por Caio Coletti
(Twitter – Tumblr)
Como a filmografia recente tem nos mostrado cada vez mais frequentemente, há uma linha extremamente tênue entre, digamos assim, o homem bom e o homem mau. Do Coringa de O Cavaleiro das Trevas, que nos mostrou que “a loucura é como a gravidade… só precisa de um empurrãozinho”, até o simulacro de fascismo que tropeçou na falta de escrúpulos em A Onda. Em sua abordagem dessa recorrência, Redenção (no original, “Machine Gun Preacher”, algo como “Pastor da Metralhadora”) manipula com admirável coragem as percepções do espectador para, sorrateiramente, nos expor a nossa própria hipocrisia.
E isso, apesar do que o leitor pode pensar, não é algo ruim. Redenção tem o poder de incomodar o espectador sem afugentá-lo, e o poder de contar uma história realmente boa e, se não provar um ponto com ela, ao menos implantar uma dúvida na mente de quem a acompanha. Esse é o poder do bom cinema, e é o que Marc Forster têm feito há pelo menos 12 anos de carreira sólida, versátil e pautada por uma sensibilidade com poucos precedentes nesse século. De A Última Ceia a Quantum of Solace, até Redenção, Forster nunca assinou um filme que não compreendesse profundamente. O resultado são peças extremamente eficientes e sutis, e aqui não é diferente.
O protagonista é Sam Childers (Gerard Butler), um personagem real, ex-traficante e usuário de drogas pesadas que, por mais pouco convincente que possa parecer, encontrou na fé em Deus a motivação para, partindo disso, se tornar missionário no Sudão e, mais tarde, construir um orfanato que abriga crianças forçadas a se tornar soldados pelas forças do LRA (Lord’s Resistance Army) de Joseph Kony. A discussão que o roteiro de Jason Keller (Espelho, Espelho Meu) levanta, no entanto, é sobre os limites pelos quais Childers deve ou não se pautar nessa luta contra esse mal. Keller estrutura sua narrativa com habilidade, ainda que sem real brilhantismo, mas Forster e o diretor de fotografia Roberto Schaefer, parceiro de longa data do cineasta, fazem o trabalho de adicionar tempero à boa receita.
Destaque absoluto para Michael Shannon (The Runaways) no elenco. Na pele do amigo do protagonista que ele resgata da mesma vida que levava, Shannon incorpora uma urgência mal-contida que, mesmo não sendo novidade em suas interpretações, ainda é capaz de impressionar. Ele mostra aqui, também, alguma sutileza preciosa nos momentos certos, em especial em sua cena final. Sutileza que falta um pouco a Gerard Butler, devemos concordar. Não é que seu retrato de Childers não faça o espectador simpatizar com o personagem, ou não acrescente a ele algumas sombras quando é preciso, mas, com Butler, não existe a nuance. Trata-se de uma abordagem direta demais, que não favorece (mas tampouco realmente atrapalha) as centenas de tons de cinza que Redenção aponta nos seus personagens e, até, no próprio espectador.
**** (3,5/5)
Gerard Butler como Sam Childers e Souleymane Sy Savane como Deng.
Redenção (Machine Gun Preacher, EUA, 2011)
Direção: Marc Forster.
Roteiro: Jason Keller.
Elenco: Gerard Butler, Michelle Monaghan, Kathy Baker, Michael Shannon, Madeline Carroll, Souleymane Sy Savane.
129 minutos.
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