1 de jun. de 2012

Review: Adam Lambert, o popstar fora-da-lei, e seu Trespassing.

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por Caio Coletti
(TwitterTumblr)

Em “Strut”, uma das melhores faixas de seu álbum de estreia, o For Your Entertainment de 2009, o segundo colocado do American Idol do ano anterior, Adam Lambert, cantava que queria começar uma revolução. Ficou só na promessa. O álbum não passou de 1 milhão de cópias vendidas em solo americano, os singles só pegaram quem realmente prestava atenção ao cenário pop e a revolução de Lambert ficou enterrada sob um verdadeiro time de compositores célebres (Rivers Cuomo, Ryan Tedder, Justin Hawkins, Lady Gaga, Linda Perry) que não deixaram a pesonalidade notável do americano brilhar. Trespassing, o segundo álbum, promete virar esse jogo. E consegue.

A faixa título já começa desafiando: “no trespassers? yeah, my ass!”. O produtor Pharrell Williams empresta a linha de baixo de “Another One Bites The Dust”, do Queen, insere guitarras que remetem à Prince e ainda acha espaço para o refrão ao estilo cheerleading. Tudo levado sem o mínimo esforço pela voz mais bem preparada do pop atual. “A vida é minha luz e minha liberdade/ E eu brilho quando quero brilhar”, canta Adam num dos pré-refrões da empolgante canção. O clima continua favorável em “Shady”, para a qual o guitarrista Nile Rodgers (da banda oitentista Chic) empresta uma vibração urbana. Adam é agraciado com versos espertos (“no, I ain’t broken, but I/ I need a fix”) e um refrão que demonstra o potencial de sua voz sem sufocar a certeira abordagem musical do produtor Lester Mendez (vide “Stoned”, da Dido).

Outras brilhantes demonstrações do vocal de Adam ainda na primeira metade do álbum são “Kickin’ In” e “Pop That Lock”. A primeira é o melhor trabalho de Pharrell Williams na produção em tempos. Ele joga Adam em meio a uma batida metálica, quase sufocante, insere sintetizadores bastante sutis e brinca bonito com trechos vocais entrelaçados, especialmente no já clássico refrão (“(can you feel it) kicin’in?”). “Pop That Lock” é exemplo de canção eletrônica bem polida, usando batidas e sintetizadores na equalização perfeita de um chamado à pista de dança, trabalhando a influência do dubstep sem se afundar nos mares do previsível. Incrementada com uma voz como a de Adam (a notabilíssima nota que precede e se estende durante o último refrão é algo inacreditável), não é exagero nenhum dizer que se trata de uma das canções mais incríveis do ano até agora.

“Better Than I Know Myself”, a primeira power ballad do disco, e também o primeiro single, mostra um trabalho inspirado de Dr. Luke. Sem cair nos exageros que caracterizaram algumas de suas últimas produções, o sueco cria uma atmosfera equilibradamente opressiva para que Adam eleve a composição às alturas com uma de suas melhores interpretações. “Never Close Our Eyes”, por sua vez, mostra que a voz de Adam e a composição melódica de Bruno Mars é um casamento extremamente feliz. O ex-Idol eleva as qualidades do estilo único de Mars a uma potência inédita, mesmo que o refrão aqui seja bastante derivativo, para quem conhece o disco de estreia do cantor, de “The Other Side”.

“Underneath”, a balada em carne viva de Lambert, é de um apelo emocional explicável não apenas pela atração natural que o grandioso e o dramático exercem, mas principalmente pela sutileza do arranjo de cordas e percussão e pelo tom verdadeiramente desesperado que Adam coloca nas notas que canta. Ouvi-lo cantar, aqui, é ouvir um lamento rascante, estratosférico, que encontra a rachadura de qualquer barreira de cinismo que o ouvinte possa ter construído. Por fim, “Outlaws of Love”, claramente pessoal, é um libelo tocante ao amor. E não espere que este que vos fala acrescente algum adjetivo a esse amor, porque “Outlaws” não é sobre homossexualidade. Os versos, inicialmente cantados em belíssimo tom de soprano por Adam, que no decorrer da música realiza a transição para uma interpretação mais rascante com a maestria que não se pode negar a ele, dizem apenas que o amor é igual para todos.

“Hey, tears all fall the same/ We all feel the rain/ We can’t change”. O “we” de Adam se refere a todos nós, “foras-da-lei do amor”, porque a verdade é que, numa visão mais ampla, nossa sociedade aos poucos está marginalizando tal sentimento. Interprete como quiser, trata-se de um fechamento realmente tocante para o Trespassing. Um álbum que é essencialmente sobre quebrar regras quando elas vão contra a nossa própria natureza. Um álbum desafiador, ousado, dançante, emocionalmente diverso e completo, como todo bom álbum pop deveria ser. O álbum que se tornou o primeiro de um artista abertamente gay a alcançar o topo da Billboard 200. Agora sim, sr. Lambert, você começou uma revolução.

**** (4/5)

Trespassing
Lançamento: 15 de Maio de 2012.
Selo: 19/RCA.
Produção: Josh Abraham, Ammo, Jason Bonilla, busbee, Cirkut, Josh Crosby, Robert Marvin, Lester Mendez, Dr. Luke, Oligee, The Smeezingtons, U-Tern, Rune Westberg, Fred Williams, Pharrell Williams.
Duração: 42m32s.

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Notas (glossário):

Dupstep:
Tendência absoluta no mundo da música eletrônica atualmente, o estilo surgido em Londres se caracteriza basicamente por grandes quebras de ritmo, padrões de bateria reverberantes e fortes linhas de baixo. O expoente mais destacado do estilo hoje é Skrillex (ouça "Equinox (First of The Year)"), mas o dubstep tem forte influência também no último hit de Rihanna, "Where Have You Been".

Power-ballad:
É a canção que tem estrutura e ritmação de balada (como a clássica "And I Am Telling You I'm Not Going"), mas é acompanhada de instrumental pop e percussão forte. Um excelente exemplo de power-ballad é o cover de Jordin Sparks para "Don't Let it Go to Your Head", de Fefe Dobson.

1 comentários:

Flávia disse...

Adam Lambert é um artista incrível!! Eu estou adorando Trespassing e já tenho a minha cópia!