21 de jun. de 2013

Review: O retorno de Wilfred (03x01 – Uncertainty/ 03x02 – Comfort)

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por Caio Coletti

ATENÇÃO: esse review contem spoilers!

“Você é tão são quanto qualquer outra pessoa”, diz o cachorro para o homem. Uma das coisas mais deliciosas em Wilfred (uma série que merece esse adjetivo muito mais frequentemente do que ele lhe é dado) é que seus roteiristas nunca parecem se cansar de jogar com a discussão, natural da trama, em relação a loucura e o que ela significa de verdade. “Uncertainty”, depois dos eventos do finale da segunda temporada, obviamente seria um episódio conectado a mitologia e ao “mistério” da verdadeira natureza de Wilfred (o personagem), mas é surpreende com quanta elegância e precisão a série o faz.

Para começar, relembramos que no final da última temporada, Ryan (Elijah Wood) encontrou um desenho feito por ele na infância que incluía, escondido atrás de uma árvore no cenário, a figura inconfundível de Wilfred (Jason Gann). Isso leva os dois protagonistas a conclusões distintas: Ryan se convence que Wilfred é puramente fruto de sua imaginação, enquanto o cachorro tenta convencê-lo que, na verdade, ele é um “ser mágico”. Quem acompanha a série desde o ínicio sabe que o developer David Zuckerman está mais preocupado com outro dilema: Wilfred funciona como um “anjo” ou como um “sabotador” para Ryan?

A forma com que a história da série está sendo contada, com seus episódios intitulados de maneira abstrata e suas epígrafes, nos leva a crer que esse é um processo de aprendizagem para o protagonista, e que Wilfred é só um tutor muito mal-educado. No entanto, Zuckerman e seus roteiristas fazem o cachorro cometer atrocidades e atos egoístas o bastante para que os que acreditam o contrário não fiquem sem evidências. Esse jogo de brincar com o público, de “jogar em duas frentes ao mesmo tempo”, era parte do que tornava Lost uma série tão compulsiva, e talvez a parte que a maioria das discípulas da série de J.J. Abrams tem esquecido.

Wilfred (a série) é extremamente interessante do ponto de vista narrativo e conceitual, tem em Ryan um protagonista absurdamente bem construído (e bem interpretado, graças a incansável consistência e carisma de Elijah Wood), mas não se esquece de ser uma das coisas mais engraçadas da televisão americana no processo. Jason Gann tem se mostrado um mestre da comédia no papel do “cachorro". Em “Uncertainty”, uma boa parte da trama envolve Gann interpretando uma versão almofadinha de Wilfred, um clone que sua dona ricaça dos tempos de filhote fez para eternizá-lo. Os efeitos disso não poderiam ser melhores para abrir uma temporada de televisão.

***** (4,5/5)

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“Comfort”, segundo episódio da temporada, que a FX resolveu exibir na mesma noite do de estréia, não tem uma trama exatamente conectada com “Uncertainty”, ainda que continue o processo de amarrar algumas pontas deixadas pelo finale do segundo ano da série. Ah, e temos uma oportunidade ainda mais sensacional para ver os talentos de Jason Gann brilharem: depois do retorno de Jenna (Fionna Gubelmann) e Drew (Chris Klein) da Lua de Mel, Ryan precisa explicar para Wilfred que eles não estavam “mortos e voltaram”, e que quando as pessoas morrem, elas não podem voltar. Essa realização, mais o fato de um “homem branco, magro e barbudo” libertar Wilfred do carro onde Ryan o deixou enquanto se encontrava com seu novo amigo (o carteiro), faz o cachorro virar um fanático religioso.

A estrutura narrativa de “Comfort” é bem familiar para aqueles que acompanham a série, e isso não é de nenhuma forma algo ruim. A lição de moral gradual e cristalina aqui não soa nem um pouco forçada, especialmente quando temos Gann fazendo graça com seu Wilfred hiper-religioso e (bold move, mr. Zuckerman!) batizando Ryan em uma privada. Esse balanço impede Wilfred de soar como uma série moralista, o que poderia acontecer mesmo que, fundamentalmente, ela não o seja. A indecisão quanto a índole de Wilfred (o personagem), a própria área cinza em que Ryan parece sempre trafegar e, mesmo que caricaturalmente, arrastar seus coadjuvantes. Tudo contribuí para que as “lições” do personagem-título soem como o coração no lugar que uma série com a cabeça desregulada precisa ter. E a dinâmica funciona as mil maravilhas.

“Comfort” lida também com a partida de Amanda, personagem de Allison Mack, que foi namorada de Ryan por alguns episódios e logo se mostrou tão ou ainda mais insana quanto ele. Presa e internada em um hospício (o que mostra quão longe no lado sombrio de sua trama Wilfred é capaz de ir), Amanda é um tópico que Ryan está evitando, e ele encontra no carteiro com quem faz amizade uma alma gêmea, que também não gosta de discutir o passado. A mensagem de Wilfred, claro, é que não podemos fugir dele, senão buscar conforto naqueles próximos a nós. “Comfort” mostra que Wilfred é uma série pronta pra colocar as coisas nos trilhos e explorar todo o potencial da trama mais improvável da televisão americana atualmente. E nós, é claro, assinamos embaixo.

***** (5/5)

Próximo Wilfred: 03x03 – Suspicion (27/06)

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