30 de ago. de 2015

6 anos d’O Anagrama: 6 séries marcantes dos últimos 6 anos

POST

Essa semana O Anagrama completa 6 aninhos! Incrível pensar em como esse tempo todo passou rápido, e o quanto o site mudou de 2009 pra cá, mas mais incrível ainda é pensar em quanta coisa, quanta cultura pop, passou por aqui e pelo mundo nesse período. Por isso, para comemorar em grande estilo os 6 anos do site, resolvemos olhar para fora de nós mesmos e montamos uma série de listas selecionando alguns dos “itens” mais marcantes da cultura pop dos últimos anos. Serão dois posts de TV, dois de cinema e dois de música, para pagar tributo ao caráter multi-assunto d’O Anagrama, nos próximos seis dias, e embora as nossas seleções sejam muito pessoais, como sempre estamos mais que abertos para discutir quem faltou e quem sobrou nas listas com vocês, maravilhosos leitores!

Essa é a nossa lista de 6 séries que acompanhamos mais avidamente nesses 6 anos. Amanhã o especial continua com os nossos 6 filmes preferidos de 2009 pra cá.

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Modern Family (ABC, 2009-)
Criadores: Steven Levitan, Christopher Lloyd
Elenco: Ed O’Neill, Sofia Vergara, Julie Bowen, Ty Burrell, Jesse Tyler Ferguson, Eric Stonestreet, Rico Rodriguez, Nolan Gould, Sarah Hyland, Ariel Winter, Aubrey Anderson-Emmons, Pierre Wallace

por Caio Coletti

Hype é uma coisa interessante. Lá em 2009, quando estreou, Modern Family recebeu uma tonelada de reviews positivos e ganhou público tão rápido, e de forma tão massiva, que ficou claro para todo mundo que havia algo de decididamente especial na criação de Steven Levitan e Christopher Lloyd. De lá para cá, conforme as temporadas foram passando e, especialmente, o público online foi se tornando mais autonomamente crítico, MF foi colocada em reavaliação e pipocaram artigos na rede que reclamavam da série estar “se perdendo”, ou mesmo clamavam que, seis temporadas depois da estreia, os personagens retratados na sitcom não haviam evoluído e progredido o bastante para os espectadores ainda se afeiçoarem a eles. Essa mudança de opinião não é por acaso, é claro: com 24 episódios por ano para colocar no ar, Levitan e Lloyd, no que deve ser um ritmo de trabalho alucinante, certamente começaram a desenhar contornos mais difusos para os personagens. Em muitos sentidos, eles de fato permanecem os mesmos que eram no episódio piloto, de 2009 – mas essa é na verdade uma das grande virtudes da comédia da ABC.

Permitindo que seus personagens mantenham integralmente os traços de personalidade que os definem (inclusive os ruins), e não perdoando-os pelos erros em que eles incorrem por causa desses defeitos, Modern Family se tornou uma das sitcoms mais conectadas com o zeitgeist americano, de fato uma herdeira “século XXI” para as séries de comédia das décadas anteriores que tratavam de famílias de classe média-alta e cativavam uma fatia muito grande do público de televisão (Family Ties, clássico dos anos 80, é o exemplo mais óbvio). Assolada por todos os males que chegaram realçados na nossa época, do egocentrismo ao espírito competitivo, passando pela preocupação obsessiva com a aparência e com as pressões sociais, a família moderna do título é uma confusão de afeições e birras, uma mistura predominantemente doce de temperamentos e constrangimentos. Modern Family tira preciosidades cômicas do seu elenco de personagens e das interações entre eles, e se aproveita da regra de ouro das sitcoms (“tudo se resolve no final”) para realçar que, em qualquer relação social, e especialmente em uma tão próxima quanto um laço familiar, perdão e consciência dos próprios erros são tudo o que impedem a coisa toda de desmoronar.

Os novos-críticos mais ferrenhos de Modern Family insistem em acusá-la de montar suas histórias como se esses personagens se odiassem ao invés de amarem-se. O que passa despercebido a essas pessoas são os pequenos momentos em que a criação de Levitan e Lloyd guarda os sinais desse amor familiar – e é muito realista que eles façam dessa forma, não? No dia-a-dia, o amor está muito mais em pequenas coisas do que em grande declarações. Os críticos passam batidos, também, pela química maravilhosa entre o elenco, e a percepção afiada que eles desenvolveram de seus personagens à essa altura, fazendo valer aqueles reviews lá de 2009 em que se dizia que a série não tinha “nenhum elo fraco” entre seus atores. Os atores mirins cresceram para se tornarem performers com personalidade própria, e talento promissor (principalmente no caso da ótima Sarah Hyland, a Haley), o que sem dúvida foi um golpe de sorte dos criadores – há algumas temporadas, são as crianças que mantem as engrenagens do arco de história se movendo graciosamente em Modern Family. Em muitos sentidos, a hoje criticada gigante da ABC continua sendo a sitcom mais sincera no ar atualmente, e isso não é pouco.

Status: Renovada para a 7ª temporada – estréia dia 23 de Setembro de 2015.

27-got-poster.nocrop.w529.h835.2xGame of Thrones (HBO, 2011-)
Criadores: David Benioff, D.B. Weiss
Elenco: Peter Dinklage, Lena Headey, Emilia Clarke, Kit Harrington, Sophie Turner, Iain Glen, Maisie Williams, Nikolaj Coster-Waldau, John Bradley, Alfie Allen, Aiden Gillen, Gwendoline Christie, Natalie Dormer

por Caio Coletti

Curiosamente ou não, Game of Thrones é outra das vítimas da “revisão crítica” pela qual todos os gigantes do entretenimento atual andam passando sob o olhar clínico do público online. No ar desde 2011, a série ganhou porte e público (ou será que nós ganhamos percepção do tamanho desse público?) junto com a inflamação das redes sociais, que elevaram as desventuras passadas na terra mística de Westeros a uma das histórias obrigatórias do zeitgeist contemporâneo. Das últimas temporadas para cá, choveram reclamações e artigos ultrajados daqueles que enxergaram nas cenas mais chocantes da série, pela primeira vez em cinco anos de trajetória, estratégias vazias de atração de público. A memória curta serve mal a esses críticos, porque é inegável que Game of Thrones sempre foi uma série em que a aposta no choque e na aversão do público foram partes essenciais de sua narrativa. Estamos falando de uma série em que, no final do episódio piloto, um personagem que não é exatamente antagonista empurra uma criança inocente da janela mais alta de uma torre gigantesca. A dubiedade moral da história de George R. R. Martin, adaptada para a TV por David Benioff e D.B. Weiss (entre outros roteiristas, claro) é um de seus grandes triunfos, sua empatia pelas falhas do mundo que retrata e das pessoas que o habitam é um traço definitivo daquilo que a diferencia de outras narrativas.

Game of Thrones é uma história sobre um mundo em que pessoas terríveis são colocadas em posições de poder, e na qual passamos uma boa parte do tempo enxergando que essas pessoas terríveis, capazes de atos ainda mais inomináveis quando elevados a essa soberania, são tão humanas quanto nós. Às vezes é impossível não se pegar pensando se nós mesmos, no lugar daqueles tiranos que observamos, seríamos tão supremamente melhores que eles. Nas mãos de Weiss e Benioff, a ideia de poder e influência é sedutora em parte porque ela traz com ela um senso de perigo formidável – todo mundo se acha forte o bastante para flertar com o trono de ferro e não se deixar levar pela embriagante sensação de ter outras vidas nas palmas das mãos, mas ninguém realmente é. Os mais sábios são aqueles que admitem isso, mesmo tendo suas próprias falhas: entre eles, talvez Tyrion (Peter Dinklage) seja o mais marcante. Apesar do sotaque britânico meia-boca do ator (yes, we went there), é na sua atuação equilibrada e expressiva que o personagem vai além do carisma e encontra uma humanidade e uma vulnerabilidade tão intensas quanto qualquer outro dos grandes personagens de TV atualmente.

Game of Thrones, mesmo com sua natureza vastíssima de personagens, locações e plot points, é uma história tremendamente centrada em termos de temática: é sobre amadurecimento na forma como retrata a jornada de alguns personagens mais jovens (Sansa e Arya principalmente, é claro) e as escolhas que eles fazem nessa parte delicada da vida; é sobre intolerância e radicalismo, sobre crença e descrença, sobre a forma como nossa vida é construída em cima de dualidades, de preto-e-branco, quando o mundo é muito mais complexo que isso. Sempre tremendamente bem-escrita (sempre!) e, na maioria das vezes, dirigida com uma perícia e uma manipulação de climatizações que ainda não é comum para a televisão, Game of Thrones é uma produção impressionante, mas é também uma história impressionantemente humana. E eu te dou três chances, caro leitor, para acertar qual dessas duas qualidades a faz verdadeiramente especial.

Status: Renovada para 6ª temporada – estréia em Abril de 2016.

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Person of Interest (CBS, 2011-)
Criador: Jonathan Nolan
Elenco: Jim Caviezel, Kevin Chapman, Michael Emerson, Taraji P. Henson, Amy Acker, Sarah Shahi, John Nolan

por Lucas Arraz

Qual o melhor sci-fi da televisão norte americana atual, e por que é Person of Interest? POI é uma série de ficção científica que mistura doses cavalares de suspense, drama e ação policial. Na trama, acompanhamos a história de Harold Finch (Michael Emerson) e John Reese (Jim Caviezel) - um bilionário e um ex-agente da CIA que, considerados mortos, atuam como o braço invisível da justiça em Nova York. Resolvendo crimes clandestinamente, a dupla de protagonistas conta com a ajuda de um supercomputador chamado Machine, que é capaz de invadir sistemas de vigilância e bancos de dados, prevendo quando crimes irão acontecer. Só há um detalhe: a Machine só entrega aos nossos protagonistas um CPF. O CPF nos leva a um nome e o nome nos leva a uma pessoa que pode estar prestes a ser vítima ou agente de um crime. Cabe a Finch e Reese, semanalmente, descobrir quem é o quê. Porém, há algo na Machine que incomoda seu criador Finch: Quais são os limites e perigos que sua inteligência artificial capaz de vigiar e punir as pessoas traz? A série é assinada por J.J Abrams (LOST) na produção executiva, Jonathan Nolan (O Cavaleiro das Trevas) como developer e ainda conta com Taraji P. Henson (Empire) e Kevin Chapman (Sobre Meninos e Lobos) no seu elenco. Feitas as apresentações, vamos a questão: O que faz de POI a melhor série de ficção científica da atualidade?

Quando estreou, em meados de 2011, Person of Interest não surpreendeu. Almejando conquistar a audiência órfã da LOST recém finalizada, POI, como tantas outras na época, tentou se escorar na fórmula LOSTiana: uma narrativa que misturava, em um procedural, ficção cientifica e mistério, flashbacks e personagens vivendo uma jornada de humanização. Tudo isso com aquele estilo de TV aberta com direito a protagonista heroico. O resultado, não vou mentir, é um início de série superficial, sem identidade e meia boca, mas não demorou muito para que o criador da série, Jonathan Nolan (irmão de Christopher, diretor de Interestelar), entender o que ele tinha na mão: uma história promissora com potencial para ser muito mais do que uma “nova LOST”. A revolução da narrativa de POI está em no ponto central de entender a realidade na ficção. O que torna Person tão legal (sem spoilers, galera) é quando ela esquece o seu lado procedural-caso-da-semana e passa a discutir questões atuais como invasão da privacidade, vigilância governamental e domínio das I.A sobre os humanos.

Em 2015 tivemos uma crise diplomática mundial quando descobriram que o presidente Obama autorizou a instalação de vigilâncias não consentidas a líderes políticos por todo o globo. Obama espionando a Dilma? Desculpa sociedade, mas o controle político de espionagem é algo que POI discute há temporadas. Para quem acompanha a série, vamos lembrar da season finale da terceira temporada, onde a Machine decide que seria melhor para os humanos se os protagonistas matassem um então inocente Senador americano pelo que ele podia vir a fazer no futuro; ou quando ainda temos o Samaritan controlando as eleições para governador de Nova York. A história de POI se constrói de forma que cabe ao telespectador discutir se a Machine do Harold faz um trabalho certo ou não – se ela é dotada de superpoderes abusivos ou ainda está limitada para agir. Tudo isso com base na nossa realidade de invasões à privacidade e superexposição digital.

Se por um lado prevenir crimes através da vigilância civil ajuda nossos protagonistas a salvarem vidas, a série levanta levanta questões como: É correto que uma máquina diga o que é um crime? Qual é a liberdade que daremos para essa máquina? É correto que ela tenha acesso a todas as ligações, imagens e dados de todas as pessoas mesmo que isso signifique um estado de segurança total? O mais legal é que Person não vai te dar essas respostas. Ver a série é tão interessante porque, assim como na realidade, não há um lado 100% bom/certo e um lado mal/errado na narrativa (não existe um Jacob versus a fumaça preta em POI). O que existem são pessoas, em futuro distópico e próximo, defendendo seus próprios ideais e que estão sujeitas a erros neste processo. POI, enfim, é uma série sobre máquinas e inteligências artificiais que discute o que é ser humano!

Além de entender a realidade da humanidade na ficção cientifica, POI se destaca por outro elemento: a sua construção de personagens. É elementar a forma como os antagonistas e os heróis são construídos, sem aquelas regras básicas que guiam as narrativas. Aqui, está liberado bater palmas para os antagonistas que são sensacionais. Aqui, “este cara é mau” e “este cara é o amigo” podem se aplicar ao mesmo personagem em diferentes episódios e valem, inclusive, para nossos personagens principais, que se perdem junto ao público em suas questões éticas. Mas não se engane ao pensar que Person é uma série pedante e chata – a série tem ação para te tirar o folego, dramas que vão te fazer chorar em posição fetal ao termino de um episódio e personagens, de cachorros a robôs, que serão mais amados por você do que muita gente por aí. Você ama sociopatas, odeia outros “normais”. Se envolve com as infinitas boas histórias das organizações criminosas de NY, e descobre como a Machine hackeia todos os cus das inimigas para o chão.

Person of Interest é um seriado de cultura pop inteligente, assim como este site maravilhoso que está fazendo aniversário. O Anagrama, bateu seu CPF aqui! Você é perpetrador deste crime maravilhoso e perfeito.

Status: Renovada para 5ª (e provavelmente última) temporada, com número de episódios reduzido – ainda sem data de estreia.

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American Horror Story (FX, 2011-)
Criadores: Brad Falchuk, Ryan Murphy
Elenco: Evan Peters, Sarah Paulson, Jessica Lange, Dennis O’Hare, Frances Conroy, Kathy Bates, Angela Bassett, Lily Rabe, Emma Roberts, Taissa Farmiga, Zachary Quinto

por Marlon Rosa

O gênero terror na história do cinema nunca teve muito destaque por parte de premiações como Oscar, Globo de Ouro, BAFTA e afins. Por ser um gênero que tem um baixo investimento com um retorno considerável de lucro, há uma grande oferta de inúmeros títulos que quase sempre caem na mesmice e não conseguem apresentar ideias inovadoras e originais para um gênero cheio de narrativas batidas e previsíveis. Mas verdade seja dita, o terror está se reerguendo dos confins do inferno e se mostrando forte e relevante novamente: no cinema temos uma nova safra de filmes de grande qualidade como Insidious, The Conjuring, It Follows e The Babadook, que por mais que percorram sobre alguns temas já abordados, conseguem inovar e trazer uma narrativa e uma visão única sobre o assunto.

Aqui do lado da TV a história é um pouco mais triste, já que terror nunca foi muito um hype explorado – claro que isso não exclui algumas proezas do gênero como Arquivo X, Masters of Horror, Além da Imaginação e etc., que em meio a um mundo disseminado por ficção científica, drama e comédias, conseguiram despertar o interesse pelo tema, apesar de nunca conseguirem competirem de forma justa em número de títulos.

E então veio The Walking Dead, que com sua fome de carne e cérebros deu a mordida inicial para que American Horror Story pudesse terminar a refeição e multiplicar o gênero para os outros canais. Lançada em 2011, a série com direção de Ryan Murphy, que até então era mais conhecido por ter feito Glee, logo caiu no gosto dos fãs do gênero, e também daqueles que não tinham muita afinidade. A primeira temporada vinha com o título de Murder House, passava pela história de uma família em crise, até então, nada muito diferente do que já havíamos visto em inúmeros casos, porém, com a visão de Ryan e algumas boas atuações no decorrer das série com personagens que despertam o interesse, era quase inevitável o sucesso que o título traria para TV, e serviria como porta de entrada e consolidação do gênero na TV, trazendo séries como a fantástica Penny Dreadful, The Strain, Hemlock Grove, Scream, Salem e etc.

Apesar de algumas temporadas não muito bem aclamadas pela crítica, American Horror Story já vai para o seu quinto ano, com a certeza de que seu legado será relembrado como um dos clássicos do gênero.

Status: Renovada para a 5ª temporada – estreia em Outubro de 2015.

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Girls (HBO, 2012-)
Criadora: Lena Dunham
Elenco: Lena Dunham, Allison Williams, Jemima Kirke, Zosia Mamet, Adam Driver, Alex Karpovsky, Andrew Ranells

por Marlon Rosa

Você acha que ser garota propaganda de uma marca de maquiagens dará melhor representatividade para as pessoas trans?” Essa foi uma das perguntas da matéria feita para a área de entretenimento do site da Band a Maria Clara Araújo, transexual brasileira que foi convidada para estrelar uma campanha de cosméticos. A resposta não poderia ser melhor:

Dentro do nosso contexto brasileiro, a trans só é representada em contextos específicos que são: na delegacia, na questão de serem presas; na prostituição; e na ridicularização, em programas de humor e afins. Então quando a gente fala de uma mulher trans ser o rosto propaganda de uma marca de maquiagem, isso é algo muito importante para a representatividade. Ali não é a Maria Clara. É uma mulher trans que pode ser vista por outras meninas como uma representatividade boa. Elas vão poder ver algo bom sendo relacionado à questão da mulher trans e não mais a questão de morte, questão de criminalidade, de prostituição e afins. “

Ainda que GIRLS não tenha uma mulher trans entre as protagonistas (e também peque bastante em não ter uma personagem negra) no elenco, não se deve negar que para uma parcela significativa das mulheres ela projeta uma imagem que gera identificação e uma quebra de estereótipos machistas que rondam diariamente o universo feminino. Sei que pode parecer estranho esse discurso vindo de mim, que sou um homem, mas acreditem, aqui quem vos fala não sou eu, essas são as opiniões e visões das amigas com quem conversei durante todas essas temporadas que busco auxílio e explicações pra questões que eu não tenho como entender.

A influência da série é tão significativa que isso fez com que a HBO se aventurasse pelo mundo gay de Looking (que olhem só, também não tinha nenhum personagem trans e também pecava na negritude), que durante duas temporadas lutou pra tentar firmar novamente uma série gay nesse lotado mercado de séries com poucos personagens LGBT de destaque.

Nesse conjunto todo, GIRLS também é bem-sucedida ao retratar quase que fielmente alguns dos anseios e traumas de relacionamentos enfrentado pelos millennials. Marnie é prova viva disso, ao dispensar o papel de amante da relação simplesmente pelo seguinte motivo: “eu sei o que eu quero e você não está me oferecendo”.

Fica a sensação de que a série, apesar dos vários acertos, ainda tem muito a explorar sobre o universo no qual está inserida – não que isso seja uma obrigação por parte do programa, mas certamente é um potencial interessante para um programa com tamanha influência se aventurar.

Status: Renovada para a 5ª temporada – estreia em Janeiro de 2016.

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House of Cards (Netflix, 2013-)
Criador: Beau Willimon
Elenco: Kevin Spacey, Robin Wright, Michael Kelly, Nathan Darrow, Mahershala Ali, Molly Parker, Derek Cecil, Rachel Brosnahan, Jimmi Simpson, Elizabeth Marvel

por Caio Coletti

Que o advento e o crescimento do Netflix revolucionou a forma como vemos televisão não é mais novidade para ninguém, mas o que é muitas vezes ignorado é que, em 2013, quando o serviço de streaming começou a produzir sua programação original, eles revolucionaram também a forma como televisão é concebida. A liberação de todos os episódios da temporada no mesmo dia (uma jogada genial e muito condizente com a natureza in-demand do serviço de streaming, há de se reconhecer) é só a ponta do iceberg da forma como House of Cards começou a mudar a relação entre os produtores de televisão e o espectador. Poder conceber a temporada como um todo antes de lançá-la para apreciação público é um privilégio que Beau Willimon, developer e principal roteirista da série protagonizada por Frank e Claire Underwood, teve em primeira mão. A hospedagem em um serviço online como Netflix, no entanto, permitiu que House of Cards encontrasse seu público e trabalhasse para direcionar a história num sentido de integridade artística com muito mais naturalidade do que aconteceria em qualquer emissora, aberta ou a cabo, dos EUA no momento. A evolução da narrativa no decorrer das temporadas combinou o processo de aprendizado próprio que muitas outras séries “convencionais” passam com a liberdade narrativa e a coerência de uma história que é contada com muito mais liberdade do que o comum. O resultado é que House of Cards, até agora, só soube ficar melhor.

Mas deixemos de lado um pouquinho a revolução cultural que a série representa, e nos concentremos em suas virtudes objetivas: adaptada de uma série de livros que se passa no ambiente político britânico, House of Cards aborda as idas e vindas de Washington D.C. sem a condescendência e a “simplificação” da maioria das narrativas políticas da televisão, deixando o espectador decifrar por si próprio as complexidades e os desvios pelos quais as trajetórias de Frank e Claire passam durante as 3 temporadas. A série produzida por David Fincher, no entanto, não triunfa só na sua trama política – a construção tremendamente cínica de seus personagens sustenta a narrativa com folga, especialmente no terceiro ano, em que um foco mais intenso recai sobre os lados humanos dos dois protagonistas e até de alguns coadjuvantes (o Doug Stamper do ótimo Michael Kelly é sempre um destaque merecido). Durante os dois primeiros anos, House of Cards foi uma produção de diversas experimentações visuais, que brincava com a liberdade que tinha no Netflix para quebrar com a linguagem televisiva convencional, e nos trazia narrativas e trabalhos de direção e fotografia surpreendentes e peculiares.

Na terceira temporada, a série abre espaço no meio desse conceito visual estrito para os personagens respirarem e se inserirem em uma estrutura que, querendo ou não, é mais “convencional” – é uma surpresa, portanto, quando essa decisão acaba gerando a melhor sequência de episódios da série até agora, e largamente porque a exemplar postura discreta da direção abre espaço para os atores e roteiristas brilharem. Devastadora emocionalmente, intrigante politicamente e complexa intelectualmente, House of Cards mesmo assim deve muito ao trabalho de seus dois protagonistas, em atuações que provavelmente definirão suas carreiras daqui para frente. Kevin Spacey faz um trabalho gigantesco com Frank, trabalhando emoções e sensações primais que se traduzem em pequenas sutilezas na tela, e em uma composição completa e nada apologética de um dos vilões (sim, vilões) mais intrigantes da televisão. Robin Wright não deixa nada a dever ao parceiro oscarizado de cena, moldando o mistério essencial que existe em Claire numa atuação tremendamente emocional, mesmo quando a personagem anda na corda bamba entre demonstrar e esconder sua verdade. Nada maniqueísta, sem nunca menosprezar a inteligência do espectador, House of Cards já ensinou muito para as concorrentes do cenário televisivo – mas ainda tem algumas lições para passar.

Status: Renovada para a 4ª temporada – estreia em 2016.

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