.

✰✰✰✰✰ (4,5/5)

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Próximo The Americans: 3x04 – Dimebag (18/02)

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