** (2,5/5)
Quando Duffy surgiu para o mundo com Rockferry, a referência dominante em seu estilo e timbre de voz era Amy Winehouse. Prezada pela elegância de suas canções, pela constância qualitativa de sua estreia e pela aura "sexy a moda antiga" que conferia a sua imagem, Duffy passou os últimos anos curtindo o sucesso, com a atraente discrição que lhe é particular. Amy, por sua vez, não se contentou com pouco: deu as caras bêbada, drogada, entrou e saiu de clínicas de reabilitação dezenas de vezes, socou fãs durante shows, e até quando passou uns tempos de férias no Brasil virou notícia, fazendo topless e jogando capoeira. Tão estrela se tornou, no pior sentido da palavra, que Amy arriscou perder a preferência crítica para a concorrente galesa. Endlessly, segundo álbum de Duffy, foi feito para firmá-la como artista forte comercial e criticamente. Acabou sendo recebido de forma morna pelos especialistas e gelada pelo público. Por quê? Bom, isso só Deus sabe. Mas não custa tentar advinhar.
Endlessly até abre com boas expectativas. My Boy (Faixa 1) é candidata séria a nova favorita dos fãs, com seu refrão contagiante e produção equilibrada entre o som antiquado que sempre vai ser relacionado ao repertório de Duffy com toques de sintetizador e baixo funkeado que trazem a canção para um confortável contexto mais contemporâneo. Por outro lado, o primeiro single do álbum, Well, Well, Well (Faixa 4), apesar de ter Duffy no topo do seu jogo vocal, derrapa ao falhar no que a faixa de abertura faz com facilidade: desenvolver um refrão marcante o bastante para fazerem funcionar as boas ideias instrumentais e melódicas.
No lado das baladas, o segundo disco da galesa é também uma faca de dois gumes: abre com exagero e sem clímax na enervante Too Hurt to Dance (Faixa 2), e poucas faixas depois nos vem com a memorável Don't Forsake Me (Faixa 5). A segunda é tudo o que a primeira tenta ser e não consegue: uma canção romântica discreta e emocionante, que lembra o ouvinte do poder de sedução do vibrato de Duffy e se junta a lista de canções realmente competentes de Endlessly. Talvez seja mesmo um caso em que vários cozinheiros mexendo na mesma panela seja melhor que apenas um impondo seu estilo. Explica-se: Don't Forsake Me é uma das faixas em que o parceiro de Duffy no álbum, Albert Hammond, ganha a ajuda de Stuart Price (Aphrodite de Kylie Minogue, Day & Age do The Killers) para equacionar a música da galesa.
Por falar em Price, ele é obviamente o responsável por Duffy ter se tornado mais pop do que costumava ser nesse segundo álbum. Lovestruck (Faixa 8) é o exemplo perfeito: com teclados espertos que miram os topos das paradas e um dos refrões mais viciantes da carreira da galesa, a canção mostra que Duffy pode, sim, explorar novos horizontes mantendo a pose e a personalidade. No mesmo sentido, com mais discrição, Girl (Faixa 9) tem Duffy no seu território vocal, brincando em cima de melodia e letra antiquadas, mas mostrando na parte instrumental que o pop contemporâneo pode ter muitas faces diferentes. Apesar de ser a única canção na qual a cantora não tomou parte como compositora, a penúltima faixa de Endlessly soa estranhamente pessoal.
Talvez os únicos momentos em que Hammond se acerte na produção sejam a faixa-título e a saidieira do álbum. Endlessly (Faixa 6) é uma daquelas pérolas de letra singela e execução descomplicada, mas que por algum motivo desconhecido marca a memória afetiva do ouvinte. É uma canção pura e assumidamente romântica, que funciona muito bem na interpretação de Duffy. Já Hard For The Heart (Faixa 10) é uma história completamente diferente. Para começar, a canção traz a galesa em um momento intensamente emotivo e, curiosamente, também bastante contido. Seu belo timbre consegue brilhar sem abafar a produção sofisticada e apoteótica, que confere pulsação e força para uma composição marcantemente poética.
A canção mostra, enquanto Endlessly contradiz seu próprio título ao deixar o ambiente silencioso após seus ligeiros 33 minutos de execução, que Duffy ainda tem seus momentos de brilhantismo como cantora e compositora. E o álbum? Bom, ele se destaca como uma obra de riscos, e uma que obviamente não consegue escapar sem equívocos pelo caminho. Mas ao menos serve para a galesa expandir seus horizontes musicais. Da próxima vez, se ela se cercas das pessoas certas, Amy vai estar em apuros para conseguir seu posto de volta.
“…I am looking for safety/ What it is all about/ For somebody to tell me/ Take away this vow/Life is a play and we all play our parts/ But it often gets hard for the heart!…”
(Duffy em “Hard For The Heart”)
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