14 de dez. de 2010

A dona da história, por Marcelo Antunes

Conto (nunk excl)dona da historia 1

Crise criativa. Era isso. Estava atravessando uma crise criativa. Há dias que seguia o mesmo ritual: sentava-se diante do computador, abria o editor de texto, digitava meia dúzia de palavras, apagava, reescrevia e nada. Nunca, em todos aqueles anos, passara por nada semelhante. Escrever era, para ela, como respirar. Era conhecida por escrever em tempo recorde. A Dança das Cadeiras, seu livro mais famoso, fora escrito em pouco mais de uma semana. Sim, uma semana. As palavras foram quase vomitadas. Escreveu-o, praticamente, de uma assentada só. Quando viu, o ponto final já estava lá.

Ficou preocupada. Estaria perdendo o talento? Seria normal, o que vinha passando? E se não conseguisse escrever, nunca mais, algo que prestasse? Porra, estava fudida. Bem que gostaria de estar, mas isso era algo que não acontecia há muito tempo. Tanto tempo que achava que nem lembrava mais como a coisa funcionava.

Sim, é duro de engolir, mas ela não lembrava. Todos que a viam como escritora de sucesso e mulher bem sucedida, não sabiam da missa a metade. Era uma derrotada. Uma idiota. Uma fracassada, em sua vida pessoal. Não casara, não tivera filhos, não construíra absolutamente nada. Ah, claro, havia os livros. Era, certamente, a maior autora de sua geração. Sentiu-se no topo do mundo quando, numa coletiva de imprensa, a badalada protagonista de um daqueles arrasa-quarteirões hollywoodianos declarou estar lendo o seu último romance e gostando muito. Não era pouca merda, definitivamente. Não mesmo. É claro que havia aqueles que criticavam seu estilo. Superficial, raso, puramente comercial. Talvez fosse tudo isso, vá lá saber? Mas era um sucesso. Um inegável sucesso.

Se bem que, numa hora dessas, ser sucesso não significava nada. Do que adiantava tanta fama se, naquele sábado a noite, estava só, apenas a tela do PC enchendo seu escritório de luz? Do que adiantava se isso não era só aquela noite, mas vinha se repetindo nos últimos sabados dos últimos anos?

Sentiu-se uma bosta. Não, bosta era pouco. Havia algo pior que bosta? Se havia, esse algo era ela.

Parou, respirou fundo, olhou para o monitor. Pensou por alguns segundos, abaixou o olhar em direção ao teclado, pensou novamente. Parou por aí. Às vezes, pensar demais não presta. Desligou o computador na mão grande. Levantou, pegou a chave do carro e saiu.

Era chegada a hora de escrever a própria vida.

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“ Bom mesmo é ter problema na cabeça, sorriso na boca e paz no coração. Aliás, entregue os problemas a Deus e que tal um cafezinho gostoso agora? A vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso cante, chore, dance e viva antes que a cortina se feche!”

 (Arnaldo Jabor)

2 comentários:

bones disse...

Crise criativa é um pesadelo!
Imagine quando se depende da criatividade para sobreviver então.
Gostei do texto mas tenho uma reserva. Por que usar palavrões?
Chico Buarque ter ganhado um premio com um livro que derrama mais palavrões que o figurativo leite está servindo de inspiração para vcs jovens?
Acho que mancha a estória e... serei só eu que não admito este tipo de linguagem perto de mim?

Babi Leão disse...

Acontece comigo sempreeee -eee -eee ! rsrsrs
Ameiii o conto! Melhor ainda é a frase do Jabor no final :D

Beijao!