4 de jun. de 2010

Onde Vivem os Monstros (Where the Wild Things Are, 2009)

critica (nunk excl) monstros 1

Hoje em dia, não é tão difícil ser diferente quando o assunto é arte (ou entretenimento, ao gosto do leitor). Em tempos em que quase tudo é um clichê, não fica tão complicado fugir deles para criar uma peça verdadeiramente única aos olhos de quem vai apreciá-la. Indo direto ao nosso assunto por aqui, o universo cinematográfico, o ingrediente fundamental para tocar o público, o tempero que tanto tem faltado nos grandes blockbusters hollywoodianos, é só um: sensibilidade. E, apesar de todos os defeitos, não dá para negar que Onde Vivem os Monstros, esse estranho exemplar de cinema independente em um contexto inusitadamente mainstream, tem sensibilidade de sobra. Abrindo as cortinas do mundo curiosamente criativo de uma criança bem na frente dos olhos de seu espectador, Spike Jonze transformou a obra infantil de Maurice Sendak em uma pérola de conexões e reflexões sobre a família moderna, o sentimento e a visão de uma criança e, acima de tudo, sobre o que falta para nossa sociedade e sobra para os monstros do título: humanidade.

Max (Max Records) é o cativante protagonista de uma jornada ao mesmo tempo corriqueira e extraordinária, da qual o diretor e roteirista tira a beleza dos pequenos detalhes, engrandecendo os relacionamentos entre os personagens e ilustrando-os em uma história tão fantástica quanto absurdamente realista em suas conclusões. Ele foge de casa uma noite em que a mãe (Catherine Kenner) se irrita com sua atitude frente ao novo namorado (Mark Ruffalo) e, ao entrar em um barco ancorado as margens de um lago perto de sua casa, vai parar na ilha habitada pelo grupo de monstros do título. Delatar as personalidades dos personagens tão inusitadamente complexos que são Carol (voz de James Gandolfini), Alexander (Paul Dano), Judith (Catherine O’Hara), Ira (Forest Whitaker), Douglas (Chris Cooper) e KW (Lauren Ambrose), os próprios monstros, seria estragar boa parte do encanto abundante do filme de Jonze. Basta dizer, portanto, que o roteiro os coloca como reflexões distorcidas, por vezes exageradas, por outras realistas e, talvez justamente por isso, desoladoras, das pessoas presentes (e ausentes) na “vida real” de Max.

Repleto de simbolismos para explorar no script co-escrito por Dave Eggers, o diretor Jonze realiza um trabalho que combina perfeitamente com o clima sensível, quase estourado, do filme. Todo o equilíbrio entre exagero, comoção e contemplação é administrado pela câmera de Jonze com toda a competência, lançando mão de todos os recursos que tem as mãos para aumentar o impacto quase palpável das miudezas e simplicidades da trama. Onde Vivem os Monstros é o típico filme de narrativa simples, linear, que encontra sua beleza nos detalhes e metáforas que vai fazendo pelo caminho. Ainda que seja uma criança, Max é extremamente perceptivo com o mundo ao seu redor, e toda essa sensibilidade é repassada para o público com cautela e simplicidade comoventes.

Claro, uma parcela do mérito deve ir ao jovem Max Records, que fez um dos Irmãos Bloom quando jovens em Os Vigaristas, com uma atuação extremamente expressiva como Max. Ele é o centro nervoso do filme e o personagem que acompanhamos por quase todo o tempo, e é notável observar como o Records encara esse desafio com desevoltura e talento. Seu nível de atuação permite ao espectador tanto navegar pelas águas turvas da vida real quanto acompanhar um delirante mundo imaginário com o personagem. Catherine Keener também é elemento fundamental no começo e no final do filme, incorporando uma mãe tão amorosa quanto indulgente e descontrolada, pintando assim um retrato fiel das inconstâncias da família moderna e comovendo o espectador. São os olhos desses dois atores brilhantes em suas posições que fazem, ao final de Onde Vivem os Monstros, uma fagulha de esperança brilhar na tela.

Jonze fez um filme sensível, interessante, divertido e emocionante, que não furta o espectador de um final realista, sem soluções fáceis, nem de mostrar as dificuldades de se relacionar e, enfim, de viver. Mas, ao final, mostra que vale a pena continuar tentando. Às vezes, pode até dar certo.

Nota: 8,5

Where The Wild Things AreWhere The Wild Things Are

Onde Vivem os Monstros (Where the Wild Things Are, EUA/Alemanha, 2009)

Uma produção da Warner Bros. Pictures/Legendary Pictures…

Dirigido por Spike Jonze…

Escrito por Spike Jonze, Dave Eggers…

Estrelando Max Records, Catherine Keener, Mark Ruffalo, Pepita Emmerichs…

Com as vozes de James Gandolfini, Paul Dano, Catherine O’Hara, Chris Cooper, Lauren Ambrose, Forest Whitaker, Michael Berry Jr, Spike Jonze…

101 minutos

5 comentários:

Renan Barreto disse...

Grande, Caio! Cara, eu to doido pra ver esse filme. Desde que saiu tava querendo vê-lo. Me pareceu tão bonito. Lembro de ter feito um conto na adolescência que parecia o menino. Mesmo sem ter visto o filme, o cartaz me disse tudo. Vou ver e digo o que achei. Até porque sempre vejo o que vc sugere.

Abração!

Anônimo disse...

É um filme delicioso de se assistir. Spike Jonze conseguiu transpor para as telas o que se passa na cabeça de uma criança de modo que ficasse atrativo para o público adulto. Sem contar que a equipe tecnica da um show na crição das criaturas.

http://cinema-em-dvd.blogspot.com/

Babi Leão disse...

Voce disse " beleza dos detalhes " ? To doida pra ver agora ! Rs

Como sempre uma ótima crítica !
Beijao !

Cintia Carvalho disse...

Oi Caio!

Na época em que estreou pensei em levar meu filho para ver, pois vi o trailler e achei tão bonita as imagens, principalmente as criaturas. Acabei não indo. Foi melhor, pois se tivesse levado o VH acho que não conseguiria vê-lo. Enfim, uma boa pedida. Sua crítica esta muito boa e pela nota que vc atribuiu a ele vale a pena. Depois que assistir comento o que achei.

Um beijinho carinhoso.

Marcelo A. disse...

Eu adoro esse filme, tanto que garanti o meu, logo na pré-venda! Jonze fez um trabalho sensível e - vamos combinar? - foi muito feliz na adaptação do livro do Sendak. Tu senta e em três minutos acabou! Ele nos delicia durante uma hora e meia com uma história que fala alto, bem alto - pelo menos a mim, falou. A maioria das pessoas que conheço, torceram o nariz. Acharam o filme esquisito. Eu amei. Tudo.