20 de mar. de 2011

Cisne Negro (Black Swan, 2010)

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Confesso que, na primeira vez que vi o trailer de Cisne Negro, muito pouco me causou expectativa no novo trabalho de Darren Aronofsky. Mas vamos esclarecer uma coisa: minha experiência com o diretor se resume a Fonte da Vida e O Lutador, seus dois últimos trabalhos antes deste, e filmes opostos em sua própria natureza. História ambiciosa em escala e temática, o épico passado em três eras e estrelado por Hugh Jackman e Rachel Weisz pode ter exagerado um pouco na própria pretensão, mas enchia os olhos com o trabalho exemplar do diretor na manipulação de todos os elementos de cena, da fotografia a iluminação. Além do mais, o filme tinha Weisz em um de seus melhores momentos. Assim como O Lutador, uma das sensações da temporada de prêmios no ano passado, tinha Mickey Rourke no topo de seu jogo. Mas a diferença é que a história do lutador em frangalhos tinha, a bem da verdade, só isso. O roteiro era frágil, a direção não impunha grandes dificuldades, e Aronofsky parecia ter se furtado, por algum motivo, da própria criatividade.

Não me culpem, portanto, por ter achado que Cisne Negro estaria mais para O Lutador, com seu jogo psicológico e sua fotografia trepidantemente indie, do que para Fonte da Vida. Mas não é bem por aí. Cisne Negro é um exemplar perfeito de filme de gênero, ao mesmo tempo em que foge de todos eles com a obstinação de uma obra contemporânea por excelência. Nessa contradição, o diretor se sai impecavelmente bem ao atingir o equilíbrio entre uma forte, clássica e coesa linha narrativa que aponta para um suspense psicológico tradicional (e dos bons), e um filme bastante experimental que não seria o mesmo sem o toque moderno e a proximidade que Aronofsky e sua fotografia trazem para a mistura. Cortesia também, aliás, do brilhante Matthew Libatique, que sem dúvida seria o detentor, por mérito, do troféu em sua categoria desse ano.

A essa altura, a trama não deve ser novidade para ninguém. Nina Sayers (Natalie Portman) é uma dançarina de ballet, estrela ascendente de uma companhia, obcecada pela perfeição e pela técnica, oprimida pela mãe controladora (Barbara Hershey) que desistiu da própria carreira para ter e criar a filha. Em começo de temporada, Nina é escalada pelo diretor da companhia, Thomas Leroy (Vincent Cassel), para interpretar os papéis principais na nova versão de “O Lago dos Cisnes” que a companhia irá montar. Isso implica, é claro, que a frívola e transtornada Nina se solte mais para incoroporar o Cisne Negro, a “versão malvada” da protagonista da peça. Coloque na equação a nova bailarina recém-chegada de San Francisco, Lily (Mila Kunis), que se aproxima de Nina, e os surtos psicóticos da protagonista e pronto, temos uma bomba relógio que explode na cara do espectador sem nenhuma sutileza aparente.

Note-se bem o “aparente”, aliás. A verdade é que o trabalho do trio de quase-estreantes Mark Heyman, Andre Heinz e John J. McLaughlin realiza um trabalho de enredamento de trama mais do que exemplar, quase que inteiramente by-the-book dos melhores manuais de roteiro que você vai poder encontrar por aí. A escalada do conflito, as passagens que sutilmente sugerem o que está por vir, o jogo de esconde-esconde com o espectador, a análise cuidadosa e intrusiva da psique da personagem principal, está tudo ali, onde e como deveria estar. E seria uma chatisse burocrática se não fosse o toque humano de Aronofsky, que tornou O Lutador patético mas caiu perfeitamente bem sobre uma trama que, claramente, precisava desse ingrediente a mais.

Mas não vamos nos esquecer, é claro, do que eleva Cisne Negro a uma categoria que faça merecer todo o barulho que fez: Natalie Portman. Não é bajulação, não é exagero, não é reconhecer toda a sua evolução durante esses anos de carreira, não é dizer que ela é a próxima Meryl Streep (o que, provavelmente, não é mesmo). É que simplesmente salta aos olhos o fato de que Nina e Natalie são personagem e atriz em completa sintonia, o tempo todo, por todas a inclinações e transformações, por todas as experiências fortes que a protagonista passa durante o filme. Natalie some junto da personagem, e se torna ela em cada uma dessas fases, de cine alvíssimo a cisne negro, sem nem mesmo parecer hesitar. É um trabalho simbiótico, e indiscutivelmente brilhante.

E é o que faz, ao lado da surpresa no final, Cisne Negro acabar como um filme que merece ser revisto. Não porque seja perfeito. Como bem o filme nos esclarece, a perfeição não está quase nunca onde nós procuramos. Mas porque funciona, surpreende e faz pensar. Como poucos filmes tem sido capazes de fazer, diga-se de passagem.

Nota: 8.5

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Cisne Negro (Black Swan, EUA, 2010)

Uma produção da Fox Searchligh Pictures… 

Dirigido por Darren Aronofsky…

Escrito por Mark Heyman, Andre Heinz, John J. McLaughlin…

Estrelando Natalie Portman, Mila Kunis, Vincent Cassel, Barbara Hershey, Winona Ryder…

108 minutos

2 comentários:

Anônimo disse...

Black Swan não me impressionou nada. Reconheço, como vc diz, os elementos de narrativa bem claros, na hora certa, mas, ao contrário de como vc coloca, pra mim faltou mais Aranofsky. Acho que é pq eu tinha assistido os outros filmes dele; o Black Swan nem parece ser do mesmo diretor do Requiem for a Dream ou do Pi.

Mas um mérito: ainda que eu não suporte a afetação do ballet, isso não chegou a me incomodar. O suspense foi envolvente o bastante pra me desviar disso.

Ana Carolina disse...

leia essa que te falei...

http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2202201117.htm

esse pegou pesado, não acha?