ATENÇÃO: esse review contem spoilers!
por Caio Coletti
“Há um buraco no casco do seu barco”, diz Will McAvoy para a esposa (e futura mãe dos seus filhos! yay!) McKenzie algumas cenas depois de descobrirmos que ela foi promovida ao cargo de nova presidente da ACN, e portanto vai passar o resto da carreira lutando contra executivos como o odiável Pruit (B.J. Novak), que atazanou a vida dos nossos protagonistas no episódio passado. “Esse buraco nunca vai ser consertado, nunca vai desaparecer, e você não pode comprar um novo barco. O que você tem que fazer é jogar água para fora mais rápido do que ela está entrando”, ele conclui. É difícil perdoar Aaron Sorkin pela discussão pífia e completamente iludida sobre estupro que ele promoveu em “Oh Shenandoah” (review), mas “What Kind of Day Has it Been” conclui The Newsroom da forma como ela viveu: uma série que precisa ser assistida por quem quer refletir sobre jornalismo, e redescobrir nela os conceitos mais fundamentais da sua profissão.
Sorkin nunca negou que sua série fosse um conto idealista – as metáforas envolvendo Dom Quixote vem desde a primeira temporada –, mas com a evolução da premissa e a vontade de abraçar mais diálogos em sua história, o roteirista foi capaz de descobrir as próprias falhas e, ao mesmo tempo, reafirmar em que pontos suas críticas eram válidas, e seu resgate de princípios era crucial. O tempo e a crítica fez bem a The Newsroom, porque ela não seria uma obra tão completa sem retratar de forma contundente, como o fez, a necessidade do confronto entre pontos de vista no processo jornalístico. A série da HBO, no final das contas, fugiu do moralismo e viu as situações do mundo moderno ensinando e desafiando tanto aos antiquados anti-heróis de Sorkin quanto eles ensinavam ao espectador desavisado.
É muito bacana a forma como “What Kind of Day Has it Been” é fiel ao que fez The Newsroom o que ela sempre foi: tanto nos flashbacks que mostram momentos de Charlie com Will e Mac, além de interações entre personagens secundários; quanto na presença de Leona (a sempre bem-vinda Jane Fonda), cravando num confronto com Pruit o ponto fundamental daquela situação do “buraco no casco do barco” que Will cita para Mac durante o que pode ser o diálogo mais crucial do episódio. Tanto um personagem quanto o outro encaram de frente uma situação muito real: o confronto entre o departamento financeiro e o departamento jornalístico não é só inevitável – é necessário. Significa que ambos estão fazendo seus trabalhos da maneira certa, e constitui só mais uma das milhões de negociações e jogos de poder dos quais o nosso mundo é feito.
Se há algo em que a terceira temporada de The Newsroom foi excelente, é em retratar esses conflitos. Em colocar a ética exigida dos nossos personagens em rota de colisão com a humanidade que é inerente deles, e em posicionar as forças que fazem oposição ao trabalho que eles precisam fazer no dia-a-dia. “What Kind of Day Has it Been” termina de forma muito emblemática, com o “good evening” de Will na bancada do News Night sinalizando que os conflitos desses personagens não acabam ali – embora The Newsroom se feche direitinho como narrativa, os desafios no jornalismo não admitem um ponto final. Caso admitissem, a própria prática da atividade perderia o sentido.
Notinhas adicionais:
- Como esse é o último episódio de The Newsroom, é mais que apropriado render aplausos ao trabalho do elenco, que segurou a barra dos diálogos de Sorkin e da missão nada fácil de serem plataformas para as opiniões e discussões do roteirista ao mesmo tempo em que construíam seres humanos profundamente falhos e tridimensionais.
- Inclusive, uma prova de que as personagens femininas de Sorkin não são caricaturas (embora esse processo tenha precisado de uma boa evolução desde a primeira temporada) são as atuações de Emily Mortimer, Alison Pill e Olivia Munn, só para citar as três protagonistas.
- Uma série tão boa realmente precisava de uma trama como a da estudante vítima de estupro em “Oh Shenandoah”? Fica a lição, Sr. Sorkin: mais pesquisa antes de escrever e, principalmente, mais humildade na hora de abrir discussão sobre um assunto tão delicado.
- B’bye, ACN!
✰✰✰✰✰ (4,5/5)
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