ATENÇÃO: esse review contem spoilers!
por Caio Coletti
Aaron Sorkin é um escritor poderoso. O criador e autor (de todos os episódios) de The Newsroom conhece as estruturas da narrativa tão intrincadamente, as próprias entranhas daquilo que consideramos boa ficção, que é difícil não ficar, como espectador, se equilibrando na ponta dos dedos de um contador de histórias tão eficiente. A genialidade de The Newsroom é em grande parte a genialidade de Sorkin, e “Boston” é um épico de 52 minutos de televisão que testemunha mais uma vez o quanto o roteirista é capaz de nos surpreender e nos localizar no momento da trama. A epifania dos minutos finais é um choque para quem se viu envolvido pelos momentos que a precederam, um retorno saudoso ao mundo desses personagens e aos fascinantes mecanismos do trabalho que eles desempenham. “Boston” manipula o espectador com maestria, e ainda o faz por uma história que acerta bem as próprias pontas soltas.
Os planos para o casamento de Will e Mac estão progredindo enquanto todo mundo na ACN é pego de surpresa por uma emergência: o ataque terrorista à maratona de Boston, que chocou os americanos em Abril de 2013. Cautelosos graças ao trauma de Genoa, nossos protagonistas são os últimos a confirmar a explosão de duas bombas na linha de chegada do evento esportivo, mas o episódio trabalha bem ao explorar a decisão de fazer jornalismo bem fundamentado ao invés de correr atrás de reproduzir o noticiário dos concorrentes para não ficar para trás (“I don’t see anything wrong with being gun-shy because of Genoa”, crava a sempre essencial Mac).
Esse “terceiro ato” de The Newsroom parece ser essencialmente sobre responsabilidade, e é intrigante ver como Sorkin trabalha ao colocar seus personagens em situações complicadas nas quais ela é exigida de maneira muito pontual. Sob a tutela da personagem da fabulosa Emily Mortimer, mais encantadora do que nunca, todos os integrantes da newsroom da ACN passam por momentos em que a ansiedade frente a uma nova história é confrontada com a cautela necessária que o trabalho deles impõe. O roteirista Sorkin olha o mundo do jornalismo contemporâneo com olhos que não são cínicos, mas talvez sejam sim acusadores: e é impossível não lhe dar razão quando a corrida frenética pela notícia produz casos como o retratado aqui, quando um jornal americano identificou dois homens inocentes como suspeitos do bombardeio na maratona.
Tudo escala inevitavelmente para a nervosa conclusão do episódio, quando Will, Mac, Charlie e cia encaram a situação mais preocupante desde o início da série: Neal pode estar com sérios problemas judiciais ao se envolver com uma fonte anônima que lhe enviou documentos confidenciais do governo (Yay! A advogada interpretada por Marcia Gay Harden vai voltar!); Reese encara o assustador prospecto de ter uma companhia tentando comprar a ACN num processo que Sloan chama de hostile takeover (pessoal da economia deve ter entendido melhor que eu, mas não soa muito amigável); e a queda de credibilidade pós-Genoa continua afetando a audiência da emissora, e o ego de Will.
Tudo explode em uma metáfora tirada de Eurípedes, citado, é claro, por Mac em uma conversa com Will. The Newsroom é muito inteligente ao nos vender a noção, durante todo o episódio, de que essa terceira e última temporada é sobre nossos protagonistas recuperando a confiança do público, para depois revelar o que estava bem embaixo dos nossos narizes: ainda há muitas pedras para serem jogadas neles nessa panela de pressão circense que se tornou a percepção do público em relação a mídia. Aaron Sorkin agora tem cinco episódios para nos mostrar como esses personagens perduram durante tal linchamento, e o que os espera no final dele – mas será que alguém duvida que o moço está mais do que preparado para a tarefa?
Observações adicionais:
- É um momento de característica doçura da série ver Maggie (Allison Pill) tomando lugar frente às câmeras pela primeira vez. Como os outros personagens parecem notar, é como se a moça tivesse envelhecido (e amadurecido) uns bons dez anos em alguns episódios. E depois os críticos vem me dizer que Sorkin trabalha mal as personagens femininas.
- A percepção do escritor quanto a mídia social evoluiu bastante da primeira temporada para cá. Talvez o contato com o mundo do jornalismo, no processo de pesquisa de casos recentes como os retratados pela série, tenha informado Sorkin da relevância desse ambiente virtual para o âmbito informacional no nosso século – mas as críticas que ele faz a esse ambiente também são muito pontuais, e devem ser ouvidas.
- Sam Waterson e Jeff Daniels nunca mais deveriam deixar de contracenar. Alguém diga a esses dois pra escolheres projetos conjuntos depois do final da série, por favor.
✰✰✰✰✰ (4,5/5)
Próximo The Newsroom: 3x02 – Run (16/11)
1 comentários:
A última temporada de The Newsroom, o que é uma pena, mas melhor do que agora termina quando você não pode mais fazer nada com os problemas a pouco eles aparecem.
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